São Paulo elegeu um prefeito e ganhou um candidato, afirma líder da oposição

ARTUR RODRIGUES
DE SÃO PAULO

Líder da oposição em São Paulo, o vereador Antonio Donato (PT), 57, afirma que João Doria (PSDB) teve seu primeiro ano de gestão movido por cálculos eleitorais e isso prejudicou a cidade. O petista afirma que, apesar da ampla maioria na Câmara, o prefeito terá dificuldade para conseguir implementar seu programa de privatizações. Dos 55 vereadores, 11 são da oposição, sendo 9 deles do PT.


Crédito: Eduardo Anizelli/Folhapress O vereador Antonio Donato, líder da oposição paulistana

ANTONIO DONATO, LÍDER DA OPOSIÇÃO PAULISTANA

Idade
57 anos

Origem
São Paulo (SP)

Cargo
Vereador e líder da bancada do PT na Câmara Municipal

Trajetória
Administrador de empresas, é vereador desde 2004. Foi presidente da Câmara e secretário de Governo na gestão Fernando Haddad


Folha - O prefeito Doria foi eleito com votação expressiva, mas terminou 2017 com a popularidade em queda. Para o senhor, a que isso se deve?
Antonio Donato - A cidade elegeu um prefeito e ganhou um candidato, que pouco se dedicou à Prefeitura de São Paulo. Isso tem impacto. A cidade de São Paulo é muito difícil para um prefeito 24 horas por dia. Para um prefeito ausente, com a cabeça em outros objetivos, fica mais difícil ainda. E a população sentiu isso e percebeu que o marketing inicial não se reverteu em resultados práticos.

Que fator mais influenciou?
Várias coisas aconteceram. Tem uma bem grave, que foi o corte do Leve Leite, 700 mil crianças ficaram sem [o programa, que foi reduzido, com foco nos mais pobres]. Cortes no transporte escolar, promessas não cumpridas em relação às creches. Na saúde, teve um mutirão vendido com muito marketing, mas a realidade da saúde continua muito difícil.

O prefeito admite problemas na zeladoria da cidade.
É um dos pontos muito visíveis. Porque, na medida em que colocou como peça de marketing o Cidade Linda, você cria uma expectativa sobre essa área. E o que a gente viu foi uma cidade abandonada, porque ele utilizou menos recursos que a média histórica.

Mas a gestão Fernando Haddad, do PT, também vinha cortando gastos com zeladoria.
Tem que diferenciar o que é um ajuste de fim de gestão, por conta até Lei de Responsabilidade Fiscal. É o primeiro ano, ele [Doria] recebeu R$ 5,3 bilhões em caixa [mas alega um deficit de R$ 7,5 bilhões]. Tinha as condições de ter zeladoria no padrão tradicional da cidade e isso ele não fez.

Há várias obras paradas que a gestão Doria afirma que foram deixadas pela gestão anterior sem dinheiro para terminar. Existia esse dinheiro?
Existia e existe. É uma questão de prioridade dele [Doria]. Para o Hospital de Parelheiros, faltavam cerca de R$ 20 milhões, num orçamento de R$ 50 bilhões [R$ 54,6 bi]. Não ter R$ 20 mi para acabar o Hospital de Parelheiros é um crime contra aquela população. As obras foram retomadas no final do ano, porque ele quer abrir no ano eleitoral.

O senhor diz que o hospital está sendo atrasado por opção?
Exatamente, como um cálculo político-eleitoral.

Nas privatizações, os principais projetos do prefeito passaram na Câmara. Eles estão longe de virar realidade?
Estão longe de virar realidade. Ele começou pelo fim. Aprovar projeto de lei genérico como ele aprovou era a parte mais fácil, já que ele tem uma sólida maioria na Câmara. Mas fazer os estudos, organizar o mercado, encontrar interessados é a parte difícil, que é a que ele vai ter que enfrentar agora. E eu não vejo interessados em administrar todos os parques ou os terminais [de ônibus]. Até porque o retorno para a iniciativa privada, que precisa ter, não está claro.

