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Minha História

A minha Copa: Eu estava atrás do gol, relembra Jô Soares

William Mur/Editoria de Arte/Folhapress
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Um jogo inesquecível de uma das Copas do Mundo, além, é claro, de todos os que eu vi do Brasil, foi o confronto entre Hungria e Uruguai na Copa de 1954, na Suíça. Aconteceu depois que o Brasil foi eliminado pela lendária seleção húngara, num jogo que mais parecia uma batalha campal.

A nossa paixão fazia com que alguns brasileiros na arquibancada chamassem o juiz inglês, o competente mister Ellis, de "comunista", como se fosse, inclusive, a pior das ofensas. Russo, inglês, húngaro, tudo na mesma sacola radical.

Nem deu para prestar atenção no estupendo gol do Julinho e do frangaço do Castilho, numa bola que passou sobre a sua cabeça e entre as suas mãos. As duas seleções foram violentas, mas a nossa batia melhor.

Pra dar uma ideia da falta de informação dos nossos cartolas, o empate nos classificava juntamente com a Iugoslávia. E ninguém sabia. O nosso time se esfalfava, enquanto os iugoslavos pediam calma. "Que calma o quê, comunista!" O que tinha de comunista na Suíça, naquele momento, era de meter medo no Stalin.

No final do jogo, fui com meu colega estudante Ricardo Ashcar, mais tarde piloto de corridas, cumprimentar os jogadores no ônibus. Todos estavam tristíssimos. O ponta Rodrigues chorava como criança. Fomos enxotados quando insistimos que o Brasil tinha se classificado.

Apesar da nossa derrota na Copa de 50, eu e meu amigo Ricardo achamos que era quase uma obrigação deixar de lado a mágoa do Maracanã e torcer pelo Uruguai, nosso vizinho, e representante do futebol sul-americano. Alguns colegas iranianos e dois gêmeos argentinos se juntaram ao coro.

Qualquer zorra sul-americana dos alunos em Lausanne tinha iranianos e turcos agregados. Todos gritando em uníssono: "Sulamérica! Sulamérica! Sulamérica!" Uruguaios, só turistas e doce de leite. Contradições da paixão pelo futebol.

A seleção do Uruguai era quase a mesma da Copa anterior, quatro anos mais velha, mas com a mesma categoria.

Não contava mais com Obdulio Varela, mas possuía craques como Andrade, um belo jogador negro de tremenda habilidade. Desculpe se não digo afrodescendente, mas não sei se a família dele veio da África ou do Brasil.

Havia uma esperança na vitória dos platinos, afinal de contas, a Celeste Olímpica havia derrotado o Brasil em pleno Maracanã (estádio gigantesco que chegou a abrigar 200 mil pessoas, que existia antigamente no Rio de Janeiro).

"La Celeste" era temida até mesmo pelos húngaros, era incontestavelmente a seleção bicampeã do mundo.

Que eu me lembre, choveu muito durante a Copa. Em vários jogos. Na final, só faltou granizo. No jogo entre Hungria e Uruguai, também teve muita água. Lembro-me bem como nosso grupo ficou em pé, na lama, atrás do gol uruguaio no primeiro tempo. Ou foi no segundo? Não posso jurar.

Sei que era atrás do gol e que chovia muito. Difícil achar um jogo pra torcer tanto. Emocionante. Primeiro, achamos que os húngaros iam liquidar os adversários com a eficiência de sempre. Os jogadores, Puskás e companhia, eram do Exército. Poderiam muito bem serem chamados pelos locutores da época de tropa magiar.

Começa o jogo: um a zero. Dois a zero. Os pintos molhados atrás do gol pensavam: "Pronto. Acabou. Que papel ridículo viemos fazer aqui?" De repente, dois a um. Mais um esforço uruguaio, dois a dois. Empate! O jogo vai pra prorrogação. Ficamos animadíssimos. Claro que gritamos: "Comigo é assim! Eles ganharam da gente, mas não vão ganhar de um time que ganhou da gente!" Ganharam. De 4 a 2. Voltamos pra casa com a roupa encharcada e sem a alma lavada.

O texto de Jô Soares, apresentador da TV Globo e escritor, faz parte da série "A Minha Copa", publicada aos domingos. Leia os textos anteriores em www.folha.com.br/folhanacopa

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