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Marcelo Mello

Quem é ele?

Marcelo Feijó de Mello, 49, psiquiatra

Organização: Instituto Prove
Ano de fundação: 2008
www.unifesp.br/dpsiq/prove

Médico e professor, com dois doutorados e um pós-doutorado em psiquiatria, é mentor do Instituto Prove, organização originada na Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) que promove pesquisa e atendimento às vitimas de TEPT (Transtornos de Estresse Pós-Traumático). Pioneiro no tema, que acomete 25% da população sujeita a traumas causadas pela violência, já fez mais de 6.000 atendimentos em São Paulo. Também trabalha com capacitação de profissionais de saúde, além de prestar consultorias especializadas em saúde mental. Atualmente, é parceiro do CCVI (Comitê da Cruz Vermelha Internacional), para atender vítimas em zona de conflito em sete comunidades na cidade do Rio de Janeiro.

Cura da violência

Pioneiro, psiquiatra rompe os muros da universidade no estudo e no tratamento de transtorno de estresse pós-traumático

RAQUEL BOCATO
DE SÃO PAULO

"É um assalto", avisou o garçom da pizzaria em Maceió à clientela, em janeiro de 2010. Cinco homens armados com metralhadoras haviam invadido o restaurante. ¦Dez meses depois, o médico Marcelo Feijó de Mello, 49, ainda sonha com a cena, vivida com a mulher, Andrea, 43, e o filho, Ricardo, 13.

Marcelo lembra dos gritos "celular, senão vai morrer" e do medo que o paralisou. Não teve sequelas físicas, mas a experiência deixou marcas. "Senti na pele o que eu via [no consultório]", diz, sobre temor e pesadelos.

Foi a primeira experiência de violência presenciada pelo psiquiatra, que desenvolve estudos sobre transtorno de estresse pós-traumático na Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e, há dois anos, instituiu o Prove (Programa de Atendimento às Vítimas de Violência e Estresse) fora dos muros da academia.

"[Dizem] que sou louco", afirma, sobre comentários de colegas à criação da instituição, que atende vítimas de situação traumática intensa, na qual há risco de morte.

Mas não poderia deixar de receitar tratamento após fazer o diagnóstico. "Nossa sociedade está doente", avalia, acrescentando que os índices de estresse pós-traumático no Brasil são similares aos de países onde há guerras.

Os estudos sobre o tema tiveram início nos EUA, em 2001, quando recebeu bolsa de pós-doutorado. Lá, testes de laboratório combinavam-se com passeios em família. Estudos sobre o hormônio cortisol mesclavam-se com bonecos de neve.

A opção da tríade Marcelo, Andrea e Ricardo foi dedicar-se com paixão às atividades profissionais/escolares, sem descartar o tempo juntos.

Filho de pais separados na década de 1970, o médico ficou com o pai, apesar de ter passado meses com a mãe. Para ele, foi a experiência mais traumática de sua juventude, época em que desquites eram pouco comuns. "[Passei por] uma situação difícil num momento em que eu estava entrando na adolescência", diz Marcelo, que herdou do pai a liderança.

Hoje, duas vezes por semana, passa as tardes na natação com Ricardo. É com ele que se arrisca no videogame. Com Andrea, professora de psiquiatria na Unifesp, onde ele é professor-adjunto, a parceria se estende até o Prove, local em que ela também atende pacientes. "Todo mundo tem um papel bem intenso na família."

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Conheça mais sobre o Instituto Prove

Vítimas de violência apresentam com frequência problemas de saúde mental, que na maioria das vezes são desconhecidos por elas próprias. Também são desconhecidos ou ignorados pelo sistema público de saúde.

Inexiste, no Brasil, política pública de atendimento a pacientes vítimas de algum tipo de violência traumática. Também não há formação ou capacitação específica para profissionais de saúde.

O único serviço disponível para a população na área de psiquiatria é o dos Caps (Centros de Atenção Psicossocial), que atendem pacientes em situação emergencial, com transtornos graves, mas não diretamente ligados a vítimas de violência.

