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“30 Anos Incríveis” confronta duas Aracys amanhã

da Folha de S.Paulo 31/05/2000 09h30
em São Paulo

Aracy de Almeida (1914-88), figura-lenda das dezenas e dezenas abatidas na trincheira pelas modernizações bossa-novistas e tropicalistas, assombra amanhã (quinta-feira) à noite, às 22h30, a série “30 Anos Incríveis”, da TV Cultura.

O programa compila dois momentos da cantora carioca: um em 1972, quando ela cantou e falou no “MPB Especial”, do memorialista Fernando Faro, e outro em 1979, quando ela, já afastada de cantar, deu entrevista ao finado “Vox Populi”.

A remontagem paralela dos dois programas dá pano para manga _são duas Aracys bem diferentes que estão ali e aqui.

Em 1972, ainda que o tropicalismo já houvesse feito todas as suas estripulias sobre a canção tradicional, ela ainda era toda sorrisos.

Nesse pique, conta histórias de seu autor-mito _Noel Rosa_, canta as composições dele que imortalizou (“Feitiço da Vila”, “Com Que Roupa”, “Palpite Infeliz”, “Feitio de Oração” e outras) e, de quebra, lembra canções que Ary Barroso (“Camisa Amarela”) e Assis Valente (“Fez Bobagem”) inventaram para ela.

O crítico Tárik de Souza aparece para contextualizar a importância de Aracy: explica que, nos anos 50, ela foi responsável, além de tudo o que já havia feito, por recompor a imagem então algo dissipada do sempre clássico Noel.

Mas, quando a Aracy de 72 corta para a de 79, o que se vê não é só o acréscimo de idade _já consumada jurada de programa cão, ela perdeu o sorriso na medida mesma em que ganhou em tom malcriado, sarcasmo, acidez, (ainda mais) humor negro e provável rancor.

Aí é para se esbaldar. Zomba do defeito facial de Noel (“Não era um monstro, mas se notava que o queixo dele era fajuto”), ainda que o defenda “diante da bagulhada que anda por aí”. Duvida da parceria do boxeador Kid Pepe com Noel em “O Orvalho Vem Caindo” (“Noel deu a parceria com medo que Kid Pepe desse um nocaute nele”) e faz careta à pergunta de estrela de Gal Costa.

Diz que não canta mais em 79 porque é preguiçosa, malandra e não gosta de cantar. Mentira de Aracy. Por trás do humor negro, a mágoa do escanteio era evidente.

“Morreram os autores de que eu gostava muito, me desinteressei de cantar. Não vou regravar música de ninguém”, despistava, camuflando que os compositores é que não criavam mais para ela. Assim viveu, em suas últimas décadas, uma das mais importantes cantoras populares brasileiras.

(Pedro Alexandre Sanches)

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