Descrição de chapéu educação

Destaque no estudo e nos esportes, garota sonha com escola particular

Crédito: Eduardo Knapp/Folhapress Sao Caetano, SP, BRASIL, 29-12-2017: ***ESPECIAL Para Domingo*** Cultura e Educacao. Descendentes de japoneses tem notas melhores em matematica. Garota Karina Satie Nakandakara, 9, que acaba de completar o 4o ano, brinca de patins no apartamento na casa da mae em Sao Caetano. ALem de ter notas altissimas em todas materias ela tb faz artesanatos, escreve historinhas (Foto: Eduardo Knapp/Folhapress, COTIDIANO).)ΩΩ
Karina patina no corredor de sua casa

ANA ESTELA DE SOUSA PINTO
DE SÃO PAULO

Quando fez 7 anos, Karina Nakandakara não pediu boneca, videogame ou bicicleta. Queria estudar numa escola particular. Quer ser médica quando crescer. Ou veterinária. Ou arqueóloga. Ou estudar artes.

A menina é destaque na escola municipal que cursa, não apenas pelas notas –a mais baixa foi um 9 em artes. Agora, se candidatou para um show de mágica, sem nunca ter aprendido um truque sequer. "Procurou vídeos na internet, treinou sozinha, e lá fui eu atrás de cartola, varinha e vestimenta", diz a mãe, Devania Lisia (ou Vânia, como é conhecida), 51.

Do palco, chamava seus colegas para participar dos números. O sucesso foi tanto que ela passou a ser cercada, durante o recreio, para ensinar os truques.

A garota foi a também única do quarto ano a avançar na Olimpíada Paulista de Física e tirou o primeiro lugar para entrar num disputado curso gratuito de inglês (1.000 candidatos, 80 vagas). Numa caixa de veludo vermelho que antes trazia bombons, acumula medalhas em judô, patinação e natação.

Vânia diz que a filha não se dava conta de que havia escolas diferentes até o dia em que sua prima começou a trabalhar num colégio particular. Numa festa, a garota se encantou com a estrutura e os recursos e, desde então, não deixou a mãe em paz.

Vânia tentou bolsas de estudo em São Caetano, onde mora, mas os descontos oferecidos ainda não couberam no orçamento da família, que há seis anos depende só do salário de Kiyoiti como desenvolvedor de software -diagnosticada com câncer, a mãe precisou parar de trabalhar.

FILHA ÚNICA

Karina, 9, é filha única. O casal tentava engravidar havia dez anos sem sucesso e, já sem esperanças, partiram para Okazaki, no Japão, como decasséguis, no final da década passada. Começaram como operários da Sony, fabricando filmadoras e câmeras fotográficas. Kiyoiti, 55, engenheiro civil, filho de okinawanos e fluente em japonês, conseguiu vaga melhor na Mitsubishi.

Mal se havia passado um ano, e Vânia engravidou. Voltou ao Brasil depois do nascimento do bebê. "Ficar lá sem família, sem apoio, é muito difícil", diz a mineira de Salinas que chegou a São Paulo com 15 anos.

Karina já ganhou prêmio até por ser curiosa: foi dela a "melhor pergunta" no suplemento infantil de um jornal regional. Aos 7 anos, queria saber "por que as flores são coloridas e as folhas não?". No apartamento em que moram, a menina não para.

Na quinta (28), às 23h56, não sossegou enquanto a mãe não enviasse à Folha um vídeo em que a garota lê –e interpreta, com direito a risada malvada de bruxa– um conto que escreveu, imprimiu e ilustrou (e quer um dia publicar). "Se descuidar um minuto, ela já está escalando árvores. Agora encasquetou de entrar para os escoteiros mirins."

Para dar vazão à inquietude de Karina, Vânia a deixa acompanhar seus trabalhos de artesanato. Com as sobras de bijuterias que ganhou da tia, criou presentes para as amigas e a família. Com meias usadas da mãe, fez gatinhos e bonecos de neve. Sem dinheiro para comprar uma Bebê Reborn, a boneca mais desejada, decidiu montar a própria linha de montagem, da qual saem bonecas em miniatura, com certificado de produção assinado pela cegonha responsável. "Já perdi as contas dos brinquedos que ela inventou e produziu para si mesmo", diz Vânia.

Karina é do tipo que vai bem sem estudar muito. Há dois anos, porém, uma nota 89 a fez abrir o berreiro. Vânia conta que foi até chamada à escola e aconselhada a não cobrar demais da filha. "Eu acompanho, claro, mas não cobro essa coisa toda. Isso é exigência dela, mesmo."

A menina só se conformou quando explicaram que a prova era de uma Olimpíada de Robótica do terceiro ano, uma série acima da dela, e que os que tiraram acima de 80 receberiam diploma. "Um 8 para mim já não é grande coisa. Fico muito chateada, porque só gosto de tirar nota alta. Penso que tenho que me esforçar muito mais", diz Karina.

E o que as colegas dizem de tanta nota boa? "A gente não fala sobre isso. Minha professora diz que não é bom ficar comentando notas. Quando estamos juntas, a gente brinca de irmãos, de familinha, de detetives, e, se elas vêm à minha casa, a gente patina no corredor."

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