Usuária de plano poderá ter acesso a percentual de cesáreas dos médicos
O governo lançou três propostas, nesta terça-feira (14), para enfrentar o que vê como uma "epidemia" de cesarianas na saúde suplementar.
Uma das medidas em discussão é garantir à usuária do plano acesso aos percentuais de parto normal e cesáreo do médico e do serviço que ela pretende utilizar.
O governo também propõe distribuir a essas gestantes cartões de acompanhamento do pré-natal, semelhantes aos ofertados pelo SUS. A carteira também traria informações sobre os riscos do parto cesariano desnecessário.
Alex Argozino/Editoria de Arte/Folhapress | ||
A terceira proposta é obrigar o médico a preencher um "partograma", gráfico no qual é registrado o desenvolvimento do parto, com dados como a frequência das contrações e o estado do bebê. Sem isso, o médico não receberia pelo procedimento.
As medidas constam de uma consulta pública lançada pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar). Contribuições podem ser enviadas entre 24 de outubro e 23 de novembro.
RISCOS
O parto cesáreo representou 84,6% dos nascimentos via planos de saúde em 2012. Na rede pública, esse percentual ficou em 40%. E, na saúde como um todo, em 55,6%. A OMS (Organização Mundial da Saúde) recomenda que não passe dos 15%.
Karla Coelho, gerente de atenção à saúde da ANS, lista os riscos associados à massificação da cesárea. "A cesariana aumenta 120 vezes a probabilidade de o bebê nascer prematuro, precisando de UTI neonatal. Cerca de 25% dos óbitos neonatais e 16% dos óbitos infantis são causados por prematuridade."
Desde 2010, o Ministério Público Federal cobra mais regulação do setor privado para contornar as altas taxas de parto cesariano no país.
Para o ministro da Saúde, Arthur Chioro, a solução não está em aumentar os valores pagos aos médicos pelo parto normal. Ele diz que é preciso mudar a cultura do país e que a cesariana sem indicação é "uma intervenção inadequada para atender a um desejo inadequado, muitas vezes por desinformação".
João Steibel, da Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia), avalia as três medidas como positivas e concorda que o caminho passa por mudar o entendimento de médicos e pacientes.
Raquel Cunha/Folhapress | ||
A administradora Ana Luisa Beall, 35, que conta ter sido induzida a fazer cesárea |
Já a obstetriz Ana Cristina Duarte, coordenadora do Gama (Grupo de Apoio à Maternidade Ativa), avalia as propostas como "paliativas" e defende uma mudança profunda no sistema. "A mulher tem que usar o plantonista [do hospital], tem que ter à disposição uma assistente ao parto humanizado, ter direito à assistência básica por obstetrizes e enfermeiras obstetras e médicos para casos de alto risco. É como funciona no mundo inteiro", diz.
O governo pretende lançar projetos-pilotos de novos modelos de atendimento ao parto, em parceria com o hospital Albert Einstein.
André Longo, diretor-presidente da ANS, diz que as propostas contribuem para a solução do problema, com a maior oferta de informações à gestante, mas afirma que não há "saída mágica".
SEM MOTIVO
São comuns os relatos de mulheres que afirmam terem sido induzidas por seus médicos a fazer cesariana.
A administradora Ana Luisa Beall, 35, conta que havia se preparado com hidroginástica para o parto normal. Nas primeiras contrações, sua obstetra pediu que ela fosse para o hospital.
Por telefone, a médica a internou e foi administrado o hormônio oxitocina, que induz as contrações uterinas.
Depois de passar quatro horas com dores, diz Ana Luisa, a médica afirmou que ela teria mais horas de dor e não havia garantia de o parto ser normal mesmo assim. Por fim, sugeriu a cesárea. "Na hora, com tanta dor, não conseguia raciocinar. Aceitei."
Após o parto, em 2010, Ana Luisa soube de casos semelhantes ao seu e engajou-se na luta contra a chamada "violência obstétrica".
Já Thaís Coccaro, 28, optou pela cirurgia nos partos de suas duas filhas e não se arrepende. "Esperei até 40 semanas. Como não deram sinal, fiz cesárea. Tenho medo da dor do parto normal."
Colaborou GABRIEL ALVES
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