ZACH SCHONBRUN
DO "NEW YORK TIMES"

Quando desconhecidos abordam Robert Bobroczkyi, o que acontece com frequência, a primeira pergunta quase sempre é: "Qual é sua altura?" Ultimamente, ele vem respondendo com típico sarcasmo adolescente.

"Tenho 1,80 m", ele diz, chutando um número cerca de 50 cm mais baixo que o real.

O sarcasmo merece perdão. Ainda que sua voz se despeje lá do alto como rochedos em uma avalanche de montanha, que cada uma de suas mãos tenha o tamanho de um iPad, e que ele seja capaz de olhar de cima qualquer um dos jogadores atuais da NBA, Bobroczkyi tem só 17 anos, e mostra o humor debochado e as caretas de desprezo características de um aluno de segunda série de segundo grau –porque é isso que ele é.

Bobroczkyi gosta de filmes de terror, romances de ficção científica, música "old school" e do videogame NBA 2K. Dorme sempre que possível, e onde quer que seja. Aprendeu a tocar piano com ajuda de vídeos do YouTube.

Na aula de inglês, quando teve de fazer uma apresentação sobre o Rei Artur e os Cavaleiros da Távola Redonda, ele brincou dizendo que ter assistido aos filmes de Indiana Jones ajudou.

E em seguida ele entra em quadra, onde é capaz de bloquear arremessos de três pontos saltando do lado de lá da linha. Bobroczkyi não precisa estar nem perto da bola para intimidar os adversários. Ele já o faz quando se posiciona sob a cesta e segura o aro com as duas mãos sem nem precisar ficar na ponta dos pés.

Essa é a vida de um adolescente de 2,31 m de altura, que calça sapatos tamanho 50. Se ele fosse contratado amanhã por um time da NBA, se uniria ao seu compatriota romeno Gheorghe Muresan e a Manute Bol como os jogadores mais altos na história do basquete profissional dos Estados Unidos –os três com 2,31 m. Mas diferentemente do corpulento Muresan e de Bol, cuja especialidade era bloquear arremessos, Bobroczkyi está tomando por modelo de seu jogo, que ainda não está bem desenvolvido, o ala Kristaps Porzingis, do New York Knicks, que, com 2,21 m, redefiniu a maneira pela qual jogadores desse porte lidam com a agilidade e fluidez do basquete atual.

Bobroczkyi também está aprendendo que a qualidade que nenhum treinador pode ensinar, a altura, não lhe garantirá um futuro no basquete profissional. Ainda menino, ele sofria de escoliose, o que lhe causou problemas na base da coluna, e, embora já tenha parado de crescer, ainda sofre de um desalinhamento de alguns centímetros na região da bacia. E há a questão do peso.

Comer o bastante para acionar sua envergadura de 2,40 metros, e para ganhar a musculatura necessária a uma carreira no basquete, é um sacrifício diário. Esse é um dos motivos que o levou a trocar a Europa pelo Spire Institute, um complexo de 69 mil metros quadrados em um terreno de 68 hectares, em meio à região vinícola do Estado do Ohio. Além da quadra de basquete do instituto, cujo piso veio da Quicken Loans Arena (onde o Cleveland Cavaliers joga), e do refeitório com cardápio saudável, a instituição também fica perto da Cleveland Clinic, que encarregou um nutricionista de cuidar da dieta de Bobroczkyi.

O objetivo é conseguir que seu peso, hoje de 88,5 quilos, aumente meio quilo por mês. Para isso, ele deverá consumir 4,5 mil calorias diárias. Bobroczkyi come devagar, e às vezes desconfortavelmente.

Na escola em que ele estuda, a vizinha Grand River Academy, as cadeiras plásticas do refeitório têm tamanho normal, o que significa que ele precisa dobrar as pernas por sob o assento, com os tornozelos encostados no chão, para se acomodar. Esta semana, ele teve de beber a sopa miso diretamente da terrina; levá-la da mesa aos lábios em uma colher seria uma jornada complicada e trêmula para uma pessoa da atura de Bobroczkyi.

SEMPRE GRANDE

Bobroczkyi conta que o dia em que ele conheceu Kristaps Porzingis, em uma visita a uma academia de basquete em Sevilha, foi a primeira vez que encontrou alguém de sua altura –fora seu pai. Porzingis tinha 2,16 m de altura, então. Bobroczkyi tinha 14 anos.

Ele sempre foi alto, mesmo quando criança. Aos nove anos, já tinha mais de 1,83 metro. Aos 12, conseguia fazer enterradas no basquete. O pai dele, Zsigmond, tem 2,16 m, e sua mãe, Brunhilde, antiga jogadora de vôlei, tem 1,86 m. Mesmo assim, o tamanho do menino preocupava o casal. Na Cleveland Clinic, os médicos confirmaram que ele não sofre de Síndrome de Marfan, uma doença genética dos tecidos conectivos que pode resultar em problemas cardíacos, que em alguns casos se provam fatais. Outros testes realizados ao longo dos anos, não revelaram a existência de problemas de saúde potencialmente preocupantes.

