Novo índice quer mostrar realidade ribeirinha do interior do Amazonas
Carauari, a 542 km de Manaus, seguiu o exemplo nacional e atingiu a meta estabelecida para o Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) de 2013, com a nota de 4,2. No Brasil, a média foi de 4,9 e a cidade amazonense não está muito longe da realidade nacional. Ou está?
As escolas avaliadas pelo índice são todas da área urbana do município e não condizem com a realidade apresentada pelos ribeirinhos. "Os professores que vêm [lecionar na comunidade] são aqueles que têm o ensino médio, não têm ainda a faculdade", conta a moradora da reserva extrativista Médio-Juruá Marcejane Rodrigues, 35.
Outro problema apontado por ela é o acesso à saúde. Ainda que Carauari tenha registrado quatro mortes para cada mil habitantes em 2013 –em Manaus foram cinco no mesmo período–, Marcejane relata que muitas vezes é preciso ir de chalana para a área urbana atrás de atendimento médico.
"A gente chama o resgate, mas sempre tem que encontrar eles no meio do caminho. A maioria das vezes, eles nem vêm", relata.
Para mostrar essa realidade das comunidades distorcida nos dados oficiais, a Natura, a Coca-Cola e o Ipsos construíram o IPS (Índice de Progresso Social) Comunidades. A metodologia é do SPI (Social Progress Imperative), responsável pela apuração do índice global e do IPS Amazônia.
Dividido em três aspectos principais, o IPS Comunidades mede o progresso social da zona rural de Carauari. A pesquisa já existe em níveis nacional e municipal, mas pela primeira vez chega às comunidades.
"O IPS de Carauari é enviesado pela parte urbana", explica Renata Puchala, gerente do Programa Amazônia e Desenvolvimento Social da Natura, sobre como o índice esconde a realidade ribeirinha.
Outro diferencial é a apuração com dados primários, ouvindo as 400 famílias da região. "O IPS Amazônia utiliza dados secundários, como IDH e PIB", afirma Pedro Massa, diretor de Valor Compartilhado da Coca-Cola.
VIDA URBANA X VIDA RURAL
Nas questões apontadas por Marcejane, o IPS confirma a realidade distinta entre as zonas urbana e rural. Dentro de Fundamentos para o bem-estar, o acesso ao conhecimento básico é exemplo da diferença: enquanto a zona urbana atingiu 66, no índice que vai até cem, a região do Médio-Juruá ficou com 58.
Outro componente, a saúde e o bem-estar reflete o que foi apontado pela moradora, que complementa: "No município sempre tem mais facilidade, né, porque tem tudo." Enquanto a Carauari Urbana alcançou 68, as outras comunidades não ultrapassaram a marca do 57.
Já em Necessidades Humanas Básicas, o componente água e saneamento apresentou os dados mais distintos. Na área urbana, ele é de 65 e no Médio-Juruá, 40. Mas outra comunidade obteve resultados mais alarmantes: a Área de Baixo atingiu apenas 13 pontos.
Adevaldo Dias, 42, também é morador do Médio-Juruá e reforça o problema do acesso à água potável. "As comunidades estão todas na margem do rio Juruá, mas o nosso acesso à água é um dos maiores problemas. Nós temos água, mas não é tratada", diz.
Com pós-graduação, Adevaldo sabe da dificuldade do acesso ao ensino superior na região. Isso porque todas as universidades do Amazonas estão na capital do Estado, a pouco mais de 500 quilômetros dali.
O RELATÓRIO
"O índice funciona como uma ajuda para, quando formos bater na porta do governo atrás de políticas públicas, termos esse índice, que não é de governo, mas é científico", afirma Dias, sobre o IPS Comunidades.
A iniciativa da Coca-Cola e da Natura partiu do fato de as empresas atuarem na região, mas não conseguirem medir o impacto social. Para Puchala, o dado servirá para "adotar as melhores práticas e saber que políticas colaboram ou não colaboram" nessas comunidades.