Moradores de ilha em SP desligam a geladeira para ver jogos da Copa; veja
Numa comunidade isolada do litoral norte de São Paulo, parte dos moradores vive uma situação inusitada na Copa: precisam desligar as geladeiras para que a energia disponível mantenha a TV ligada durante todo o jogo.
Isso ocorre na ilha Montão do Trigo, em São Sebastião.
O vilarejo com 17 casas, todas de madeira, foi beneficiado recentemente com placas solares. Mas em algumas moradias, na parte mais baixa da ilha, a energia é carregada parcialmente, já que as placas às vezes ficam cobertas pela vegetação.
É o caso da residência de Aparecida Souza, 37, natural da ilha e que acompanha pela primeira vez os jogos do Brasil numa Copa do Mundo.
"Compramos uma TV nova e me animei para ver os jogos. Não gosto muito de futebol, mas estou na torcida para que a gente ganhe."
Aparecida, porém, é sempre obrigada a optar entre a geladeira e a televisão.
"Agora que vamos assistir ao jogo, a geladeira está desligada. Senão acaba toda a energia e ficamos no escuro."
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Na comunidade, a geladeira desligada não representa um grande drama, para quem já imagina a cerveja fora do gelo durante os jogos.
A explicação é simples: dos 58 moradores locais, a maioria esmagadora é de evangélicos, que não consomem bebida alcoólica e frequentam a única igreja do vilarejo.
O acesso à TV já ocorre há mais tempo, porém, num processo mais complicado.
"Antes a gente conseguia ver um jogo ou outro com a TV que era a bateria. Tínhamos que deixar a noite toda carregando e só dava para assistir um jogo", diz o pescador Paulo Oliveira, 51.
A ilha fica a 11 km de Barra do Una, bairro da costa sul de São Sebastião. De barco a motor, são 20 minutos até lá. De canoa, como os moradores faziam anos atrás, o percurso leva uma hora e meia.
Na comunidade, todos os moradores vivem quase que exclusivamente da pesca, sendo o peixe o principal item da alimentação. Alguns cultivam legumes e verduras.
A Folha visitou a ilha na sexta e acompanhou com os moradores a vitória do Brasil diante da Colômbia.
Na moradia do casal Nelson Olegário de Oliveira, 77, e Maria Conceição, 77, a geladeira estava desligada.
"Não dá pra deixar tudo ligado. Tem que ser assim", disse a dona da casa.
Com as moradias estão distantes umas das outras, praticamente não se ouve manifestações dos vizinhos durante a partida. Até na hora dos gols do Brasil a comemoração é contida na primeira Copa ao vivo da comunidade.
Uma exceção está na casa de Almerindo de Oliveira, 50.
Ele reuniu a família e recebeu ainda outros sobrinhos para o jogo. A TV de 14 polegadas foi suficiente para fazer a festa dos torcedores.
Fabiane, 15, Carolaine, 17, e Bianca, 16, por exemplo, se prepararam com roupas em verde e amarelo, rostos pintados e até vuvuzelas.
Elas contam que receberam os acessórios no jogo anterior, quando uma ONG esteve na ilha e levou os jovens para torcer juntos com outros da mesma faixa etária numa embarcação. "Foi demais, gostei muito de torcer lá e agora vamos comemorar aqui também", disse Bianca.
No final do jogo, com a vitória do Brasil, a família comemorou e fez barulho, o único que se ouviu na ilha.
Pouco tempo depois a festa acabou e cada um voltou para casa. Todos, aliás, com lanternas em mãos para atravessar o breu das trilhas.
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