Friedenreich deixou a bola e liderou batalhão na Revolução de 1932
O mais famoso jogador de futebol de sua época no Brasil um dia deixou a bola de lado para ir à guerra. Liderou um batalhão com quase 3.000 outros atletas e foi promovido a segundo tenente. Arthur Friedenreich tinha 40 anos de idade, e 20 de futebol, quando decidiu apoiar a Revolução Constitucionalista de 1932, cujo início completará 80 anos na segunda-feira.
Fried, como era conhecido, foi a primeira grande estrela do futebol brasileiro, multicampeão pelo Paulistano. E liderou um movimento dentro da Revolução paulista: o Batalhão Esportivo.
Milhares de atletas, não só os jogadores de futebol, uniram-se à causa paulista. Alguns, para isso, abriram mão da participação na Olimpíada de Los Angeles, que aconteceria no mesmo ano.
Fabio Braga/Folhapress | ||
Objetos e uniforme usados por Arthur Frienderich na Revolução de 1932 |
Friedenreich foi até uma rádio e fez um apelo aos colegas esportistas para que se unissem à causa. Mais: doou suas medalhas e troféus para ajudar a financiar a luta armada contra Getúlio Vargas.
"Os clubes se envolveram na guerra e liberaram seus atletas. O Campeonato Paulista foi interrompido. A adesão de Friedenreich deu ânimo para a causa", declarou o historiador Eric Lucian Apolinário, que há cinco anos pesquisa o assunto.
Em 19 de julho de 1932 a "Folha da Noite", uma das publicações que deram origem a esta Folha, contou como os times da capital se envolveram. Era no campo da Floresta, antigo estádio do São Paulo, que os exércitos se reuniam. O Corinthians colocou à disposição seu "Departamento de Educação Physica, todas as suas instalações, tanto a sua sede, como sua praça de esporte".
O Sirio disponibilizou sua sede para distribuir cartões da mobilização. E o Ipiranga ofereceu seu espaço para a Cruz Vermelha.
Fried e seu batalhão foram enviados a Eleutério, distrito de Itapira, divisa com Minas Gerais, para se juntarem a outros batalhões no combate. Embarcaram da Estação da Luz no dia 1º de agosto para a batalha. "O famoso Arthur Friedenreich passou garboso, ostentando seus galhões de sargento, tendo recebido uma enorme aclamação de seus prediletos", relata a edição da "Folha da Noite".
Resistiram durante 25 dias antes de sofrerem um bombardeio aéreo e deixarem o local, conta Apolinário. "Estima-se que havia 55 mil soldados do exército federal e outros 30 mil das policias estaduais, portanto, 85 mil. Do outro lado, 30 mil soldados constitucionalistas, dos quais 10 mil eram voluntários. Não tinham nenhuma experiência militar", conta o historiador Marco Antônio Villa, professor da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos) e autor de "1932: Imagens de uma Revolução".
A Revolução terminou no dia 4 de outubro e deixou um legado para o futebol. No ano seguinte, o Campeonato Paulista se profissionalizou. E os jogadores, que tinham uma imagem marginalizada até então, ganharam mais respeito perante a sociedade.
"Imiteis meu gesto, inscrevendo-vos na Mobilização Esportiva, a fim de que todos juntos defendamos a causa sagrada do Brasil. Tudo por São Paulo num Brasil unido!", declarou Fried em seu discurso às rádios paulistas.
Folhapress | ||
Arthur Friedenreich em foto de arquivo |
VITÓRIA POLÍTICA
Feriado mais importante de São Paulo, a Revolução de 1932 durou quase três meses até a rendição paulista e foi uma reação ao cenário político de Getúlio Vargas.
"O foco foi justamente a questão democrática, a convocação de uma constituinte. São Paulo teve uma derrota militar, mas uma vitória política", conta o historiador Marco Antonio Villa.
Pois no ano seguinte foram realizadas eleições para a Assembleia Nacional Constituinte --quando as mulheres votaram pela primeira vez. E, em 1934, começou o processo de uma nova Constituição no país.
Segundo Villa, estima-se que a revolução provocou entre 1.500 e 2.000 mortes.
"A memória da revolução ficou mais guardada no interior do que na Capital. O Obelisco do Ibirapuera está abandonado", disse. "Infelizmente é uma história desconhecida da maior parte dos brasileiros. O regime militar acabou apagando um pouco a data."
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