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Aplicativos e câmeras da moda incentivam 'hiperdocumentação' do cotidiano na web
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GIULIANA DE TOLEDO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Você sabe o que seus amigos fizeram no verão passado --e neste também. É só entrar em qualquer rede social para ser bombardeado por dias ensolarados, asas de avião e drinques na praia.
"Sem a câmera, sinto que perco algo importante", diz blogueira
Opinião: Somos todos celebridades
O hábito de registrar tudo --das férias à ida ao restaurante-- ganhou força com a popularização dos smartphones e de aplicativos que "filtram" e dão mais cores à realidade. É a "hiperdocumentação" do cotidiano.
O que motiva os "instagramers" (usuários da rede social de compartilhamento de imagens) é o desejo de ser valorizado socialmente, segundo o psicólogo Cristiano Nabuco, do Hospital das Clínicas de São Paulo. "As pessoas abrem mão da sua privacidade em troca de um afago na cabeça, que é representado pelo curtir", diz ele.
Por dia, em todo o mundo, são publicadas 40 milhões de fotos no Instagram, que possui 90 milhões de usuários ativos por mês, segundo dados recentes da empresa (que não revela números do Brasil).
Reprodução/Instagram | ||
Montagem com fotos retiradas do Instagram de Rafael Noris, Beatriz Machado, Heloísa Rocha e Amanda Inácio |
No próximo mês, chega ao mercado a câmera sueca Memoto, que tira uma foto a cada 30 segundos. A novidade tem quase 3 cm, GPS embutido, pode ser presa à roupa e dispara sozinha, sem necessidade de comando. A bateria dura até 48 horas.
"Hoje, fotografamos mais do que nunca, mas temos dificuldade em organizar as imagens. Com a Memoto dá para saber quando e onde foram feitas todas as fotos", disse à Folha o sueco Oskar Kalmaru, um dos criadores do produto. A câmera custa U$ 279 (R$ 554) e já foi encomendada por 2.800 pessoas.
Para o fotógrafo Carlos Recuero, professor da UCPel (Universidade Católica de Pelotas) e pesquisador do tema, os álbuns virtuais têm a mesma função dos antigos álbuns de papel. A diferença (e o que motiva mais a mania) é a repercussão. "Não é mais preciso esperar as visitas em casa para mostrar as fotos", diz.
Essa banalização de cliques é positiva, na visão de Wagner Souza e Silva, fotógrafo e professor da USP.
"A fotografia data de 1839, mas acho que está sendo descoberta agora. Fotografar está deixando de ser documentar grandes fatos. Pequenas histórias do dia a dia passam a ter valor informativo. Isso não pode ser desprezado."
Para Andréa Jotta, psicóloga do Núcleo de Pesquisa de Psicologia em Informática da PUC-SP, o hábito pode ser prejudicial quando registrar fica mais importante do que aproveitar a experiência. "O estímulo para fotografar não deve ser só exibir a imagem. Ninguém precisa acompanhar sua vida amiúde. Nesse caso, nem você está acompanhando-a de verdade."
RETRATO DE FAMÍLIA
Das últimas cem fotos publicadas pelo analista de redes sociais Rafael Noris, 43 são do filho Miguel, 2, retratado em um blog desde seu nascimento. "Tento não ser monotemático", afirma Rafael, 23, fundador do grupo Instagramers Campinas, que reúne usuários do aplicativo para encontros de fotografia na cidade. Há 300 grupos desses ao redor do mundo.
Avener Prado/Folhapress | ||
Rafael Noris, 23, e seu filho Miguel, 2, em Campinas |
"O que gosto no Instagram é a possibilidade de ver as coisas com os olhos de outra pessoa", diz ele.
Mas, às vezes, ver as aventuras alheias pode não ser bom. Estudo recente da Universidade Humboldt e da Universidade Técnica de Darmastadt, na Alemanha, feito com 600 pessoas, apontou que um em cada três entrevistados se sentia insatisfeito com a própria vida depois de acessar o Facebook.
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