CPI descobre novas contas no exterior

Paraguai cria 'CPI' para investigar 'lavagem'

Agência Folha/AJB 12/03/97 20h52
De Brasília e Florianópolis

CPI A CPI dos Precatórios começou a investigar mais três contas bancárias no exterior mantidas por supostos envolvidos no esquema dos títulos públicos. Duas contas seriam em agência do Citibank nos Estados Unidos. Estariam ligadas ao suposto esquema de emissão de debêntures (títulos de empresas privadas ou estatais) no Paraná. O senador Bernardo Cabral (PFL-AM) recebeu relatório do Banco Central sobre uma terceira conta, na cidade de Houston, Estados Unidos, ligada ao Banco Vetor.

A conta do Banco Vetor, Fábio Barreto Nahoum, no Nations Bank of Texas, em Houston, teria sido encontrada pelo Banco Central, durante o processo de liquidação do Vetor, nos papéis que estavam dentro do cofre particular do banqueiro. Os integrantes da CPI acreditam que era para esta conta que Fábio Nahoum enviava os lucros obtidos com as operações de lançamentos de títulos públicos. O senador Vilson Kleinubing (PFL-SC) vai pedir ao banqueiro que envie à CPI extratos desta conta.

A anotação encontrada no cofre é a seguinte: "A minha conta no Nations Bank de Houston é a seguinte: Nations Bank os Texas, N.A. 700 Lousiana - 31 ST Floor. Houston, Texas 77002. Preferred Money Market. Account 414-756691-3. Magda Fanni de Torelli or Valeria Torreli Fanni. Attention: Lizete Ortiz - IPB. Tel. (210) 7227611." Na mesma folha, abaixo, outra anotação: "Ag. Miami 305 864 9627".

Em depoimento à CPI na noite desta quarta-feira, o banqueiro Fábio Nahoum negou que a conta fosse sua, afirmando que a titular é sua prima, Magda Nahoum Torelli, e que os recursos remetidos ao Nations Bank foram obtidos na venda de um apartamento de Magda no Rio de Janeiro, localizado na lagoa Rodrigo de Freitas. Nahoum disse ser procurador de Magda, que de acordo com ele é viúva, reside no México há 25 anos, razão pela qual possui uma conta bancária nos Estados Unidos.

Ele ainda informou que Valéria Torelli é filha de Magda. O banqueiro garantiu que seu advogado, José Carlos Osório, providenciará o envio dos documentos comprovando a transação com o imóvel e a remessa regular dos recursos para a conta de Magna Torelli à CPI até, no máximo, sexta-feira. "Nós já sabiamos que ele iria dizer isso, pois está brincando de gato e rato conosco", afirmou o relator da CPI, senador Roberto Requião (PMDB-PR).

As contas do Citibank seriam de funcionários do Banestado, o banco estadual do Paraná. Uma das contas teria o número P5120MPE e seria mantida por José Édson Carneiro Souza, com saldo de US$ 1,528 milhão. A outra conta teria o número P6120MPS e seria mantida por Luiz Antônio Lima, com saldo de US$ 1,698 milhão. Requião deverá solicitar diligências à CPI para confirmar se essas duas contas estão relacionadas à emissão de debêntures da Banestado Leasing e Corretora Banestado.

A CPI tem indícios de que cerca de R$ 300 milhões desses títulos tenham sido comprados pela distribuidora Boa Safra. A suspeita é de que as contas nos Estados Unidos tenham recebido parte dos lucros obtidos na operação. A Boa Safra é propriedade de Fausto Solano Pereira, ouvido terça-feira por ter recebido um cheque de R$ 7,86 milhões da IBF Factoring, uma das "laranjas" do esquema com títulos.

Governo de Pernambuco
teria consultado Pitta

Depois de receber proposta do banco Vetor para emitir títulos públicos, no final de 1995, representantes do governo pernambucano se reuniram com o então secretário das Finanças da Prefeitura de São Paulo, Celso Pitta, em busca de informações. O fato foi revelado pelo empresário Fábio Nahoum à CPI. "Eles queriam saber se a nossa proposta tinha procedência", disse Nahoum, em referência ao então secretário da Fazenda de Pernambuco, Pedro Eugênio, e a Eduardo Campos, neto do governador Miguel Arraes e atual secretário.

Os dois teriam se reunido com Pitta, na época superior hierárquico de Wagner Ramos, então coordenador da Dívida Pública do município. Ramos é apontado como mentor do esquema irregular de comercialização de títulos de Estados e municípios. Nahoum reconheceu que a instituição não detinha conhecimentos sobre precatórios (dívidas judiciais) quando se ofereceu para fazer a emissão de títulos de Pernambuco.

Na mesma época, porém, Wagner Ramos fez uma declaração escrita afirmando que o Vetor detinha "ampla experiência e notório saber" sobre as negociações. A declaração foi anexada à proposta feita ao governo pernambucano e ajudou o banco a fechar o contrato, pelo qual ganhou R$ 22,13 milhões.

"Quero entender essa contradição. Há uma carta do senhor Wagner Ramos, dizendo que o banco tinha ampla experiência, e o senhor diz que o banco não detinha tecnologia para a operação", disse o senador Roberto Requião (PMDB-PR), relator da CPI, durante o depoimento de Nahoum. O empresário respondeu que, quando Wagner Ramos assinou a declaração, já havia um acerto verbal para que ele próprio assessorasse o banco nas operações. Na verdade, a "ampla experiência e notório saber" seriam de Ramos, e não do Vetor.

