Logo na entrada de acesso ao portão A do Maracanã, a voz de Gilberto Gil que ecoava do alto-falante dava boas-vindas aos torcedores: "Andar com fé eu vou, que a fé não costuma 'faiá'". Embalado pela canção, o público ia aos poucos tomando assento e tingindo de amarelo todo o estádio.
Na fileira "I", do bloco 501, o estudante Arthur Mendonça de Pinho, 8, vestia camiseta branca da Olimpíada e segurava um daqueles infláveis no formato de mão, pintado com os desenhos das mascotes da Rio-2016, Tom e Vinicius.
A ansiedade era tamanha que, no calor da torcida, mal permitia a ele brincar com o objeto. Era a primeira vez que o garoto, de Rio das Ostras (RJ), assistia a um jogo da seleção brasileira.
"Tenho fé que o placar será de ao menos dois a zero", disse ele, tímido.
Ao ser questionado para que time torcia, Arthur deu um sorriso amarelo tão quanto o das camisetas que o circundavam. Durante aquele dedinho de prosa, o menino encontrava-se entre a "cruz e a espada": o pai é vascaíno, a mãe, flamenguista, e ele, anda incrédulo, não decidiu definitivamente para qual time irá torcer. Para ela, diz que é "Flamengo", para ele, "Vasco".
No alto de seu 1,32 metros de altura, uma coisa Arthur não tem mais dúvida: "somos todos Gabriel Jesus".
Do canto extremo da direita, o guatemalteco Jorge Cardona, 49, alimentava esperança de ver Honduras na final.
"Tenho muitos amigos por lá. O país anda cabisbaixo, triste, violento, uma vitória, sobretudo contra o Brasil, iria aumentar a esperança, a autoestima dos hondurenhos", defendia.
Discurso semelhante pregava o instrutor de mergulho Oswaldo de Jesus, 40, de Belize, porém, com uma ressalva: "O Brasil não tem se saído muito bem no futebol, mas a força e a fé da torcida podem levar o time a ser campeão", disse, tendo a sua voz abafada pelo grito da multidão.
"Glória, glória, aleluuuia, glória, glória, aleluuuia, glória, glória, aleluuuia, é Gabriel Jesus." Segundo gol do time brasileiro. Primeiro do camisa 11.
Pertinho dali, na fileira "J", cadeira 12, o colombiano Giovanny Alberto Navarro Sanchez, 41, estava perplexo perante a algazarra. "Por Deus, o que é isso?", questionou.
Padre da diocese de Girardot, município localizado na província Alto Magdalena, a cerca de duas horas da capital, Bogotá, Sanchez, até então, não sabia que o Jesus aclamado por todo o Maracanã se tratava do jogador brasileiro. "A fé do povo é algo curioso", brincou o padre, depois de tomar ciência da história do nosso artilheiro.
Quando Gabriel Jesus fez o segundo dele na partida, a torcida passou a emendar a saudação, acompanhada por um outro grito, este com gostinho de revanche: "Ohhh Alemanha pode esperar, a sua hora vai chegar".
No fim da goleada, de 6 a 0, que garantiu vaga na final do torneio de futebol, Arthur já agitava sem parar seu inflável de mascotes, ao sabor do cântico do estádio. O garotinho talvez seja novo demais para conhecer uma outra canção, que também tocou nesta quarta (17) festiva no Maracanã, aquela do Skank cuja a letra diz o seguinte: "Que coisa linda é uma partida de futebol".
Cao Can/Xinhua | ||
Gabriel Jesus na vitória contra Honduras |