Comitê Rio 2004 tenta impressionar COI

Grande mobilização popular está sendo armada

AJB 22/02/97 19h07
Do Rio de Janeiro

O Rio aposta na emoção para garantir os Jogos de 2004. Um dos trunfos da candidatura carioca -a mobilização popular- será estimulado pelo Comitê Rio 2004 domingo que vem, com apelos ao comparecimento maciço da população às praias, com camisetas e bandeiras da campanha, numa festa para provar que a cidade quer mesmo promover as primeiras Olimpíadas do próximo milênio.

Mas esta não é a única cartada: o potencial econômico do Brasil é tido como outro ponto forte diante da candidatura de Buenos Aires, que segundo análises de quem teve acesso ao relatório sobre as cidades, é apontada como melhor tecnicamente que a do Rio.

Além disso, a equipe que se apresentará ao COI será reforçada por Pelé e João Havelange. "Não se trata de ganhar agora, mas de não perder. E o que causa uma derrota é a falta de apoio popular, a má imagem do país nos meios de comunicação e os enfrentamentos políticos internos", avalia Lluís Millet, um dos técnicos espanhóis que ajudaram na elaboração do projeto do Rio.

O presidente do Comitê Rio 2004, Ronaldo César Coelho, diz confiar na qualidade da proposta carioca, mas não crê numa escolha meramente técnica na primeira fase, que selecionará quatro ou cinco das 11 candidatas. "Se o relatório encerrasse toda a questão, não teria importância a dimensão do mercado, a estabilidade político-econômica e o espaço para a divulgação do olimpismo. Há outras questões que vão além do relatório de avaliação. Não vamos ser ingênuos, isto é um negócio de bilhões de dólares", diz.

Lluís concorda com Ronaldo. "Provavelmente, serão as potencialidades comerciais e industriais que vão decidir. De resto, todas as candidaturas são mais ou menos iguais."

De fato, as duas últimas escolhas -Atlanta-96 e Sidney-2000- não cumpriram requisitos estritamente ligados aos projetos olímpicos. A preferência por Atlanta, por exemplo, atendeu a um pedido não declarado da Coca-Cola -que patrocina os Jogos Olímpicos desde 1928-, enquanto a eleição de Sidney teve uma complicação um pouco maior.

Como ainda não havia a fase técnica eliminatória, até a pífia candidatura de Brasília às Olimpíadas de 2000 foi avaliada pelo COI. Logo depois, foi descartada. Em seguida, saíram da disputa Melbourne (Austrália), Istambul (Turquia) e Manchester (Inglaterra). Sobraram Pequim e a vencedora.

O que se viu, apesar de existirem 18 delegados asiáticos no COI contra apenas quatro da Oceania, foi a vitória do bloco anglo-saxão. O argumento usado não foi geográfico, mas político: o incidente com os estudantes na Praça da Paz Celestial, em 1989, teria sido o motivo da formação do bloco que deu vitória à Austrália.

Os 111 representantes do COI dividem-se entre 45 europeus, 21 americanos, 18 asiáticos, 23 africanos e quatro da Oceania. Desta vez, na primeira fase, votam apenas 14 integrantes do COI - seis europeus, dois representantes das Américas, três asiáticos, dois africanos e um da Oceania. Somente na segunda fase, em setembro, na escolha definitiva, é que vota o colegiado inteiro.

Se pesar mesmo o critério geopolítico -hipótese mais provável-, devem sobrar três candidatas européias, uma sul-americana e uma africana. Pela análise de especialistas, as candidaturas de San Juan de Porto Rico, Lille e São Petersburgo estão descartadas. Se valerem estatísticas, Sevilha e Estocolmo também: nos últimos 40 anos, nenhuma cidade com menos de 3 milhões de habitantes foi escolhida.

O colégio eleitoral da segunda fase é o que há de mais imprevisível. O COI, conservador, estaria disposto a indicar a Cidade do Cabo para a segunda fase apenas para assinalar sua generosidade. Mas há o risco de que a cidade sul-africana acabe eleita, pois, como formam o segundo bloco mais forte, os africanos poderão decidir, tendo a ajuda dos europeus das cidades candidatas que não sobreviveram ao primeiro turno.

Rivalidades
e aliados

Paris já é candidata declarada aos Jogos de 2008 e a França -que tem dois votos no comitê- não quer uma cidade européia como sede de 2004. O mesmo raciocínio pode valer para outros europeus que pretendam as próximas Olimpíadas. Afinal, dos 45 representantes da Europa no COI, apenas quatro são italianos.

Questões esportivas não entram sozinhas nesta finalíssima. A briga vai além disso. A Turquia -que tem Istambul representada na disputa- não mantém relações diplomáticas com a Grécia, eterna concorrente aos Jogos. O COI tem uma dívida com Atenas, primeira sede olímpica -foi ela a derrotada contra Atlanta.

E, dívida por dívida, até o Rio tem o que cobrar: o carioca não se lembra, mas em 1936, em 1956 (apenas para as provas eqüestres) e em 1960 a cidade concorreu, num sistema de disputa que não incluía nem a visita de uma comissão de avaliação. E se só a dívida valesse alguma coisa, Buenos Aires, então, estaria com a medalha no pescoço: já concorreu cinco vezes.

Impressionar o COI, portanto, é mais importante que qualquer outra coisa. O principal desafio do Rio na apresentação que fará ao Comitê Executivo do COI, dia 6, é provar credibilidade.

O Comitê Rio 2004 tentará deixar bem claro que há garantias do governo federal de que os investimentos em obras como a despoluição da Baía de Guanabara, melhoria do sistema de transportes e telecomunicações serão cumpridos.

Para isso conta com um timão: o presidente da Fifa, João Havelange, o ministro Pelé, o presidente do Comitê Olímpico Brasileiro, Carlos Artur Nuzman, o prefeito Luís Paulo Conde e o embaixador olímpico, Ronaldo César Coelho, além de uma declaração em vídeo do presidente.

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