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'Eclipse de uma Paixão' chega aos cinemas

Agência Folha 13/11/97 17h22
Do Rio de Janeiro

Existe algo de deprimente nos filmes que procuram representar personagens célebres, como Arthur Rimbaud (Leonardo DiCaprio) e Paul Verlaine (David Thewles) em ''Eclipse de uma Paixão'', que estréia amanhã nos cinemas de São Paulo. Os dois estão entre os mais importantes poetas da língua francesa, o que não facilita muito as coisas. Poetas falam de literatura e coisas assim que interessam a pouca gente.

O objetivo desse ''Eclipse'' de Agnieszca Holland é, visivelmente, driblar o problema e contar uma historinha biográfica sobre esses seres inusuais. Poetas, sim, mas capazes de levar adiante um caso homossexual tão mais rumoroso quanto se pensa que Verlaine já era famoso e casado. Se tudo nessa história lembra a palavra transgressão, o filme vai para o caminho oposto: o da convenção.

Convenção no filmar, convenção no narrar (linear). E, sobretudo, convenção ao abordar a história dos poetas a partir de suas diferentes personalidades: Rimbaud, mais agressivo e seguro; Verlaine, hesitante e incerto. Daí decorre um filme de análise de personagens um tanto constrangedor. Que interesse existe em ver dois grandes poetas discutindo sobre sua relação amorosa, mais ou menos nos termos em que fazem personagens de novela de televisão?

A diferença -substancial- é que personagens de televisão são prosaicos, e faz sentido terem conversas prosaicas. Mas dois poetas? E Rimbaud? Não, quase nunca temos oportunidade de ouvir os versos escritos por eles. Só conversas sobre ''nossa relação'', como dizem os casais em crise. Aliás, nunca saberemos quais as suas relações com o mundo (a não ser vagamente, como partidários da Comuna de Paris, ocorrida em 1871). E também não saberemos que mundo é esse a que eles se opõem, o que procuram da vida etc.

Holland escolheu representar Rimbaud como um adolescente rebelde (como qualquer adolescente razoavelmente rebelde do mundo) que sente necessidade de experiências. Verlaine, mais modestamente, embebeda-se de absinto e segue o discípulo como uma barata tonta.

Rimbaud é quem dá o tom (o que é justo). Mas, então, por que não usar um belo rock em lugar daqueles violinos depressivos que ocupam a trilha sonora? Porque é ''um filme de arte'', naturalmente. Porque precisamos manter ''o bom tom'' e o decoro, numa história que só interessa pela falta de decoro, de limites dos personagens.

Não sejamos radicais: Agnieszca Holland filma uma cena inspirada (não por acaso, uma reunião de poetas). O resto do tempo, parece se desincumbir da tarefa, sem qualquer entusiasmo. No fim, contempla seu espectador com uma temporada no inferno: esse mundo do culturalismo que Rimbaud e Verlaine, justamente, vomitaram. Resumindo: é um lixo.(Por Inácio Araujo)



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