Também não há no país uma cultura de que o psiquiatra é um profissional da área de saúde. Quem passa por qualquer problema de saúde mental menos grave não tem a quem recorrer. Se procura um posto de saúde, invariavelmente é atendido por um profissional de outra área. Outro fator intrínseco é a crença preconceituosa de que a saúde mental existe apenas para "loucos". Nesse sentido, há uma grande lacuna nos serviços médicos da área de psiquiatria.

Quem mais se encarrega de resolver essa carência do Estado são as ONGs, que tentam, à sua maneira, tratar esses pacientes. Mas são serviços pontuais, distantes da pesquisa científica psiquiátrica.

O Instituto Prove nasceu para derrubar todos esses estigmas. E, ao iniciar atendimento a pessoas traumatizadas por algum tipo de violência, moral ou física, a organização tornou-se a primeira ONG brasileira especializada no tema hoje é referência no Brasil e no exterior.

Outra inovação do instituto foi levar a universidade brasileira de alto padrão, na área de saúde mental e violência, para o campo onde o problema é endêmico. É o caso da assistência que presta no núcleo Capão Redondo (SP) e em sete favelas do Rio de Janeiro.

O Instituto Prove existe por conta de duas forças principais: uma é proveniente da determinação e da formação acadêmica de Marcelo Mello, seu fundador. A outra, da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), que financia a pesquisa, além de prestar apoio ao instituto.

Com orçamento de R$ 413 mil para este ano, até o momento, a maioria (86%) das receitas é financiada por um único parceiro (Instituto Rukha), o que fragiliza sua sustentabilidade financeira.

Ciente disso, tornou-se Oscip com o intuito de viabilizar o aumento das receitas para ampliação do espaço tanto para atender mais pacientes quanto para realizar mais cursos. Para isso, o Prove desenvolve serviços de capacitação de profissionais ligados à área de saúde. Nesse sentido, a aposta foi assertiva e, possivelmente, será o caminho da autossustentabilidade da organização. Com apenas nove meses deste ano, a receita relativa à prestação de serviços aumentou em relação à do ano passado foi de 3% em 2009 para 10% em 2010. Um excelente sintoma para as finanças da empresa. Mesmo assim, ainda é insuficiente para arcar com as despesas da instituição, a receita deverá atingir 68% do orçamento deste ano.

O Prove também recebe doações. A Unifesp, por exemplo, fornece a infraestrutura básica de atendimento, como móveis e computadores, além de assistência técnica em informática e serviço de segurança. O hospital São Paulo auxilia com material hospitalar e formulários médicos. Já o Gimba doa suprimentos.

O instituto conta com equipe médica altamente capacitada e comprometida. Falta-lhe, contudo, aumentar a equipe administrativo-financeira para sustentar a expansão no médio prazo.

Principais parceiros: Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), Ceinp (Centro de Investigações em Neuropsicanálise), CICV (Comitê Internacional da Cruz Vermelha), CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), Gimba, Instutito Rukha, Secretaria Municipal da Educação do Rio de Janeiro e Unifesp.

Desde que a iniciativa surgiu, há seis anos, já foram realizados mais de 6.000 atendimentos (cerca de 800 pessoas). Desde que se desligou oficialmente da Unifesp, em 2008, o Instituto Prove realizou 3.500 atendimentos.

A organização comprova cientificamente seu impacto social, com índice de 60% de sucesso nos atendimentos. Como o instituto tem origem acadêmica em saúde, todas as intervenções são mensuradas por meio da aplicação de escalas que avaliam sintomas, funcionamento, satisfação e qualidade de vida. As pesquisas são em geral financiadas por meio de organizações de fomento, como Fapesp, CNPq e Capes.

A instituição teve início na Vila Clementino, em São Paulo, como parte do atendimento da Unifesp, mas alcançou um posto avançado no Capão Redondo. Hoje atende a pacientes que vêm dos rincões mais longínquos da cidade.

Há também, no Rio de Janeiro, um braço do Prove que lida com a capacitação de profissionais de saúde, programa apoiado pela Secretaria Municipal da Educação do Rio de Janeiro. Também atende a vítimas da violência urbana em sete comunidades fluminenses.

