BUSCA Miner



Índice | Próxima

Metade de SP mora em habitação irregular

04/06/2000 09h42
CHICO DE GOIS
SORAYA AGÉGE

da Folha de S.Paulo

Metade da população da cidade de São Paulo _um total de 5,5 milhões de pessoas _mora em habitações irregulares, a grande maioria sem qualquer título de propriedade.

Entre esses moradores, pelo menos 2,8 milhões vivem sem infra-estrutura urbana adequada, segundo admite a Secretaria Municipal da Habitação.

A maioria desses 5,5 milhões de moradores pagou para viver nesses locais. São três os tipos de habitações irregulares na cidade: loteamentos ilegais, favelas e cortiços.

O primeiro envolve uma população estimada em 3 milhões de pessoas que compraram irregularmente nada menos que 17% do território paulistano, o equivalente a 250 km2.

Em cerca de 26% dessa extensão urbana irregular (65 km2), os serviços públicos não existem. Ficam sem infra-estrutura básica 1,3 milhão de moradores de loteamentos ilegais na periferia da cidade, de acordo com a secretaria.

Nos cortiços, que estão concentrados nos bairros centrais da cidade, moram atualmente de forma clandestina 600 mil pessoas, segundo a CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano) do Estado de São Paulo.

Nas favelas, vivem pelo menos 1,9 milhão de pessoas. Esse número, porém, deve estar subestimado, pois é baseado em uma pesquisa que a Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) fez para a Secretaria Municipal da Habitação em 1994.

Os técnicos da Secretaria da Habitação não têm estimativas da variação dessa população nos últimos cinco anos, mas trabalham sob a perspectiva de aumento crescente. O crescimento médio anual, verificado nas favelas entre 73 e 93, foi de 17,8%.

Os dados da pesquisa mostram que, mesmo morando de forma irregular, 13,8% da população favelada pagou a intermediários ou ex-moradores pelos terrenos ou casas onde vivem. A maioria, no entanto, passou a viver em favelas a partir de ocupações.

A infra-estrutura existente nas favelas é quase toda clandestina, feita pelos próprios moradores. Para se ter uma idéia da precariedade, 14,7% das casas nem sequer têm esgoto doméstico afastado da construção. Cerca de 21% das casas não têm ligação na rede de energia elétrica.

Segundo o relatório gerencial da pesquisa, os moradores das favelas "pensam como proprietários individuais e não como um conjunto de expropriados".

Nos três tipos de moradias irregulares de São Paulo, muitos moradores submetidos a esse tipo de condição pagam imposto ou aluguel.

Não há números sobre essa situação, que é verificada pela cobrança de IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) de encortiçados, favelados e moradores de loteamentos.

A cobrança de IPTU é feita a partir do levantamento aerofotogramétrico da prefeitura, que coloca a dívida em nome do dono original da área e a divide em lotes, fazendo a entrega em cada endereço irregular.

Nas favelas, segundo a Fipe, um total de 39.900 moradores pagam aluguel dos "barracos". O preço médio, apurado pela pesquisa da Fipe em 94, era de R$ 75 por mês.

Os motivos
Urbanistas, técnicos e advogados ouvidos pela Folha para comentar os motivos dessa situação apontam duas falhas institucionais cometidas contra a cidade, além do contexto socioeconômico que leva metade da população a viver em locais irregulares.

Uma delas é a morosidade da Justiça. "O atual sistema de julgamento dos processos causa isso. Além disso, os grileiros, por exemplo, agem onde o Estado se omite", afirma Iberê Bandeira de Mello, conselheiro da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).

Já os técnicos consideram também que essa irregularidade habitacional, que envolve metade dos paulistanos, foi criada ao longo dos últimos 30 anos, por uma série de omissões da prefeitura, que não fiscaliza a ação de grileiros e não faz planejamento urbano.

A principal consequência dessa situação é a inviabilização de melhorias urbanas para o conjunto da população.

Outra, atinge constantemente grupos de moradores irregulares, como o de Guaianazes: 2.000 pessoas foram expulsas de suas casas pela tropa de choque da Polícia Militar no último dia 19, a mando da Justiça, embora elas tivessem pago suas casas.

Técnicos da prefeitura avaliam que os serviços públicos acabam apenas cobrindo grandes estragos e inviabilizando o planejamento urbano.

Os reflexos se dão no abastecimento de água, nos transportes, no trânsito, no meio ambiente, nos serviços de saúde e na educação.

As perspectivas sobre as condições da habitação em São Paulo repousam em um projeto de atualização do Plano Diretor do Município, que há dois anos tramita entre gavetas de gabinetes da prefeitura e da Câmara Municipal.

O atual Plano Diretor de São Paulo foi feito em 1972. Para se ter uma idéia do absurdo urbanístico que isso promove, basta comparar: há quase 30 anos, quando esse plano foi feito, a cidade tinha 72 mil moradores em favelas, que representavam 1,1% da população local.

Em 1994 (época do último levantamento), eles já eram 1,9 milhão e representavam 19,4%. Atualmente devem ser muito mais.

Leia mais notícias de cotidiano na Folha Online





Índice | Próxima

 EM CIMA DA HORA