Chef Ivan Ralston chama a atenção para a cadeia dos alimentos no Tuju
Caetano Veloso está a cantarolar "You Don't Know Me" ao fundo. Aos poucos, ele vai ocupando aquele salão que, em um só tempo, é espaçoso e aconchegante.
Um aconchego, quiçá, escondido na comida, que sai de uma cozinha aberta orquestrada por Ivan Ralston, 28.
Bruno Geraldi/Divulgação | ||
Macarrão de pupunha e lula, com uni e ovo de codorna |
Ivan, que já passou pelo Maní, pelos espanhóis Mugaritz e El Celler de Can Roca e pelo japonês Ryugin, é uma espécie de Michael Pollan das panelas. Ele toma emprestada a filosofia do jornalista norte-americano para dar vida ao Tuju, aberto nesta terça (29).
A obstinação de Pollan em "acompanhar as cadeias alimentares que nos sustentam" lhe serve de exemplo.
"A gente não pensa sobre a gastronomia, a gente pensa sobre alimentação, sobre a cadeia inteira", diz Ralston, o cozinheiro formado em música pela Berklee, em Boston. "O Tuju tem uma cozinha muito simples, de produto."
Ivan passou a infância em uma fazenda perto de Ribeirão Preto (SP), na qual a família da mãe plantava goiabas. E, à semelhança do pai, Roberto Bielawski, dono do Ráscal, carrega ingredientes em seu carro de cá para lá.
Bruno Geraldi/Divulgação | ||
Ivan Ralston, 28, que passou por Maní, Mugaritz e El Celler de Can Roca |
Nos anos 1990, quando entrou no ramo, Bielawski dirigia seu Passat até Santos para comprar peixes pessoalmente. "Hoje é o meu carro que cheira a peixe", ri Ivan.
O chef foi até o Rio Grande do Sul conhecer o barco do qual compra peixes. São exemplares pescados um a um, de anzol, e envolvidos em gelo ainda vivos.
Para viabilizar o trabalho desse pescador, Ivan formou uma rede de compradores em São Paulo. Chefs como Bella Masano (Amadeus), Helena Rizzo (Maní) e Alberto Landgraf (Epice) passaram a comprar do mesmo barco.
O meca trazido de lá é levemente marinado e surge no centro das atenções de uma receita que leva a farinha amazonense de uarini, cuja textura lembra um cuscuz marroquino, com picles de erva-doce, rabanete, pepino, pó de azeitona e iogurte caseiro.
Para montar seu restaurante, com cinco sócios, Ivan desenvolveu parcerias com outros fornecedores.
Ao lado de sua equipe, visitou um barco de pesca no litoral norte de São Paulo, um frigorífico em Pirassununga (SP), uma plantação de hortaliças em Várzea Paulista (SP). "É legal conhecer o produtor e entender por que o mercado rejeita uma cenoura maior que o padrão, como o mercado pode ser cruel."
Ivan Ralston também sugere que se pense mais em ingredientes do dia a dia. Como os sete tipos de feijão preparados separadamente servidos com foie gras e pinhão. Ou a mandioca, cozida na tinta de lula e seca no forno, que se confunde com um pedacinho de carvão quando chega à mesa com naco de contrafilé bem rosado. Ou ainda a banana-da-terra servida com pescada, nhoque de abóbora sem farinha, pimentão e folha de cambuquira.
A cambuquira, aliás, é uma das 300 variedades cultivadas na horta que se espalha pelo restaurante –da entrada aos fundos (e mais uma estufa no andar superior).
O cuidado é diário, com água captada da chuva e um jardineiro minucioso. "Aqui, tudo começou na horta. É um restaurante da horta."
TUJU
Endereço r. Fradique Coutinho, 1.248, tel. (11) 2691-5548
Horário de ter. a sáb., das 19h30 às 23h; dom., das 13 às 17h
Preços entradas, R$ 11 a R$ 49; pratos, R$ 45 a R$ 92; sobremesas, R$ 9 a R$ 22; menu-degustação, R$ 190 (só com reserva)
Livraria da Folha
- Box de DVD reúne dupla de clássicos de Andrei Tarkóvski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade
- 'Fluxos em Cadeia' analisa funcionamento e cotidiano do sistema penitenciário
- Livro analisa comunicações políticas entre Portugal, Brasil e Angola
- Livro traz mais de cem receitas de saladas que promovem saciedade