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Celso
Castro
Para
Castro, militares
abandonaram política
(3/4/2000)
Nome:
Celso Castro
Idade:
36 Cargo: pesquisador do Centro de Pesquisa e Documentação
de História Contemporânea do Brasil da Fundação
Getúlio Vargas, editor da revista "Estudos Históricos"
e diretor da coleção "Descobrindo o Brasil",
da Jorge Zahar Editor
Livros: "O Espírito Militar: um Estudo
de Antropologia Social na Academia Militar de Agulhas Negras"
(Jorge Zahar, 1990), "Os Militares e a República:
um Estudo sobre Cultura e Ação Política"
(Jorge Zahar, 1995) e "A Proclamação da
República" (Jorge Zahar, 1999); organizador de
"Ernesto Geisel" (ed. FGV, 1997), entre outros
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CRISTINA
GRILLO
da Sucursal
do Rio
A Proclamação
da República, em 15 de novembro de 1889, pôs os militares em destaque
no cenário político brasileiro, uma participação que se manteve
até o fim do regime militar, em 1985.
Para Celso Castro, 36, pesquisador do CPDOC (Centro de Pesquisa
e Documentação de História Contemporânea do Brasil) da Fundação
Getúlio Vargas, especialista na questão militar brasileira, a principal
preocupação dos militares hoje é livrar-se do estigma criado por
sua participação na política entre 1964 e 1985.
Castro acaba de lançar "A Proclamação da República" (Jorge Zahar)
e analisa os arquivos do ex-presidente Ernesto Geisel, doados pela
família ao CPDOC.
Folha - Como a participação dos militares na política se
desenrolou ao longo dos anos?
Castro - Eles foram politicamente ativos em vários episódios,
mas é preciso ter cuidado com a generalização. Muitas vezes, foram
alguns grupos que atuaram. Nas primeiras listas de cassações após
o golpe de 64, havia mais militares que civis. O golpe é a grande
intervenção e, diferentemente de outros momentos, os militares ficaram
21 anos e instalaram um regime militar, controlando o poder político.
Eles tiveram divergências, embora no geral estivessem unidos em
torno do que chamavam a "revolução de 64". A abertura iniciada por
Ernesto Geisel encontrou muita oposição entre os militares. E as
divergências continuaram fortes até os anos 80. O caso Riocentro,
agora reaberto, é importante para ver como, em 1981, existiam grupos
contrários à abertura.
Folha - Como o sr. avalia as declarações do general Newton
Cruz de que Paulo Maluf o teria procurado para articular um golpe
contra a candidatura de Tancredo Neves, em 1984?
Castro - É impossível avaliar se Cruz diz a verdade ou não.
Mas havia, no momento da transição, militares insatisfeitos com
os rumos da "abertura" e com a transferência do poder para um presidente
civil de oposição. Era um grupo minoritário. Tratava-se de um grupo
de "radicais", beneficiados pelo poder paralelo dos órgãos de informação/repressão
durante a ditadura. Mas esse grupo já havia sido enfraquecido pelas
decisões de Geisel e pela atitude de Figueiredo em relação ao caso
Riocentro. Figueiredo e os comandantes do Exército da ocasião, para
proteger oficiais amigos atuantes nos órgãos de informação/repressão,
acabaram fazendo com que a bomba explodisse a imagem pública de
toda a instituição militar. Também não podemos esquecer que, independente
das acusações de Newton Cruz a Maluf serem verdade ou mentira, o
Brasil tem uma tradição de políticos autoritários dispostos a recorrer
aos militares para intervir na política em benefício de seus interesses.
Folha - Pode-se comparar o processo que levou ao golpe de
64 com o que levou à Proclamação da República em 1889?
Castro - A cultura da mocidade militar que fez o golpe de
1889 nascer era marcada pela predominância do mérito e das doutrinas
cientificistas da época. A geração envolvida em 64 era formada por
oficiais que tinham uma ideologia anticomunista muito forte. É uma
geração que pensa que o mundo tem dois blocos, os bons e os maus,
os Estados Unidos defendendo o capitalismo, a liberdade e a democracia,
e os comunistas, liderados pela União Soviética, querendo subverter
a religião, a família, a propriedade privada. Eles estavam engajados
ao lado do Ocidente e o principal inimigo era inimigo interno, os
comunistas. Esse linguajar é muito antiquado hoje, mas era o da
geração que fez o regime militar. Em 1985, já havia uma situação
de perda de prestígio social muito grande, em grande parte por causa
da atuação no regime militar.
Folha - Antes de 64 a imagem social dos militares era outra?
Castro - Eles tinham prestígio, uma profissão reconhecida,
a instituição era admirada por grande parte da população. Com o
fim do regime militar, é muito difícil encontrar qualquer pessoa
ou grupo que os defenda. Hoje, não vejo uma questão militar preocupante.
Há uma série de coisas a resolver, mas o que se considerava como
prerrogativas militares foram sendo pouco a pouco afastadas.
Folha - Por exemplo?
Castro - Duvido que, há 15 anos, algum analista militar
acreditasse que passaríamos por um processo de impeachment de um
presidente da República em meio a acusações de corrupção, com mobilizações
populares, sem que os militares tomassem uma atitude.
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