Crédito: Chamada Balanço das Promessas de Doria - Link para https://arte.folha.uol.com.br/cotidiano/promessas-doria

O PT é contrário a todas privatizações e concessões?
O PT não tem posição de princípio contra concessões e tampouco quer colocar esse debate em termos ideológicos. Mas ele [Doria] colocou, e os projetos que foram apresentados à Câmara não têm explicação, não param em pé e, portanto, tiveram voto contra do PT. Mas não por ser contra concessões. Até porque as concessões existentes, do lixo, transporte público, foram gestões do PT que fizeram.

*O serviço funerário, por exemplo, é um exemplo mal avaliado pela população. Eventualmente, concordando com os termos, o PT poderia apoiar a concessão? Uma das críticas que se faz, tanto ao PT quanto ao PSDB, é que, dependendo da posição que estejam, fazem oposição pela oposição. *
Em tese, sim [apoiaria]. Não temos nenhuma dificuldade da concessão ser um instrumento para implementar uma política pública, mas isso precisa ficar demonstrado com estudos e interesse público.

Doria atribuiu parte dos problemas da gestão ao Tribunal de Contas, que travou licitações importantes, como fez na gestão Haddad. O senhor concorda que o TCM pode estar excedendo o papel dele?
Nesses casos que aconteceram [neste ano], acho que não. O Tribunal de Contas exerceu seu papel. O problema é que o governo Doria, com essa suposta pressa que tem, faz projetos muito mal feitos, e ao Tribunal de Contas cabe interferir. Mas a maioria das coisas que estão paradas não tem a ver com o TCM. O órgão liberou a licitação da PPP da iluminação pública em junho e até hoje ela não saiu.

Mas essa licitação foi lançada na gestão Haddad, por exemplo. Também foi mal feita?
Existiram problemas no encaminhamento da licitação. É uma licitação complexa, mas o fato é que está liberada desde junho e o prefeito não abriu os envelopes.

Qual é o impacto de não se saber se o prefeito continuará no cargo depois de abril [prazo para sair e disputar eleição]?
Muito grande. Já foi muito grande este ano [de 2017] quando ele viajou 43 vezes. Dá quase dois meses fora da cidade. Vai prejudicando a cidade essa indefinição até abril –eu acredito que ele vai ser candidato a governador ou a presidente, não desistiu desse plano. A cidade vai sofrer muito, e o PSDB vai continuar devendo um prefeito para São Paulo. Elegeu Serra, não entregou até o fim [saiu em 2006 após um ano e três meses]. Elegeu Doria e provavelmente não vai entregar até o fim.
Continuaria alguém do PSDB, que é o Bruno Covas.
Mas ele não foi eleito [para isso]. É o vice, né?

Como o senhor vê um possível governo de Bruno Covas?
Eu conheço pouco. A única coisa que conheço é que ele foi demitido da Secretaria de Prefeituras Regionais pelo prefeito [e deslocado para a articulação política]. Não é uma boa indicativa.

A cidade não vive uma bonança financeira. Apesar disso, os vereadores aprovaram um 13º para eles. Isso condiz com o momento que a cidade vive?
Não é que aprovaram. Existe decisão do Supremo, uma decisão anterior, que existia o 13º e isso foi retirado. O impacto é mínimo nas contas públicas, é de R$ 2 milhões, R$ 3 milhões. Por exemplo, se gasta muito mais em publicidade com a grande imprensa do que com esses recursos.

O líder da máfia do ISS, Ronilson Rodrigues, decidiu fazer delação, que citaria vereadores. Agora que investigações sobre o senhor foram arquivadas na Justiça e na Controladoria, como vê a possibilidade de uma nova delação?
Com absoluta tranquilidade. Eu já passei por isso, meu caso foi arquivado.

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