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Tênis de mesa olímpico enfrenta bolas 'muito ruins'

As relíquias estavam ordenadas em configuração de esfinge, como se em um sepulcro da antiguidade. Massimo Constantini, o treinador da equipe olímpica de tênis de mesa dos Estados Unidos, definiu a formação como "uma espécie de homenagem aos caídos".

Elas apareceram no primeiro dia da olimpíada, em um canto remoto do pavilhão de tênis de mesa: 18 bolas brancas, todas esmagadas ou rachadas, arranjadas solenemente no centro de um quarteto de garrafas de água. Era um símbolo perfeito para a frustração que fervilhou esta semana nas mesas dos jogos olímpicos do Rio, por conta das bolas de tênis de mesa que estão irritando muito os jogadores.

Elas não quicam na direção que deveriam, dizem os jogadores. Seus percursos de voo são imprevisíveis. E quebram com muita frequência.

"Acho que essa bola é muito ruim", disse Li Ping, do Qatar, depois de perder uma partida. O jogador que o derrotou, Dmitri Ovtcharov, da Alemanha, se queixou de que a bola oficial do torneio "torna quase impossível competir".

As bolas de tênis de mesa são coisinhas cheias de caprichos. Variações infinitesimais de tamanho e desvios imperceptíveis de construção podem ter ramificações consideráveis em seu giro, voo e quique. Os jogadores casuais - nas garagens de casas suburbanas ou alojamentos universitários - tendem a não perceber esses detalhes. Mas os profissionais se preocupam obsessivamente com eles.

Juan Mabromata/AFP
As brasileiras Caroline Kumahara (esq.) e Gui Lin enfrentam dupla chinesa na Rio-2016
As brasileiras Caroline Kumahara (esq.) e Gui Lin enfrentam dupla chinesa na Rio-2016

As bolas da olimpíada, portanto, não são aquelas que você encontra recobertas de teias de aranha embaixo de um sofá no porão. Elas não são nem mesmo iguais às bolas usadas na olimpíada passada.

Dois anos atrás, a federação internacional do tênis de mesa mudou o material oficial da bola, de celuloide para um tipo diferente de plástico. A federação também permitiu que a bola fosse um pouco maior. Alguns jogadores continuam a enfrentar dificuldades para se ajustar - e aparentemente o mesmo se aplica a alguns fabricantes.

Muitos jogadores criticaram especificamente as deficiências de qualidade das bolas da D. H. S., uma marca chinesa de equipamento esportivo que se tornou a fornecedora oficial da federação internacional de tênis de mesa na Olimpíada de Londres, em 2012.

"Creio que muitos jogadores estejam se queixando porque existem bolas melhores", disse Timo Boll, da Alemanha, que está disputando sua quarta olimpíada. "Existem bolas melhores no mercado. Não as usamos em torneios internacionais. É uma pena".

As velhas bolas de celuloide tinham diâmetro de entre 39,5 e 40,5 milímetros. As novas podem ter de 40 a 40,6 milímetros. De acordo com jogadores, uma bola maior produz menos velocidade e menos efeito. Depois da mudança, os jogadores tiveram de recalibrar anos de treinamento e de memória muscular. Os que dependem mais das jogadas de efeito sofrem mais desvantagem do que os jogadores que dependem da força.

As bolas foram mudadas pouco depois da Olimpíada de 2000, aumentando de tamanho ante os 38 milímetros anteriores. Mudanças anteriores de equipamento e rumores de que novas alterações estariam por vir, como uma rede mais alta, irritaram os jogadores.

"Isso não é bom, não é profissional", disse Panagiotis Gionis, sobre as mudanças. "Esse é nosso trabalho. As mudanças nos afetam. Alguns jogadores sofrem demais com isso".

Gionis criticou a bola da D. H. S. mas está igualmente preocupado com a falta de compatibilidade, de uma competição a outra. Marcas diferentes podem ser usadas pelas federações locais, torneios regionais e competições internacionais, e nos últimos anos não existem marcas de bolas que pareçam semelhantes aos jogadores.

"É como se você tivesse quer dirigir um carro que não é o seu", disse Constantini, o treinador dos Estados Unidos, que estava mais preocupado com essa incompatibilidade do que com a qualidade de qualquer marca específica. "Os freios podem ser diferentes, a aceleração, e é preciso algum tempo para se ajustar".

Que esporte é esse? - Olimpíada - Folha de S.Paulo

Os jogadores tiveram de começar seu processo de ajuste para a olimpíada - a competição mais prestigiosa de seu esporte - semanas ou meses antes do início dos jogos, para se acostumarem com a bola. Mas isso foi difícil de fazer nos últimos meses por conta do que eles definem como má qualidade da bola da D. H. S.

"Praticamos com a bola por meses, antes da olimpíada, para nos acostumarmos a ela, mas não há como se acostumar", disse Ovtcharov, que também disse que sentia que a bola se amaciava ao longo do jogo. (Certas competições substituem as bolas em uso durante uma partida, mas isso não acontece na olimpíada.)

Stefan Fergel, da Áustria, disse que "essa bola não salta tão bem. Muitas vezes, cai rápido demais. Quando você a atinge com a beira da raquete, ela pode quebrar. A qualidade não é boa".

Em entrevista na terça-feira, Lou Shi-He, diretor geral da D. H. S. disse por meio de um intérprete que a companhia estava "bastante satisfeita" com sua transição para a nova bola. Mas ele expressou simpatia para com os atletas, ao ser informado das queixas, e disse que a companhia estava levando adiante suas pesquisas para produzir uma bola melhor.

"De um lado, eles nos dão informações", disse Lou, "e do outro melhoramos as bolas gradualmente".

Thomas Weikert, presidente da federação que comanda o esporte, reconheceu em entrevista que as bolas usadas nos dois últimos anos não eram tão boas quanto no passado. Mas ele disse que isso era um sintoma de questões setoriais, e não de problemas em uma dada empresa.

"Elas melhoraram bastante", disse Weikert sobre as bolas. "Digamos que elas são aceitáveis, mas não são 100%".

Lou e Weikert apontaram que certa dose de reclamação era esperada. "Se você usa outra bola, outros jogadores se queixarão", disse Weikert.
É certo que alguns jogadores parecem completamente despreocupados diante das queixas.

Informado sobre a multidão de colegas que expressaram frustração quanto à bola, o britânico Paul Drinkhall sorriu. "Eles perderam?", disse o atleta.
Boll, o jogador alemão, foi eliminado na quarta rodada do torneio de simples. O torneio por equipes começa sábado.

"Estou certo de que desejam produzir uma bola melhor, porque estão recebendo muitas críticas", disse Boll. "Teria sido melhor que isso acontecesse antes dos jogos olímpicos".

Tradução de PAULO MIGLIACCI

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