Leia perguntas e respostas com fatos e dúvidas sobre o estupro da adolescente
Gabriel de Paiva - 26.mai.2016/Agência O Globo | ||
Adolescente, vítima de estupro coletivo, deixa hospital ao lado da mãe, no Rio |
A menina de 16 anos foi estuprada?
Sim, mais de uma vez e, segundo a polícia, por vários homens. Os dois vídeos gravados no celular de Rai de Souza, 22, um dos suspeitos já presos, mostram estupros; em um deles, de 38 segundos, a vítima, inconsciente, é tocada em suas partes íntimas por ao menos um homem. No outro, de 12 segundos, homens a violentam com um objeto, enquanto ela tenta resistir. Além disso, a polícia diz que a jovem foi estuprada por traficantes enquanto esteve no lugar conhecido como "abatedouro".
O toque nas partes íntimas mostrado em um dos vídeos é estupro?
Sim. Em 2009, a lei 12.015 passou a considerar crime, além da conjunção carnal, atos libidinosos, como o que é mostrado no vídeo que foi divulgado nas redes sociais e fez o caso ganhar atenção.
Qual foi o resultado do exame feito pelo IML (Instituto Médico Legal) na vítima?
Não foram encontrados indícios de violência ou material biológico de homens, mas isso não significa que o crime não tenha ocorrido. Primeiro, o toque no órgão genital já configura estupro. Além disso, é possível que tenha havido penetração mesmo sem indícios detectáveis. Segundo a polícia, a perícia pode ter sido prejudicada pelo tempo entre o exame e o crime (quase 5 dias), pelo eventual uso de preservativos e pelo fato de a vítima estar desacordada, o que levaria à ausência de resistência e de lesões.
Que outros crimes podem ter sido cometidos?
A jovem diz não se lembrar de como foi parar na segunda casa, onde foi estuprada e filmada, indicando que pode ter sido dopada. A filmagem e a publicação do vídeo na internet também caracterizam crime, de acordo com o artigo 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente. O Ministério Público Federal investiga ainda a ocorrência de pornografia infantil na internet. Por fim, após a divulgação do estupro, a jovem e sua família foram ameaçadas de morte por traficantes.
Quantos suspeitos tiveram prisão temporária pedida?
Oito. Três deles foram presos, um já foi solto. São eles:
Raí de Souza, 22
Em depoimento à polícia, admitiu ter feito sexo consentido com a menor e gravado o primeiro vídeo que foi divulgado; se entregou após o pedido de prisão e passou a negar ter sido o autor da gravação, encontrada em seu celular; está preso temporariamente
Raphael Belo, 41
Esteve na cena de dois dos estupros e fez uma "selfie" ao lado da garota desacordada; entregou-se à polícia e está preso temporariamente
Sergio Luiz da Silva Junior, conhecido como Da Russa
A jovem disse que encontrou com ele na porta da casa onde foi violentada; ele é chefe do tráfico do morro da Barão, onde ficava a casa onde houve o estupro
Moisés de Lucena, o Canário
Segundo a polícia, foi o traficante que levou a vítima da casa onde ela dormiu para o "abatedouro", onde a estuprou. Segundo a vítima, ele a teria segurado enquanto era estuprada; ela o reconheceu por uma tatuagem no braço. Está foragido
Jefinho
Traficante do morro da Barão, estava com Raí de Souza, Raphael Belo e um quarto homem –que a polícia que seja Moisés de Lucena– no momento em que foram gravados os vídeos da adolescente sendo estuprada; está foragido
Michel Brasil da Silva, 20
Teria publicado o vídeo do crime em uma rede social; está foragido
Marcelo Miranda da Cruz Corrêa, 18
Conhecido como Juninho, também teria divulgado o vídeo em uma rede social; está foragido
Lucas Perdomo dos Santos, 20
Jogador de futebol apontado como "ficante" da vítima que esteve com ela na noite do crime; foi preso, mas liberado por falta de provas. Ficou com a amiga da vítima no dia do crime; está em liberdade
Quem mais está sendo procurado?
Segundo o chefe da Polícia Civil do Rio, Fernando Veloso, "qualquer pessoa que tenha envolvimento com o tráfico" no morro da Barão. "Independentemente da investigação pelo envolvimento com o tráfico, há o interesse de que [essas pessoas] sejam ouvidas nessa investigação comandada pela doutora Cristiana [Bento, delegada responsável pelo caso]."
Por que a polícia demorou para pedir a prisão dos suspeitos?
No dia 27 de maio, o então delegado responsável pelo caso, Alessandro Thiers, afirmou que o crime não havia sido confirmado. "A gente está investigando se houve consentimento dela, se ela estava dopada e se realmente os fatos aconteceram. A polícia não pode ser leviana de comprar a ideia de estupro coletivo quando, na verdade, a gente não sabe ainda", disse.
Por que houve a troca de delegado responsável pelo caso?