"Realizamos todo tipo de teste, ao longo dos anos, para garantir que tudo estivesse bem", escreveu o pai de Bobroczkyi em um e-mail. "Nós os realizamos em toda parte, a cada ano, o que inclui Roma, Sevilha, Washington, Budapeste. Tudo sempre estava bem".

Na cidade natal de Bobroczkyi, Arad, no oeste da Romênia, ele é mais conhecido por causa de seu pai, que jogou basquete profissional pelo Elba Timisoara e pelo West Petrom Arad, dois clubes romenos, e chegou a ser companheiro de Muresan na seleção do país, formando o que talvez tenha sido a dupla de cabeção mais alta da história do basquete até aquele momento. Mas o menino começou a conquistar atenção quando, ainda no ginásio, ultrapassou a altura do pai.

Ele se transferiu para a Itália para jogar por um time amador, o A. S. Stella Azzurra, mas abandonou o basquete por um ano para trabalhar sua musculatura, já que vinha encontrando problemas de sustentação em seus longos membros. Mais ou menos naquela época, Bob Bossman, diretor do programa de basquete da Spire, viu um vídeo no YouTube que mostrava Bobroczkyi fazendo arremessos de três pontos e dando passes.

"Vi que ele tinha potencial", disse Bossman. "Não é sempre que surge a oportunidade de trabalhar com um garoto como aquele".

Bossman contatou Bobroczkyi via Facebook. Uma conversação começou. Bossman contou a ele sobre as instalações do instituto, sobre a oportunidade de jogar com alguns dos melhores recrutas do basquete norte-americano, de estudar em um pequeno colégio interno ali perto, e de treinar em um local usado na preparação das equipes olímpicas norte-americanas. Quando Bobroczkyi e a família visitaram o instituto, em 2016, ele nem voltou à Itália.

Inicialmente, ficou alojado na Grand River, uma academia preparatória fundada 187 anos atrás, que tem 80 alunos. Os dirigentes da escola colocaram uma cama de 2,40 metros em seu alojamento, e carteiras especiais em suas salas de aula. Mais tarde, Bobroczkyi se mudou para uma casa, que divide com colegas do Spire. Sua cama especial não passava pela porta, e por isso ele dorme em uma cama normal, mas estende o comprimento do móvel usando duas malas como suporte para uma almofada, na qual apoia os pés.

"Você precisa se acostumar", ele diz sobre sua altura, uma avaliação modesta se considerarmos o tamanho dos desafios que enfrenta por causa dela. As portas são sempre baixas demais. Calças, só por encomenda. E o tamanho de suas camisas é XXXXXL.

O time dele certa vez voou para Hartford para uma partida, mas a comissão técnica se esqueceu de reservar lugar para Bobroczkyi na fileira da porta de emergência.

"Nunca mais viajo de avião, treinador", ele disse a Bossman ao pousar. Na viagem de ônibus de volta ao Ohio, ele se acomodou na última fileira, com as pernas estendidas pelo corredor.

Crédito: Jayne Kamin-Oncea Jan 21, 2018; Los Angeles, CA, USA; New York Knicks forward Kristaps Porzingis (6) defends Los Angeles Lakers guard Jordan Clarkson (6) in the second half at Staples Center. Mandatory Credit: Jayne Kamin-Oncea-USA TODAY Sports ORG XMIT: USATSI-362903
O jogador de basquete Kristaps Porzingis (à esq.), em ação pelo New York Knicks

DESENVOLVENDO O TALENTO

"Sim, Rob, trinta! É esse o peso!"

A voz de Brandon Strausser, preparador físico do instituto Spire, ecoava pelo cavernoso centro de treinamento. Bobroczkyi estava na bancada, erguendo halteres de 13,5 quilos, pronto para sua primeira série de 10 repetições.

Strausser e John Wallace, o diretor do centro de condicionamento, prepararam um plano de exercícios para Bobroczkyi diferente de qualquer coisa que já tenham tentado. É bem possível que ninguém antes tenha tentado algo parecido. Afinal, que outro corpo se compara ao de Bobroczkyi?

Porzingis tinha 2,10 m aos 17 anos. Muresan só chegou à sua estatura máxima aos 20 anos. Bobroczkyi é mais alto até que Shawn Bradley, pivô que jogou pela NBA e tinha 2,26 m de altura já no segundo grau.

