Avaliar para punir é uma distorção, diz crítica das reformas nas escolas de Nova York
A reforma educacional que o prefeito Michael Bloomberg implementou nas escolas públicas de Nova York não é unanimidade entre especialistas. Uma das vozes mais importantes a se posicionar criticamente às mudanças é a da historiadora Diane Ravitch, professora da Faculdade de Educação da Universidade de Nova York.
Para ela, a cultura de avaliação com consequências punitivas é uma distorção que gera efeitos perversos no sistema educacional, como o estreitamento do currículo apenas em disciplinas que contam em testes, caso de leitura e matemática.
Ex-consultora do Ministério da Educação na gestão do presidente George Bush (pai), suas opiniões têm repercutido na imprensa americana, especialmente depois que ela lançou o livro "The Death and Life of the Great American School System" ("Vida e Morte do Grande Sistema Americano de Educação", sem tradução no Brasil).
Veja abaixo a entrevista de Ravitch à Folha:
FOLHA - Nova York tem registrado ganhos significativos na taxa de aprovação dos alunos. Isso não mostra que as mudanças estão dando certo?
DIANE RAVITCH - O sistema implementado na cidade de Nova York tem muitas falhas. Há muita publicidade feita por aqueles que estão no comando. Quando avaliada por testes nacionais, a cidade apresenta apenas pequenos ganhos em matemática nos últimos oito anos, e quase nenhum em leitura. Também não se verifica qualquer progresso incomum para afro-americanos ou hispânicos, que normalmente têm notas mais baixas que brancos e asiáticos.
É verdade que as taxas de conclusão do ensino médio aumentaram, mas considere também o fato de que 75% dos alunos formados pelo sistema que ingressam na Universidade da Cidade de Nova York (destino mais comum) entram mal-preparados e precisam de aulas de reforço.
FOLHA - O que está errado, em sua opinião?
RAVITCH - Ao se concentrar tão intensamente em resultados em testes, o sistema de ensino da cidade estreitou o currículo das escolas. Resultados em testes em ciências e estudos sociais são muito ruins, mas eles não são considerados no sistema de avaliação federal ou estadual. A forte dependência das escolas do resultado em testes fez com que disciplinas como história, geografia, línguas estrangeiras, ciências, artes, e outras fossem deixadas de lado.
FOLHA - Mas não é importante avaliar as escolas para que a gente possa melhorar o aprendizado dos alunos?
RAVITCH - O problema não está na avaliação, mas no desvio que se faz de seus objetivos. Testes são importantes, na medida em que produzem informações úteis. Eles devem ser usados para ajudar professores e alunos, e não para puni-los.
O problema que nossa política de prestação de contas é fundada na crença utópica de que 100% dos alunos atingirão altos níveis de proficiência. Quando isso não acontece, as escolas e seus professores são punidos, estigmatizados por não atingir esta meta irrealista.
O programa No Child Left Behind (política federal criada na gestão do ex-presidente George W. Bush --o filho-- e que, assim como Nova York, também relaciona resultados em avaliações com consequências punitivas) também comete o erro de impor exigências absurdas para professores e escolas.
Colocar pressão sobre as escolas não leva a uma melhoria da qualidade. Em vez disso, leva a um estreitamento do currículo, pois os professores enfatizarão apenas as disciplinas e temas que são testadas, negligenciando o que fica de fora das avaliações. Estamos gastando milhões para preparar crianças para testes. Isso pode levar a um aumento da pontuação, mas se mudarmos esses testes, as crianças se sairão mal.
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