Gorbatchov discute novos modelos na Rio+5

CUT critica atuação do governo na questão ambiental

Agência Folha 17/03/97 20h32
Do Rio de Janeiro

O ex-presidente da ex-URSS, Mikhail Gorbatchov, disse que, se o homem não mudar o modelo de desenvolvimento planetário, daqui a 20 a 40 anos as alterações na biosfera serão de tal ordem que "a natureza terá que viver sem nós".

Fundador e presidente da ONG (organização não-governamental) Green Cross International (Cruz Verde Internacional), Gorbatchov é um dos principais convidados da reunião ambiental "Rio+5", que começou na quinta-feira passada e termina na quarta no Rio.

Ele integra o grupo de convidados da "Rio+5" que discute a redação final do documento Carta da Terra -produto final da "Rio+5", contendo recomendações sobre o meio ambiente e desenvolvimento, a ser entregue na ONU.

"Não estou fazendo drama, mas vejo drama à nossa frente se continuarmos do jeito que estamos (nos desenvolvendo)", disse Gorbatchov. Para ele, a grande tarefa agora é traduzir os princípios da Carta da Terra em políticas e legislações nos diferentes países.

Ele disse que, com o fim do comunismo, "podemos sentar na mesa e conversar", sem que haja a hegemonia dos interesses de um país. "Temos a obrigação, através do comércio, da ecologia, do direito, de reorganizar o mundo."

Gorbatchov disse que o processo de globalização econômica é um dado objetivo e "precisamos lidar com ele". Para ele, é urgente a criação de regras para se controlar, por exemplo, os danos ambientais provocados por grandes companhias.

Na tarde de terça-feira, Gorbatchov e outros integrantes do grupo que ajudou a definir os princípios da Carta da Terra deverão anunciar a redação final do documento. A "Rio+5" é um encontro de caráter não-governamental.

Em junho, Gorbatchov e o organizador da "Rio+5", o canadense Maurice Strong, deverão entregar uma cópia da Carta da Terra na reunião da ONU que fará um balanço oficial dos cinco anos após a ECO-92.

De caráter geral, a Carta da Terra defende o respeito ao planeta e a todas as formas de vida. Reivindica a promoção do desenvolvimento social e de sistemas financeiros que contribuam para criar e manter a sustentabilidade da vida, para erradicar a pobreza e para fortalecer as comunidades locais.

Deverá ficar de fora o desejo de ONGs da América Latina de incluir uma recomendação pelo fortalecimento de organismos nacionais como os comitês de desenvolvimento sustentável.

Essas ONGs reclamam que esses organismos -formados por representantes de governos e da sociedade civil para propor ações de desenvolvimento sustentável- não têm funcionado a contento, além de não ter poder deliberativo.

O diretor-executivo da ONG Conselho da Terra, Maximo Kalaw, um dos responsáveis pela organização da "Rio+5", disse que esse tema é técnico, devendo ser decidido depois, em termos de legislação, por cada país.

A brasileira Angela Oliveira Harkavy, ex-presidente do comitê internacional que, desde 1990, vem redigindo as primeiras versões da Carta da Terra, disse ter gostado do resultado final.

CUT critica questão
ambiental no governo FHC

A direção da CUT (Central Única dos Trabalhadores) pretende entregar na terça-feira ao presidente Fernando Henrique Cardoso, no Rio, um documento condenando a atuação do governo na questão ambiental. FHC fará uma palestra sobre a política ambiental brasileira, às 17h, no encerramento da conferência "Rio+5".

O coordenador nacional de meio ambiente da CUT, Pedro Ivo Batista, disse que não está prevista nenhuma manifestação de trabalhadores, já que o hotel Sheraton, onde acontece a "Rio+5", não tem espaço para grandes aglomerações.

"Se tivesse espaço, nós provavelmente faríamos (uma manifestação)", disse Batista. "A manifestação será a distribuição de 500 panfletos aos participantes da conferência, mas pode haver surpresas, porque a CUT é imprevisível."

A "Avaliação da CUT sobre a Política Ambiental Brasileira", um texto de uma página, sustenta que não existe, de fato, uma política para o meio ambiente. "O governo não tem uma estratégia, mas apenas atuações pontuais", disse Pedro Ivo Batista.

Na avaliação da CUT, a criação, por decreto presidencial, da Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável e da Agenda 21 Nacional não representa avanços.

Segundo a entidade, o fato de a comissão ser vinculada à Câmara de Políticas dos Recursos Naturais, composta por ministros, e não ter poder deliberativo mostra a "verdadeira intenção do governo: excluir a sociedade civil e os trabalhadores das discussões".

Batista afirmou que o problema ambiental mais sério atualmente no Brasil é o da Amazônia, onde estariam atuando madeireiras asiáticas que utilizariam trabalho escravo e fariam contrabando de madeira para o exterior.

Outros problemas ambientais que necessitam de atuação imediata do governo, segundo a CUT, são a extinção da Mata Atlântica, a devastação do cerrado e a desertificação no Nordeste.

A CUT defende a intervenção governamental para a reforma urbana, no sentido de melhorar a qualidade de vida nas cidades, e a reforma agrária.

No campo, seria necessário acabar com as monoculturas, garantindo a diversidade de espécies e, assim, maior equilíbrio ecológico. A CUT pede também, junto com o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), o fim dos latifúndios.

"A estrutura fundiária concentrada provoca o êxodo rural, levando as pessoas a procurar moradia nas encostas das cidades, o que causa problemas ambientais", disse Fernanda Mateus, do MST.

A Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira) também participará da entrega da avaliação da CUT ao presidente.(Roni Lima e Mário Moreira)