Toda a filosofia da maior surpresa do futebol europeu na atual temporada é baseada em uma questão: o que fazer quando o adversário tem a bola? A pergunta a coloca na contramão do estilo de jogo consagrado pela Espanha a partir de 2008: manter a posse a qualquer custo.
O RB Leipzig é um clube sem vergonha de ser anti-Guardiola, o técnico que se tornou a maior referência da escola da troca de passes constantes. Assim, chegou a liderar o Campeonato Alemão e agora está na segunda colocação, a três pontos do Bayern de Munique, atual tetracampeão..
"Não há qualquer preocupação com isso [ter a bola por muito tempo]. A regra número um é pressionar na marcação sempre. Intensidade. Há um momento em que a orientação é entregar a bola para o adversário e tentar recuperá-la no ataque", afirma à Folha o meia brasileiro Bernardo, 21, desde 2016 no clube.
A meta do time alemão é chegar ao gol em poucos segundos. De preferência, ao roubar a bola no ataque. Apesar de estar em 9º nas estatísticas de posse, com 49,2% por partida (o Bayern tem, em média, 64,9%), o Leipzig é a segunda equipe que mais chuta ao gol. São 13,6 finalizações a cada 90 minutos.
"Para nós, a posse de bola não passa de um fetiche. Nós não temos isso", explica Ralf Ragnick, diretor esportivo e o criador da filosofia que pode levar o Leipzig à Liga dos Campeões da Europa. Os três melhores do campeonato alemão se classificam.
Ragnick preza tanto pelo método de jogo que o compara a uma marca corporativa. Ele chegou a assumir o cargo de técnico quando a equipe estava na Série B, em 2015, para garantir que seria aplicada como deveria. Após o acesso garantido, voltou à diretoria.
"A preocupação com isso é real. Você tem de seguir o esquema que está determinado. É a marca registrada", completa Bernardo.
Para a imprensa, nenhum jogador ou dirigente do clube alemão critica a filosofia que foi batizada de "tiki-taka", expressão que Guardiola detesta. Mas cada vez que ouvem a importância de manter a bola, torcem o nariz.
"Quanto mais tempo você fica com a bola em uma jogada, mais diminui a sua chance de fazer o gol", completa Ragnick. "Jamais dizemos a ninguém: fique com a bola custe o que custar e dê um passe lateral. Dizemos: jogue na vertical, em direção ao gol. Posse de bola não é quantidade. É qualidade."
O RB Leipzig, único representante da antiga Alemanha Oriental na Primeira Divisão alemã, faz de tudo para encarar o futebol como uma ciência. Trabalha com a estatística de que se a equipe não consegue finalizar a jogada nos primeiros 15 segundos que está com a bola, não fará o gol. Um matemático contratado pelo clube determinou que o ideal é que todo esse processo (recuperá-la e terminar a jogada) leve entre 11 e 12 segundos. Nem sempre é possível, mas é com esse objetivo que a equipe trabalha.
O único jeito de atingir isso é com intensidade, marcação e velocidade.
"A exigência aqui é enorme. A pressão tem de acontecer o tempo todo", afirma Bernardo.
TETO SALARIAL
Pela boa campanha, o Leipzig virou a menina dos olhos de Dietrich Mateschitz, dono do Red Bull. A empresa vale cerca de US$ 15 bilhões no mercado (R$ 49 bilhões). Não apenas pelos resultados, mas por seguir fielmente a filosofia de trabalhar com jogadores jovens, que possam ser revendidos no futuro com lucro. A média de idade do elenco é de 24 anos.
Além da equipe alemã, o Red Bull tem equipes nos Estados Unidos, Áustria, Gana e Brasil. A filial brasileira vai disputar a Série A-1 do próximo Campeonato Paulista. A companhia também é dona de duas escuderias de Fórmula 1 (Red Bull Racing e Toro Rosso), entre outros investimentos no esporte.
O Leipzig foi fundado por Mateschitz em 2009, usando a vaga que era do Markranstadt, que estava na Quinta Divisão.
O Leipzig trabalha com limite orçamentário. Patrocinado pela marca de energéticos Red Bull, nenhum jogador pode receber mais de 250 mil euros por mês (R$ 850 mil), limite abaixo dos seus rivais no Alemão.
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