Poeta de rua imprime seus versos pela Oscar Freire, em SP
De um salto, pulou da cama. Olhou em volta em busca do chapéu. Esfregou o rosto para afastar o sono, verificou os bolsos, deu três passos e colocou os pés na rua mais chique de São Paulo. "Vem comigo, camarada. Vamos tomar o café da manhã." São 11h e o dia começou a pouco menos de 15 minutos para Ronaldo Breves.
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Ali, na Oscar Freire, Jardins, zona oeste de São Paulo, as vitrines da Louis Vuitton, Calvin Klein, Cartier, Tommy Hilfiger e o Suplicy Café não são as únicas coisas que chamam a atenção.
Na esquina com a Peixoto Gomide, os poemas de Ronaldo se destacam do resto do ambiente, numa rua em que o metro quadrado comercial custa, em média, R$ 22 mil.
Os versos não estão em nenhuma livraria, galeria, ou coisa que o valha. Foram gravados em pedaços de papelão, isopor e numa porta caprichosamente colocada na calçada, em frente a um prédio abandonado, fechado por blocos de concreto da Subprefeitura de Pinheiros.
Este é o endereço de Ronaldo, que calcula ter 60 anos. O "Poeta dos Jardins", como é conhecido, é um dos 14.478 moradores de rua de São Paulo, segundo dados da Secretaria Municipal de Assistência Social.
Sua "cama" (um colchonete) está instalada no hall do prédio --semicerrado por placas de alumínio.
Os pertences não são mais do que uma pilha de revistas, poucos livros e alguns cadernos que usa para escrever suas poesias e pensamentos.
Ele diz que já teve mais coisas, mas foram levadas. "Isso é coisa do 'rapa'. Até um edredom da Zelo me levaram quando passaram por aqui."
A barba longa e branca, os sapatos vermelhos, o sobretudo surrado e uma improvável cartola o denunciam a cada esquina, à caminho do dejejum num posto de gasolina.
"Como vai a senhora?", pergunta à Rosa Ribeiro, 74, moradora dos Jardins. "Viu que limpei a frente do prédio?"
"Ele é muito inteligente e educado, rima qualquer coisa muito rápido", derrete-se a dona de casa.
De onde vem os bons modos? Ele para com as mãos espalmadas no peito. "Camarada, minha mãe, graças a Deus, me educou", afirma, e segue caminho.
Vai até a alameda Lorena, entra na conveniência do posto e repete um ritual quase diário. Pede um copo de água e com as mãos trêmulas, despeja seis saquinhos de açúcar. "Ô poeta, que cara é essa, tá chateado? pergunta a atendente. "Não. Estou com é fome mesmo", responde.
Em seguida pede um café. "Estranho esse povo, querem que eu seja engraçado até quando estou com fome. Aí já não dá, meu camarada."
Editoria de Arte/Folhapress | ||
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