No âmbito da pesquisa, já foram desenvolvidos 15 projetos, que disseminam a metodologia Prove entre os profissionais da área de saúde. O empreendedor também tem dois livros publicados sobre a área em que atua.

Além das pesquisas e dos cursos que a associação promove, há um projeto, que ainda não foi iniciado, mas que pode se tornar o grande distribuidor da metodologia Prove na rede pública, que é a parceria com o Fumcad (Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente). Nessa parceria, está prevista capacitação de um grupo de técnicos que repassarão o trabalho para toda a rede regional do Fumcad.

Outras instituições também têm procurado o Instituto Prove para fazer cursos de aperfeiçoamento, supervisão e pós-graduação, além de atendimentos. Nesses encontros, sempre são promovidos intercâmbios de pesquisa e de know-how.

O TEPT (Transtorno de Estresse Pós-Traumático) é um quadro psiquiátrico que acomete indivíduos que passaram por uma situação traumática muito intensa. Nesse evento, o indivíduo pode ter sido a própria vítima ou pode ter apenas presenciado o fato.

Acontecimentos traumáticos que podem desencadear esses transtornos são caracterizados por experimentos ou testemunhos de ameaças de morte ou lesão grave em relação a si próprio ou a pessoa conhecida, que resulte diretamente em medo intenso, desespero ou horror.

Uma pessoa, ao ser exposta a uma situação traumática violenta, desenvolve uma reação aguda de estresse, que dura no máximo 30 dias e desaparece. Porém, de 15% a 20% dessas pessoas desenvolverão o TEPT. Nesse caso, os sintomas da reação aguda persistem e tomam as características da doença. Em algumas situações, o paciente não a desenvolve imediatamente. Podem ocorrer ataques distantes do episódio.

A vítima geralmente fica assustada e hipervigilante. Está sempre alerta e tem muita ansiedade, além de insônia. O TEPT é, além de grave, um quadro crônico, que, se não tratado, pode durar anos. Também implica vários quadros associados, como depressão.

A revivência do trauma (imagens, sonhos, "flashbacks") passa a atormentar a vítima, que vivencia o episódio a todo momento. As crises são acompanhadas de intenso sofrimento. E, para não revivê-las, o paciente começa a evitar situações que possam desencadear lembranças, como assistir a filmes ou noticiários que remetam ao assunto. Com isso, vai se isolando, o que agrava o quadro. Quando não tratado, pode levá-lo ao abandono do emprego e da vida em sociedade.

O TEPT tem tratamento, que deve ser feito por especialistas. Inclui medicações antidepressivas, ansiolíticas e estabilizadoras do humor. A inclusão da psicoterapia é fundamental, comos a terapias cognitiva-comportamental e interpessoal. As terapias são breves e focais.

Para conter o alto índice (25%) de estresse causado pela violência na cidade, maior responsável pela incidência de TEPT, o Instituto Prove desenvolve uma metodologia rica e densamente comprovada para atender seu público-alvo. Com isso, ele cumpre seu papel de cunho científico e social, suprindo lacunas da saúde pública brasileira.

O Prove desenvolveu e testou ferramentas de diagnóstico e intervenção desses problemas dentro da realidade brasileira. Também treinou profissionais de saúde mental e está capacitando profissionais do programa de saúde da família que trabalham em regiões de guerra urbana no Rio de Janeiro. Fará treinamento de professores e outros profissionais em escolas nessa mesma situação para diminuir o "bullying" (violência física ou psicológica, intencional e repetida, praticada por indivíduo ou grupo).

Com programas de atendimento clínico individual, psicoterapia em grupo, tendo como base o atendimento conforme as técnicas de psicoterapias mais indicadas para este transtorno, e psicanálise, a organização trabalha para tratar ou inibir os sintomas desse mal, hoje, cada dia mais frequente na vida das pessoas.

Além disso, todos os profissionais vinculados ao Prove estão inseridos em programas de pós-graduação, que são voltados à pesquisa e ao tratamento eficaz da doença.