As experiências de Bobroczkyi, portanto, em sua difícil e confusa escalada para a maturidade, são verdadeiramente singulares. Ele não pode se encolher para passar despercebido nos corredores de sua escola, mesmo que talvez quisesse. Na aula de álgebra, o professor Matthew Pavlovic pediu que os alunos formassem duplas para um trabalho –o que é complicado para Bobroczky, cuja carteira, mais alta, fica um tanto distanciada das demais. Para se aproximar do seu parceiro no trabalho, ele teve de arrastar a carteira pela sala, com um rangido alto.

O pai de Bobroczkyi costumava lhe dizer que ter uma altura como a dele pode ser tanto uma bênção quanto uma maldição, e que cabia a ele escolher. Mas, perguntado se gostaria de ser ainda mais alto, ele meneou a cabeça: "Para mim chega. Já cresci o bastante".

Quando chegou a Ohio, Strausser diz que Bobroczkyi tinha "problemas" de flexibilidade. A porção inferior de sua coluna doía. Andar às vezes era complicado. A movimentação dele em quadra era boa, mas apenas por períodos curtos, "Ele não é lento", disse Bossman. "O problema é quantas vezes ele consegue ir ao ataque e retornar para a defesa dentro de um jogo ou dentro de blocos de alguns minutos".

Assim, enquanto seus colegas de time fazem flexões e registram seus resultados nos exercícios com peso em um quadro negro acima da porta, Bobroczkyi fica deitado na grama, com os braços estendidos, e gira seu torso, seguindo uma meticulosa rotina de 40 minutos de alongamento. O programa de condicionamento com pesos que ele segue tem por objetivo principal construir resistência, com faixas elásticas e cordas, mas mesmo assim Strausser ficou feliz de vê-lo trabalhando com os pesos de 13,5 quilos,

O preparador físico tinha em suas mãos uma prancheta com quase 50 exercícios criados especialmente para Bobroczkyi.

"Quantas repetições pudermos conseguir de cada movimento, em cada categoria de movimentos –tudo isso está lá", disse Strausser. "Porque ele precisa".

O pessoal do Spire ficou muito satisfeito quanto, em um treino algum tempo atrás, Bobroczkyi fez uma enterrada. Isso não parece ser motivo para festa, com um jogador da altura dele. Mas queria dizer que o jovem estava ganhando confiança.

"Eu gosto de enterrar, mas sei que não tenho força suficiente para abrir caminho pelo garrafão quando vou fazê-lo", ele disse. "Isso é uma parte importante da coisa".

Em um treino recente, ele estava caminhando pela lateral da quadra, girando uma bola de basquete sobre o indicador e praticando dribles entre suas pernas do tamanho de postes. Bobroczkyi quase sempre fica relegado a assistir, enquanto seus colegas correm pela quadra treinando contra-ataques e triangulações.

Ele tinha jogado 12 minutos no final de semana, explicou o treinador Dave Briski, e precisava de tempo para se recuperar. "Nossa esperança é de que no ano que vem ele possa jogar muito mais minutos", disse Briski. "Se conseguirmos 10 a 15 minutos por jogo no ano que vem, acho que será bastante para ele".

Antes que Bobroczkyi possa contemplar a possibilidade de se tornar o novo Porzingis, ou mesmo de conquistar uma bolsa para uma universidade norte-americana com programa forte de basquete, ele precisa de tempo para se ajustar à velocidade do jogo nos Estados Unidos. Bossman e outros afirmam que os minutos dele em quadra são produtivos, mas limitados.

"Ele é muito habilidoso para um cara daquela altura", disse Julian Dancy, um colega de time. "Nunca vi alguém arremessar bolas de três como ele, especialmente porque ele treina na linha universitária dos três pontos".

Depois do jantar, numa noite desta semana –frango à milanesa, tetrazzini com recheio de peru, feijões verdes e duas porções de pudim de arroz–, Bobroczkyi embarcou no micro-ônibus para a viagem até a casa que divide com colegas, perto do instituto. Ao chegar, sentou-se na cama, abaixo de pôsteres de Dirk Nowitzki e Porzingis. O rosto dele se iluminou ao ouvir a notícia de que Porzingis havia sido escolhido para o All-Star Game da NBA.

Bobroczkyi admitiu que quando conversou com seu ídolo pela primeira vez era tímido demais para falar muito. Mas gostaria de uma nova oportunidade.

O que ele perguntaria? Bobroczkyi parou para refletir.

"Eu perguntaria se ele tem algum conselho para mim", disse, depois de uma longa pausa. "Sobre qualquer coisa –vida, basquete, tudo mais".

Depois de mais uma pausa, ele disse "sim", com um aceno afirmativo, e voltou a guardar as roupas que tinham chegado da lavanderia.

Tradução de PAULO MIGLIACCI.

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