Imagem e realidade

"O Grito do Ipiranga", obra de 1888 de Pedro Américo de Figueiredo Mello

O GRITO DO IPIRANGA


Pedro Américo de F. Mello (1888)
Uma pintura não é um registro preciso do que aconteceu, mas uma reconstrução simbólica do real. Pedro Américo mudou a cena para que ela mostrasse a importância do evento. Para ele, a Independência é o resultado da ação individual de um herói, e não uma conquista coletiva. Daí a diferença entre seu quadro e o de Moreaux, que mostra d. Pedro no meio do povo.

D. Pedro não montava um cavalo castanho-escuro, mas sim uma "besta baia gateada" _ou seja, uma mula amarelo-avermelhada (burros e mulas eram o meio de transporte habitual para subir a Serra do Mar). Também não vestia uma farda majestosa, mas uma simples "fardeta de polícia". Não havia um carreteiro no local: foi colocado pelo pintor para representar a população, surpreendida pelo fato.

A Guarda de Honra que está na tela ainda não existia nessa época (foi criada por um decreto de 1/12/1822). D. Pedro estava escoltado por guardas voluntários. O pintor usou fardas brancas para aumentar o contraste entre o bloco dos guardas e o dos civis (que usam vestes escuras), o que traz mais dinamismo à tela. Ele ampliou o séquito do regente e reduziu a tropa para equilibrar os dois blocos de figuras.

A colina onde está d. Pedro dista 405 metros do riacho do Ipiranga. O pintor aproximou os dois locais para colocar o príncipe numa posição mais elevada e, ao mesmo tempo, mostrar o riacho que dá nome ao quadro (bem destacado pelas patas do cavalo). A tela está centrada em d. Pedro: o olhar do carreteiro nos leva diretamente ao regente, que é realçado pela disposição dos guardas em semicírculo.

COMO TUDO COMEÇOU
Há quem diga que Pedro Américo plagiou o quadro "1807", de Meissionier. O problema é que o brasileiro queria algo mais imponente que a tela de Moreaux, que destacasse a figura real num momento em que o Império decaía. Por isso, não tinha muitas opções: precisava colocar d. Pedro mais à esquerda, numa posição mais alta, iniciando a ação, e a tropa à direita, reagindo à ação. A estrutura é a mesma, mas composição melhorou. O brasileiro substituiu os cavaleiros (à esq.) por um carreteiro que olha para d. Pedro, dando mais unidade ao quadro. O curioso é que o próprio Meissonier viu uma foto de "O Grito do Ipiranga" no pavilhão do Brasil na Exposição de Paris, em maio de 1889, e gostou. (MAURICIO PULS)

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