O céu é o limite para o Brasil. Limite mesmo, porque quem cruzou os ares pela primeira vez dentro de um avião não foi Santos Dumont, em 1906, e sim os americanos irmãos Wright, três anos antes. Pelo menos é a tese que a mídia americana vendeu para os espectadores locais após uma réplica do 14 Bis sobrevoar o Maracanã nesta sexta-feira (5), na abertura da Olimpíada do Rio.
"Se a gente perguntar quem inventou o avião, o que você vai dizer?", perguntou um apresentador da NBC, rede que detém os direitos de transmissão dos Jogos para o público dos Estados Unidos.
"Os Wright!", colegas respondem em uníssono.
| Lucas Lima/UOL/Folhapress | ||
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| 14 Bis levanta voo em pleno Maracanã para homenagear Santos Dumont e mostrar as belezas do Rio, na abertura da Olimpíada |
"Ok, temos um problema, porque os brasileiros não acreditam nisso."
O repórter Victor Mather, do "New York Times", também comentou a queda de braço histórica.
"Os fãs dos irmãos Wright podem não gostar, mas há aqueles que questionam sua reivindicação de terem sido os primeiros a voar. Não há disputa em dizer que Santos Dumont foi um pioneiro no balão e voou o primeiro avião na Europa, três anos depois de Kitty Hawk [cidade americana onde os Wright teriam posto sua aeronave no ar]."
A paternidade da aviação ainda é incerta. Para partidários de Dumont, a façanha dos irmãos americanos não conta, porque a máquina deles teria sido impulsionada por uma catapulta (dado questionável).
A polêmica centenária também alimentou o UFC virtual.
No Twitter, a americana Shaelyn Amaio defendeu os conterrâneos: "Irmãos Wright: 1903. Aberto Santos-Dumont: 1906. Just saying [apenas dizendo]".
Já o usuário DerekOrick, brasileiro, brincou: "Quem são os irmãos Wright na fila do pão perto de Santos Dumont?".
TRANSMISSÃO AMERICANA
Após pagar US$ 12 bilhões pelo direito de transmitir os Jogos até 2032 nos Estados Unidos, a NBC foi fiel à fama carioca de marcar um horário e chegar depois como se nada tivesse acontecido.
Sem explicitar que não acontecia em tempo real, o canal atrasou por uma hora a exibição da cerimônia de abertura. Só às 20h (zona leste americana; 21h no Brasil), a audiência foi introduzida ao Maracanã.
O "delay" não passou batido pela concorrência. "É importante dar o contexto do espetáculo para que não seja só um flash de cor", disse o presidente da NBC Sports, Mark Lazarus.
(Mas quando o presidente interino, Michel Temer, apareceu na tela, o "contexto" foi resumido assim: "Quando se trata de política, o Brasil é complicado".)
Boa parte da mídia que não se chamava NBC ofereceu macetes para ver o show por outros meios, como streaming.
Enquanto Gisele Bundchen caminhava pelo Maracanã, apresentadores da NBC faziam um "esquenta", discutindo qual esporte o presidente Barack Obama disputaria, fosse ele um atleta olímpico (ficaram entre golf e basquete).
O assunto não veio à tona numa entrevista que o próprio Obama deu ao canal, na qual falou que a Olimpíada "não acaba com guerra ou pobreza", mas cria um sentimento de empatia global.
A abertura foi picotada, e ficaram de fora trechos como o estádio inteiro cantando "País Tropical". Quando as delegações começaram a entrar, a NBC ressaltou que a ordem alfabética obedecia ao português, e não ao inglês.
A rede até tentou convencer o Comitê Olímpico Internacional a quebrar o protocolo, que privilegia o idioma local, e usar "USA", e não "EUA" –para a audiência não cair depois dos "locais" passarem.
Durante a cerimônia, outras crenças americanas sobre o Brasil também foram pelo ralo.
Sarah Lyall, enviada ao Rio pelo "New York Times", destacou a "sorte" de ter chegado inteira ao estádio. "As notícias que vinham do Rio davam a impressão de que, no minuto em que deixássemos o aeroporto, seríamos atacados por assaltantes, traficantes, sequestradores, mosquitos e pedaços de esgoto. Até agora, nada aconteceu, embora eu tenha me perdido no metrô."