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Depois de arriscar a vida pela filha, gaúcha se torna estrela da esgrima

Numa manhã de 2002, em Santo Antônio da Patrulha (RS), Mônica Santos, então com 18 anos, acordou e quis se levantar da cama. Tentou esticar as pernas, mas elas não responderam.

Desde que engravidara, dois meses antes, vinha sentindo uma fraqueza progressiva. "Não podia dobrar o joelho que caía."

Foi naquele momento que percebeu que o que ela achava ser uma fraqueza na verdade era uma paralisia.

"Eu nasci com uma malformação nas veias da medula, mas não sabia disso. Quando engravidei, parei de menstruar, uma veia dessas inchou e apertou as outras. Isso comprometeu meus movimentos", conta Mônica.

"Isso teria acontecido quando chegasse à menopausa, se eu não tivesse engravidado antes", explica ela, sentada em sua cadeira de rodas na área comum da Vila Paraolímpica, dias antes de sua primeira competição, que ocorrerá na quarta-feira (14).

Marco Antonio Teixeira/MPIX/CPB
02/09/2016 - Brasil, Rio de Janeiro, Tenda de treino anexo Arena Carioca 3 - Jogos Paraolimpicos Rio 2016 - Esgrima, treino - Monica da Silva Santos. Mônica teve uma gravidez de risco e ficou tetraplégica ao não optar pelo aborto da filha. Foto: Marco Antonio Teixeira/MPIX/CPB ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
A esgrimista Mônica Santos posa na Vila Paraolímpica

Atualmente a principal aposta do Brasil na esgrima paraolímpica feminina, e a primeira brasileira a ser campeã de um torneio internacional da modalidade, Mônica tem, na origem de sua deficiência, uma escolha difícil.

Sempre tivera uma saúde normal. A primeira vez na vida em que entrou em um hospital já foi de cadeira de rodas, para tentar descobrir o que a fizera perder os movimentos das pernas.

Depois de dois meses de internação, descobriu o angioma na medula.

Quando ela recebeu o diagnóstico, já era tarde para reverter a paralisia, mas, quanto mais tempo demorasse para retirar o angioma, maior seria o dano. Mônica teria de interromper a gravidez e ser operada o quanto antes, disseram os médicos do hospital público de Porto Alegre no que ela foi internada.

Se tirasse o bebê e fosse operada, teria 80% de chance de sobreviver. Se a cirurgia fosse feita apenas após o nascimento, ela poderia ficar tetraplégica, ou até morrer. Escolheu arriscar.

"Eu já achava que ia morrer na cirurgia. Queria pelo menos deixar uma parte de mim para os meus pais cuidarem. O natural não é os pais enterrarem os filhos, é os filhos enterrarem os pais."

A esgrimista é a segunda de quatro filhos de um casal de agricultores. Começou a namorar o pai de sua filha aos 15 anos. É católica e diz achar que o aborto deve ser evitado sempre que possível.

"Mas não foi por ser contra o aborto, nem por ser religiosa, que decidi ter minha filha, foi uma decisão pessoal", diz.

Deitada na cama do hospital, assinou um termo judicial se responsabilizando pelo que viesse a acontecer consigo. E o que aconteceu foi o melhor cenário possível: Paolla nasceu de cesárea sem nenhum problema de saúde.

A cirurgia para remover o angioma correu bem, e Mônica acabou perdendo apenas os movimento das pernas.

Quando Paolla fez 11 anos, a mãe decidiu contar a ela o que a colocara numa cadeira de rodas. "Eu dizia a ela: 'Não é que a mãe está na cadeira por causa de ti, é por causa de ti que a mãe consegue fazer as coisas'. Foi a minha filha que me reabilitou, que fez eu me tornar independente."

A esgrima surgiu anos depois, também de um desejo de independência. Enquanto Paolla era bebê, ela foi dona de casa. Depois, passou a ajudar na oficina mecânica em que trabalhava seu marido.

"Mas eu queria uma coisa que fosse só minha, aí fui atrás de esportes, de que eu sempre gostei". Chegou à esgrima por via do basquete.

Num treino, conheceu a outra aposta de medalhas do Brasil na esgrima, Jovane Guissone, que já treinava e a levou para tentar a modalidade de que ela, até então, nem sequer ouvira falar.

Mônica ganhou uma medalha de terceira colocada logo em seu primeiro campeonato. Competitiva, tomou gosto pela coisa.

Foi ouro no florete no Regional das Américas-2015, em Montréal, e ouro no florete e bronze na espada na edição de 2016, em São Paulo.

"A ambição foi crescendo: me tornar campeã brasileira, aí quem sabe entrar para a seleção, aí quem sabe tentar vaga na Paraolimpíada."

Cumpridos esses objetivos, hoje o que Mônica mais quer é ganhar uma medalha no florete, sua especialidade.

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