Além da demora para pedir a prisão dos suspeitos, a advogada Eloísa Samy, que defendia a vítima, acusou Thiers de constranger a adolescente durante o depoimento. O Ministério Público deu um parecer favorável e, no domingo (29), o chefe da Polícia Civil, Fernando Veloso, decidiu afastar Thiers do caso, concentrando as investigações sob a liderança de Cristiana Bento, da Delegacia da Criança e Adolescente Vítima.
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O QUE AINDA NÃO SE SABE
O que aconteceu durante as cerca de 30h em que a jovem ficou no "abatedouro"?
É o cerne da investigação. A polícia sabe como a jovem foi para a primeira casa –onde teria feito sexo consentido com Raí– na manhã de sábado (21) e suspeita que ela tenha sido levada pelo traficante Canário para o "abatedouro" no fim daquela manhã, após ficar sozinha; o que aconteceu daí até a noite de domingo (22), quando foram gravados os dois vídeos encontrados no celular de Raí, não está claro.
Quantos homens a estupraram?
Ainda não se sabe. A polícia diz que ela foi violentada ao menos duas vezes, no sábado (21) e no domingo (22). No vídeo de 38 segundos, dois homens aparecem e quatro vozes masculinas são ouvidas, segundo a perícia; um dos rapazes que estavam no quarto diz que "mais de 30 engravidou [sic]". A vítima afirmou à polícia que, quando acordou, estava sendo observada por 33 homens, todos armados com fuzis e pistola.
Como a garota chegou ao local do crime?
Em seu depoimento, a jovem disse ter dormido em uma casa e acordado em outra, sem se lembrar de como aconteceu a mudança. A polícia suspeita que o traficante Moisés de Lucena, o Canário, a tenha levado de uma casa para a outra, mas não explicou como chegou a essa conclusão nem a que horas isso aconteceu.
A vítima foi dopada?
A menina diz não se lembrar do que aconteceu entre o momento em que dormiu e a hora em que acordou. Ela nega ter usado drogas naquela noite. A amiga que a acompanhava também negou que tivessem bebido ou consumido drogas.
Existem outros vídeos do crime?
A polícia questionou a jovem sobre a autenticidade de uma segunda gravação que circula na internet, mostrando uma cena de sexo grupal, mas ela negou ser a personagem filmada. Em entrevista ao jornal "O Globo", a adolescente afirmou que há um vídeo que mostra os homens a estuprando com objetos, inclusive armas. Não está claro se é o segundo vídeo encontrado no celular de Raí
Quem foi o homem que, segundo a delegada e a advogada da menina, pediu desculpas a ela pelo crime? Em quais circunstâncias esse pedido aconteceu?
De acordo com a então advogada da garota, um dos rapazes que prestaram depoimento pediu desculpas à jovem, chorando.
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CRONOLOGIA DO CASO
21.mai.2016 - A adolescente é estuprada na madrugada no complexo de favelas São José Operário, zona oeste do Rio, após ir a um baile funk
22.mai.2016 - Segundo diz em depoimento, acorda cercada por homens armados, no mesmo dia em que volta para casa
24.mai.2016 - A vítima fica sabendo que um vídeo com ela circula na internet e volta ao morro para falar com o chefe do tráfico
25.mai.2016 - A família da menina é avisada por um vizinho sobre o vídeo. Na gravação, um grupo de homens, em meio a risadas, toca nas partes íntimas da garota e diz que ela foi violentada por "mais de 30". Em 2009, a lei 12.015 foi alterada e passou a considerar, além da conjunção carnal, atos libidinosos como crime de estupro
26.mai.2016 - A jovem presta o primeiro depoimento à polícia, é medicada em um hospital e faz exames no IML
27.mai.2016 - A menina presta mais dois depoimentos à polícia, assim como dois dos suspeitos de participar do crime; neste mesmo dia, a polícia localiza a casa em que o crime aconteceu
28.mai.2016 - A advogada da vítima, Eloísa Samy, pede à Promotoria do Rio o afastamento do delegado Alessandro Thiers, títular da Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática (DCRI). Segundo Samy, Thiers estava tratando o caso com "machismo e a misoginia"
29.mai.2016 - Pressionada, a Polícia Civil do Rio tira o delegado Alessandro Thiers do comando das investigações. O caso passa para as mãos da delegada Cristina Bento, titular da DCAV (Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima)
O Chefe da Polícia Civil, Fernando Veloso, diz, em entrevista ao "Fantástico", da TV Globo, que o laudo do vídeo sobre o crime deverá contrariar o "senso comum" e que não havia registro de sangue nas imagens. Também neste domingo, a polícia informa que a vítima entrou no Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte
A advogada da adolescente, Eloísa Samy, anuncia nas redes sociais que deixou o caso. A Defensoria Pública do Rio passa a representar a vítima. Na TV, a adolescente diz que está com medo e tem recebido ameaças de morte na internet
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