Ritmos portugueses perdem espaço


IVAN FINOTTI
da Reportagem Local


A música brasileira tem conseguido aumentar seu público em Portugal às custas dos próprios músicos portugueses.

Com a triplicação do mercado fonográfico no país nos últimos nove anos, todos passaram a vender mais, mas os portugueses tiveram sua porcentagem de participação reduzida no período.

A pesquisa anual preparada pela Associação Fonográfica Portuguesa (AFP) fornece a pista: em 1989, a música brasileira respondia por 9,9% dos discos mais vendidos no país -que ganharam prata, ouro ou platina.

Hoje, os brasileiros abocanham 17,5% desse mercado. Ou seja, nesses nove anos, a penetração da MPB em Portugal cresceu cerca de 75%.

Já os portugueses amargaram uma diminuição de cerca de 20% no mesmo período -sua participação passou de 31,8% do mercado para 25,2%.

Ao largo, fica a música produzida em outros países -predominantemente nos Estados Unidos- que praticamente manteve sua cota de dominação -57,3% em 89 para os 58,2% atuais.

"Nos últimos anos, a música brasileira tem correspondido entre 18% e 22% do faturamento em Portugal. Esse crescimento se deve, entre outras coisas, às novelas brasileiras e suas trilhas sonoras. E também aos shows. Não me surpreenderia se, em breve, os brasileiros passassem a vender mais que os portugueses", afirma o diretor-geral da AFP, Eduardo Simões.

A análise de Simões encontra respaldo em pesquisa realizada pelo Datafolha em Lisboa: 88% dos portugueses têm interesse grande ou médio pela música popular brasileira -e essa porcentagem sobe para 95% entre os de 16 a 24 anos.

"Com a entrada de Portugal na Comunidade Econômica Européia, muitas indústrias cresceram no país. A fonográfica foi apenas uma delas", afirma Simões, referindo-se ao crescimento do mercado nos últimos nove anos.

O curioso é que, considerados os discos mais vendidos, os artistas portugueses não tiveram suas vendas triplicadas na mesma proporção. E os brasileiros tiveram mais do que isso.
Basta ver que, em 1989, o Brasil emplacou apenas dois discos de platina entre os mais vendidos no país. Já no ano passado, os brasileiros assinaram 11 discos (veja quadro ao lado).

A platina, em Portugal, significa 40 mil cópias vendidas. No Brasil, que tem um mercado seis vezes maior, indica a venda de 100 mil.
Esses nove anos abrangidos pela pesquisa da AFP também revelam uma diferença básica entre os tipos de artistas brasileiros consumidos em Portugal.

Em 1989, os dois responsáveis pelas maiores vendas foram Roberto Carlos e Joanna. São artistas com décadas de carreira.
Por outro lado, em 1998, Fafá de Belém é a única dos cinco artistas que tem discos lançados em outra década que não essa.
Daniela Mercury, por exemplo, que varreu a península com sete discos de platina em apenas dois anos, teve seu primeiro álbum lançado no Brasil em 1991.

Por isso, não é nada estranho ver Daniela aparecer antes de Gal Costa, Chico Buarque e Maria Bethânia, no quesito "Qual a primeira pessoa famosa que lhe vem à cabeça quando se fala em Brasil?".

Entre os entrevistados de 16 a 24 anos, Daniela Mercury só perde para Ronaldinho. Foram 28% das citações para o jogador de futebol e 12% para a cantora baiana. Já Roberto Carlos e Chico Buarque, por exemplo, não alcançaram nem sequer 1% de lembranças nessa faixa etária.



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