  • Programa de Atendimento às Vítimas de Violência: destina-se ao atendimento da população vítima de trauma decorrente da violência. Também se destina à pesquisa. Para isso, a organização conta com equipe multidisciplinar, composta por profissionais especializados em psiquiatria, psicologia, enfermagem e educação física. Em dois anos de atuação, o Instituto Prove atendeu 2.800 pessoas em sua sede, na Vila Clementino, e 800 no núcleo Capão Redondo (Instituto Rukha).
  • Clínica de Terapia Interpessoal: exerce atividades de ensino. Seu principal objetivo é desenvolver conhecimento científico e promover capacitação de profissionais de psicoterapia. Os cursos promovidos seguem as diretrizes propostas pela Sociedade Internacional de Psicoterapia Interpessoal. Além do curso introdutório de formação, também são ministrados cursos para outros contextos clínicos, como transtorno de estresse pós-traumático, transtorno bipolar do humor, terapia interpessoal de grupo e transtornos alimentares.
  • Consultorias: o Instituto Prove também tem contrato de consultoria de serviços com o CICV (Comitê Internacional da Cruz Vermelha), no Rio de Janeiro, com objetivo de prestar assistência em saúde mental às pessoas afetadas pela violência urbana em sete comunidades do Rio de Janeiro.

"Fui agredida por um aluno há um ano. Esse aluno tinha 11 anos e muitos problemas. Todo dia ele chorava. A mãe falava que ele não tinha nada. Um dia, o estudante chegou atrasado com a avó. Eu [o] chamei: "Vamos [entrar]. Não posso ficar tanto tempo fora da sala".

Ele pegou meu braço e... (pausa) bateu no corrimão. Não largou e tive que chamar dois alunos [para me ajudar]. Eu não podia fazer nada. Ele acabou descontando a revolta na pessoa mais próxima. A mão inchou. Alguns nervos foram macerados.

Na hora, não achei que eu fosse desenvolver isso [TEPT]. Já havia passado por outras situações de estresse, mas o amor pelas crianças era maior. Dou aula há 15 anos para turmas de 42 alunos em escola municipal.

Trabalhava dentro da favela e tinha paixão pelo que eu fazia, era opção de vida minha. Já rolei da escada, já presenciei policiais dentro da escola. [A violência] nunca me chocou tanto.

Fui ao médico, engessei a mão e comecei a ter angústia, sonhos horrorosos. Não dormia à noite. Era um sofrimento muito grande. Fui me isolando. Hoje tenho pavor de crianças.

Eu passei por, no mínimo, dez médicos [antes de obter o diagnóstico]. Nunca fui covarde. Mas, na hora do desespero, doeu tanto, tanto. Eu me assustava com esses pensamentos. Eram pensamentos feios em alguém que sempre gostou da vida.

Eu não era uma pessoa má. Eu estava doente. Precisava me tratar, mas um tratamento correto, certo. Eu falei [para o médico]: 'Me ajude, eu vou fazer uma loucura'.

Fui encaminhada a um serviço da prefeitura. Lá, me encaminharam para o Prove. Fui atendida com muito carinho. Diagnosticaram transtorno de estresse pós-trauma. Eles me dão remédios que eu preciso.

Uma caixa com 14 comprimidos de um dos remédios custa R$ 700. Preciso de duas caixas por mês e tomo outros três remédios diferentes. Venho três vezes por semana --consulta individual e duas terapias de grupo.

Estou aprendendo a lidar com essa situação e a como me posicionar, porque perdi o equilíbrio. A gente está aprendendo a conviver novamente conosco, a aprender a aceitar essa nova pessoa. É libertador.

Hoje estou conversando com você e não estou chorando. Falar que eu estou curada, eu não estou. Mas, se eu parar a terapia aqui, eu caio.

[Em um ano,] eu me vejo curada, trabalhando, produzindo, muito ativa como sempre fui. Queria trabalhar com crianças em hospitais e fazer uma pós no [hospital] A.C. Camargo."

Josi Duarte, 49, professora municipal licenciada

 
Patrocínio: Coca-Cola Brasil e Portal da Indústria; Transportadora Oficial: LATAM; Parceria Estratégica: UOL, ESPM, Insper e Fundação Dom Cabral
 

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