"Sabíamos que Wagner Ramos havia assessorado a emissão de títulos do Estado de Alagoas e o procuramos", disse Nahoum. Segundo o empresário, somente Ramos detinha o conhecimento sobre a fórmula para calcular o total de precatórios devidos pelos Estados. A Constituição só permite a emissão de títulos por Estados e Municípios para pagar precatórios.

Porém, tanto Pernambuco quanto Santa Catarina -dois Estados em que o Vetor operou- emitiram títulos em valor superior ao das dívidas judiciais. O dinheiro excedente foi aplicado em pagamento de salários e outras despesas correntes, o que contraria a Constituição.

Fábio Nahoum afirmou que partiu do banco Vetor a sugestão para que Pernambuco emitisse os títulos. O contato entre o banco e o governo teria sido feito por Ronaldo Ganon, um dos diretores da instituição. Nesse momento, Requião procurou explorar uma suposta contradição. Segundo o relator, o secretário da Fazenda de Pernambuco, Eduardo Campos, disse que a sugestão para que o Vetor fizesse a operação partiu de Wagner Ramos. A afirmação foi contestada por Nahoum. Segundo o empresário, as autoridades de Pernambuco somente teriam buscado contato com Ramos depois de procuradas pelo Vetor.

Rastreamento de cheques
revela 'fantasmas'

A CPI está com dificuldades para finalizar o rastreamento dos 201 cheques emitidos pela IBF Factoring para cerca de 180 pessoas. Os técnicos que auxiliam a CPI descobriram que pelo menos cem dos destinatários são "fantasmas". Ou seja, a maior parte das pessoas citadas nos cheques da IBF -que totalizam R$ 123 milhões- ou simplesmente não existe ou forneceu endereços falsos às agências bancárias que efetuaram os depósitos dos cheques da IBF.

Os recursos movimentados pela IBF Factoring na agência paulistana do Banco Dimensão são o resultado do lucro obtido pela empresa na intermediação de operações de compra e venda de títulos públicos.

O rastreamento desses cheques é considerado essencial para os trabalhos da CPI, pois é preciso saber quem recebeu o dinheiro obtido nas operações irregulares que estão sendo investigadas. Até agora, a CPI já conseguiu desvendar o esquema de intermediação envolvendo os títulos, mas não consegue saber quem ficou com o lucrou das operações.

Segundo a Polícia Federal, o empresário Ibraim Borges Filho, dono da IBF Factoring, ficou com apenas R$ 80 mil dos R$ 123 milhões movimentados em sua conta bancária do Dimensão.
Dos não-fantasmas que receberam cheques da IBF, o mais notório é Fausto Solano Pereira, dono da distribuidora Boa Safra. Pereira recebeu um cheque de R$ 9,76 milhões. Em depoimento à CPI, porém, ele negou qualquer contato com a IBF, em depoimento considerado "inverossímil" pelos senadores.

Congresso paraguaio
cria 'CPI'

O Congresso paraguaio criou na segunda-feira uma Comisión Bicameral de Investigación (equivalente da CPI no Brasil) para apurar o envolvimento de bancos e casas de câmbio do país na lavagem do dinheiro obtido pelo esquema que negociava irregularmente os títulos públicos no Brasil. A primeira providência dos parlamentares paraguaios, tomada nesta quarta-feira, foi marcar uma visita à Comissão Parlamentar de Inquérito do Senado brasileiro que está investigando o caso. Os parlamentares paraguaios estarão em Brasília de segunda a quinta-feira da próxima semana.

O pedido de inquérito foi feito pelo deputado Blas LLano, do Partido Liberal Radical Autêntico. A comissão que vai investigar a parte paraguaia do escândalo dos precatórios é formada por três deputados e dois senadores. Uma das instituições sob investigação é o Banco Del Paraná. A CPI brasileira já tinha apontado o banco como uma das instituições preferidas pelo esquema dos precatórios para lavar o dinheiro obtido com as operações irregulares de títulos.

CPI catarinense
ouvirá Nahoum

A CPI dos Precatórios instalada na Assembléia Legislativa de Santa Catarina para apurar irregularidades na emissão de títulos públicos pelo governo do Estado também ouvirá o banqueiro Fábio Nahoum. O depoimento está marcado para o dia 25. A CPI quer saber informações sobre o processo que levou à escolha do banco como intermediário da negociação de R$ 604 milhões em Letras Financeiras do Tesouro do Estado (LFTs).

Segundo a presidenta da CPI, deputada Ideli Salvatti (PT), depois de mais de duas semanas de depoimentos ainda "não ficou claro" como foi fechado o contrato entre o governo de Santa Catarina e o Banco Vetor. Ela disse que também tem dúvidas sobre o motivo pelo qual o banco foi contratado, por R$ 33 milhões, antes da legitimação do acordo para a venda, compra e recompra dos títulos públicos.

O governador de Santa Catarina, Paulo Afonso Vieira (PMDB), chamou o Banco Central de "negligente, omisso e até conivente" com a operação financeira de emissão dos títulos públicos. Segundo ele, "o Banco Central deixou a desejar na sua atuação no controle da emissão dos títulos". As declarações do governador foram feitas terça-feira a rádio local e confirmadas por sua assessoria de imprensa.

Durante o programa, Paulo Afonso disse que está havendo discriminação, por parte do Senado e do Banco Central, contra ele. O governador considerou, ainda, que a CPI está dando tratamento diferenciado ao Estado de Santa Catarina em relação ao de Pernambuco, que também tem a operação de títulos públicos sob suspeita. Segundo ele, Pernambuco recebeu autorização do BC e do Senado para a manutenção de seus títulos no mercado financeiro. "Para não haver discriminação, a solução deve ser igual para todas as unidades da Federação", reivindicou o governador de Santa Catarina.

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