'Não teve painel no Fórum Mundial em Davos que não se falasse de educação'
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Cybele Amado de Oliveira, educadora e presidente do ICEP, e Maurício Minas, Diretor Vice-Presidente Executivo do Bradesco, no Fórum Econômico Mundial em 2017 |
Em sua primeira participação no Fórum Econômico Mundial, em Davos, o fato que mais chamou a atenção da brasileira Cybele Amado, 49, foi o protagonismo dos temas sociais, em um momento de crise mundial e da posse de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos.
"Não teve um painel que eu tenha ido – de saúde, infraestrutura, negócios,– em que não houvesse uma conversa relacionada à Educação", destaca a empreendedora social à frente do Instituto Chapada de Educação e Pesquisa (ICEP) e vencedora do Prêmio Empreendedor Social 2012.
Entre os dias 17 e 20 de janeiro, ela esteve na Suíça, ao lado de líderes mundiais, empresários, autoridades e personalidades entre os cerca de 3.000 participantes do encontro anual, que neste ano teve como tema "Liderança Responsiva e Responsável".
"Responsividade é a capacidade de responder às coisas colocando-se no lugar de quem também se compromete com aquela resposta", esclarece a educadora, que foi uma das convidadas da Fundação Schwab, entidade irmã do Fórum Econômico Mundial, que atua no fomento ao empreendedorismo social.
Segundo ela, mais da metade das 400 sessões se concentraram na temática da inclusão social e sua importância para o desenvolvimento. Houve ainda 30 sessões dedicadas a buscar maneiras melhores de lidar com as crises humanitárias, além dos incontáveis encontros entre empreendedores sociais.
Os membros da Rede Schwab de Empreendedores Socais, que conta hoje com 360 líderes em 60 países, foram desafiados a contribuir com ideias para que o crescimento econômico pressuponha necessariamente o bem estar social.
"Saí de Davos com a responsividade ainda mais marcada em mim. Com o espírito mais entusiasmado e fortalecido, para continuar o trabalho de Educação que a gente vem fazendo, porque ainda há muito o que fazer", diz Cybele.
O ICEP, fundado por ela, tem sede na Bahia, e auxilia diversos municípios a melhorarem suas políticas públicas na área de Educação. Seu foco, desde a fundação, em 1997, sempre foi a qualidade do ensino público e a erradicação do analfabetismo.
No fórum, Cybele teve a oportunidade de compartilhar a experiência exitosa e as inovações no campo da Educação que o Instituto e sua equipe vêm desenvolvendo há mais de 20 anos e alinhar esse pensamento com as principais temáticas mundiais sobre o assunto.
"Eu sinto que o tema da Educação precisa ser pautado com muita força, com muita veemência, já que as origens de boa parte dos problemas que nós temos no mundo estão diretamente relacionadas a ele."
Em reuniões paralelas, Cybele pôde debater alternativas para a Educação com especialistas como Jacques Werra e Pierre Willa, Vice-reitor e diretor de relações Internacionais da Universidade de Genebra. O tema também despertou o interesse de representantes do mundo empresarial, como Maurício Minas, vice-presidente Executivo do Bradesco; e Mauricio Muller, Presidente para a América Latina do Grupo Royal DSM.
Dentre as perspectivas abertas, está a valorização da responsabilidade social empresarial. "Os três setores estavam reunidos em Davos. É evidente a importância da interação entre eles para que tenhamos novos projetos e recursos para a área social, com planejamento do Estado, gestão social e o empuxo dado pelos fundos oriundos das empresas", destaca Cybele.
GLOBALIZAÇÃO AMEAÇADA
Em um mundo onde os oito mais ricos têm patrimônio igual à metade mais pobre da humanidade, crises com refugiados são constantes. Quem esteve em Davos pôde optar por sentir uma fração da agonia dos refugiados. "Você entrava num espaço e eles criavam um ambiente, simulado, em que você 'vivia', digamos assim, o que eles passavam. Uma simulação criada por refugiados mesmo. Você sentia o que eles sentiam. Era bem forte, uma coisa impressionante. Vimos diretores de organizações chorarem", conta Cybele.
Para ela, a crise econômica indica o caminho de uma grande transformação que será necessária. "Parece que convida a uma mudança: se nós continuarmos acreditando que poucos terão muito e muitos terão nada, vai ser difícil a gente dissolver essa crise. É preciso distribuição de renda, uma percepção de uma economia mais solidária, mais colaborativa."
O fundador do Fórum, Klaus Schwab, escreveu ao "Financial Times" um artigo em que afirma que a retórica antiglobalização está ameaçando a economia colaborativa. Não por acaso, o último dia do evento coincidiu com a posse do novo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Cybele conta que a maioria dos participantes parecia impactado e receoso. "Eles diziam: 'Meu deus, como vai ser o mundo agora?'"
A educadora se diz surpresa com a onda conservadora. "Não imaginávamos que estaríamos nesse 2017 caminhando alguns passos para trás. É para se pensar mesmo,estudar, e continuar vendo que tendências são essas."
No entanto, apenas distribuir renda também não basta. "É preciso tomar consciência, uma construção cultural, de que, para termos relações mais igualitárias e equidade, vai ser necessário um esforço. Alcançar um lugar mais colaborativo que exploratório."
Cybele destaca uma frase de Hilde Schwab, cofundadora da fundação que leva seu sobrenome, sobre o papel que pode desempenhar no mundo. "Os Empreendedores Sociais são os arquitetos das sociedades em que queremos viver: sociedades que oferecem oportunidades educacionais a todos. Sociedades que respeitam os direitos das mulheres. Sociedades que ajudam nossos cidadãos mais vulneráveis a ter sucesso."