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Pitta é sócio de Nahas no Caribe, diz Nicéia

26/05/2000 03h32
KENNEDY ALENCAR
MALU GASPAR
da Folha de S.Paulo

O prefeito Celso Pitta e o especulador financeiro Naji Nahas são sócios numa empresa chamada Yukon River nas Ilhas Virgens Britânicas, disse à Folha Nicéa Pitta, ex-primeira-dama de São Paulo. O jornal confirmou a existência de uma Yukon River Ltd. nas Ilhas Virgens (um conhecido paraíso fiscal do Caribe) e descobriu uma conta de empresa homônima no MTB Bank de Nova York, cujo número é 70.245.

Segundo Nicéa, Pitta e Nahas mencionaram o nome da empresa “várias vezes” no apartamento do prefeito. “Eu percebia que falavam de dinheiro de empresas que foram recebendo e depositando na conta dessa empresa.”

Além de Nicéa, pessoas com negócios na Prefeitura de São Paulo disseram à Folha, com a condição de não ter o nome revelado, que a empresa Yukon River faria parte de um suposto esquema de propina para Pitta e Nahas.

A Folha depositou um cheque de US$ 81,03 na conta da Yukon River em Nova York. A princípio, o MTB recusou o depósito, alegando que só poderia ser feito com autorização do correntista, mas depois o aceitou.

O MTB, que está sob investigação judicial nos Estados Unidos acusado de lavagem de dinheiro e outros crimes financeiros, foi vendido para o Commercial Bank of Connecticut. O presidente dessa instituição, Donald Weaang, confirmou que a Yukon River é correntista, mas se recusou a informar quem são seus proprietários ou diretores, bem como o endereço e o telefone da empresa: “Nunca faria isso. Somos obrigados por lei a manter o sigilo”.

Nicéa contou que o filho de Naji Nahas, o empresário Fernando Nahas, costumava levar envelopes ao apartamento de Pitta após o trabalho. Um dia teria deixado com ela um envelope para Pitta.

Segundo Nicéa, enquanto o prefeito tomava banho, ela abriu o envelope e viu o nome Yukon River em papel timbrado. “O Fernando é que faz a parte de documentação.” A ex-primeira-dama declarou que as visitas de Nahas e de seu filho aconteceram a partir do final de 98. “Foi depois que o Maluf perdeu a eleição (para governador) que o Nahas veio mesmo com frequência aqui.”

Segundo Nicéa, Pitta e Naji Nahas tiveram uma discussão. O prefeito teria dito: “Você colocou o seu filho nessa (na Yukon River). Quero saber como é que você vai se sair?”. Para ela, foi uma “ameaça” caso algo vazasse.

Em um mês e meio de apuração, a Folha obteve a informação de que o nome inteiro da empresa é Yukon River Ltd. e que ela receberia propina do suposto esquema do lixo em São Paulo.

A Yukon River Ltd. é das Ilhas Virgens Britânicas, um paraíso fiscal. Tem o número 2.953 no registro público daquele país. Criada em 23 de fevereiro de 1987, o capital social é de US$ 50.000,00.

O registro público não dá o nome dos proprietários e diretores da empresa. Fornece apenas o agente financeiro que criou a companhia. No caso, foi a Insinger Corporate Formation Ltd.

A Insinger confirmou que a Yukon River Ltd. é sua cliente, mas se recusou a dar os nomes dos donos e da diretoria, alegando sigilo.

Nas Ilhas Virgens Britânicas, um paraíso fiscal, a lei permite que se esconda o verdadeiro dono de uma empresa ou de uma conta. A Yukon River é um tipo de “offshore” (qualquer empresa criada no exterior) aberta por pessoas físicas ou jurídicas interessadas em camuflar a sua propriedade, a fim de não pagar impostos no país de origem ou esconder dinheiro com origem legal ou ilegal.

Raramente, a polícia internacional chega aos donos verdadeiros.

Com base nas informações de Nicéa, a Folha apurou qual seria um dos supostos roteiros para remessa de dinheiro que teria sido desviado irregularmente da coleta de lixo em São Paulo. O dinheiro sairia da América do Sul (Brasil ou Argentina), iria para um ou dois paraísos fiscais (Panamá e Ilhas Virgens Britânicas, por exemplo), seguiria para os Estados Unidos (onde é aplicado e “lavado”) e retornaria aos paraísos fiscais.

No caso da Yukon River, a conta no MTB seria uma conta de passagem de dinheiro que precisa ser limpo (leia-se: encontrar uma forma de justificar a procedência). Coincidentemente, o banco está sendo investigado nos Estados Unidos, entre outros motivos, por fraude financeira na Argentina.

Um das empresas de São Paulo que trabalham na coleta de lixo é a Enterpa, vendida para o grupo Macri, da Argentina. A Folha apurou que parte da suposta propina do lixo sairia da Argentina.

O deputado federal Aloizio Mercadante (PT-SP), que investiga o “esquema do lixo” em São Paulo, disse que chegou ao nome de Naji Nahas como o principal intermediário entre a prefeitura e empreiteiros. “Investigo exigências que o Naji Nahas teria feito a empresas para o pagamento de dívidas atrasadas da prefeitura com o setor e exigências quanto ao contrato da licitação futura para a coleta de lixo em São Paulo”, afirmou Mercadante.

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