BOFF VIU IDEAL DA IGREJA NA URSS

Publicado na Folha de S.Paulo, terça-feira, 14 de julho de 1987

O teólogo franciscano Leonardo Boff disse ontem em Nova Iguaçu (RJ), na abertura das atividades práticas do 7° Encontro Internacional de Solidariedade Oscar Romero, que as sociedades socialistas são "altamente éticas, limpas física e moralmente", e que nelas, "não fosse a doutrina materialista dos partidos, poder-se-ia afirmar que se realizam os ideais éticos do ensino social da Igreja". Boff, que voltou na última quinta-feira de viagem a sete cidades da União Soviética, a convite da Igreja Ortodoxa russa, disse ainda que, "apesar das críticas que podem e devem ser feitas aos países socialistas, a maioria deles conseguiu chegar a uma sociedade onde não há pessoas pedindo esmolas nas ruas, não há menores abandonados, não há uma maioria empobrecida, como nos países capitalistas", mas pessoas que vivem "honestamente de seu trabalho". O Encontro Internacional de Solidariedade Oscar Romero, bienal, reúne lideranças ecumênicas de todo o mundo. Este ano o tema é "A solidariedade nas práticas de libertação da América latina".

Países socialistas são 'éticos', diz Boff

Do enviado especial a Nova Iguaçu e da Reportagem local

Na abertura das atividades práticas do "7° Encontro Internacional de Solidariedade Oscar Romero" - promovido pelo Secretariado Internacional de Solidariedade Oscar Romero -, ontem pela manhã em Nova Iguaçu (RJ), o teófilo Leonardo Boff, 48, assinalou que, "em que pesem as criticas que podem e devem ser feitas aos países socialistas, a maioria deles conseguiu chegar a uma sociedade onde não há pessoas pedindo esmolas nas ruas, não há menores abandonados, enfim, não há uma maioria empobrecida, como nos países capitalistas", e sim pessoas que vivem "honestamente de seu trabalho". Boff afirmou ainda que as sociedades socialistas são "altamente éticas, limpas física e moralmente", e nas quais, não fosse a doutrina materialista dos partidos, poder-se-ia afirmar que se "realiza os ideais éticos do ensino social da Igreja".
O religioso fez referências a um debate do qual participou recentemente na Academia de Ciências de Moscou, onde, segundo ele, ideólogos máximos do Partido Comunista reconheceram que a grande luta, do momento atual vivido pela humanidade, não é entre o cristianismo e o marxismo, ou entre o socialismo e o capitalismo, mas sim, a luta pela vida, contra a morte, representada pela corrida armamentista, que pode levar a uma hecatombe mundial.

América Latina

Boff afirmou que, na América Latina, essa hecatombe já começou, em função dos altos índices de miséria, fome e doenças conhecidos em seus países. Segundo ele, nestes mesmos países, por outro lado, "é onde Jesus Cristo se faz presente, no meio dos empobrecidos, que têm expressões com maior vigor, nos últimos anos, o seu grito pela vida".
Para debater o tema geral do Encontro. "A solidariedade nas práticas de libertação da América Latina", estão reunidos cerca de trezentos participantes, representando comunidades de base, movimentos de negros, índios e mulheres, bispos católicos e religiosos do Brasil e de diversos países.

Liberdade de expressão

Em entrevista publicada na última sexta-feira pela Folha, Boff afirmou que não considera a União Soviética uma sociedade militarizada, e que durante o período em que a visitou não viu restrições à liberdade de expressão.
Ele ainda a qualificou como "uma sociedade altamente limpa e saudável", onde, "em nenhum momento, você se sente perseguido ou vigiado".

Padre lituano critica as declarações do teólogo

Se as declarações de Leonardo Boff sobre a URSS, feitas em entrevista publicada pela Folha na sexta-feira, foram comentadas com cautela pela cúpula da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), o mesmo não pode ser dito de sua repercussão na paróquia de São José de Vila Zelina, na zona leste de São Paulo. "Ou ele é ingênuo ou mal-intencionado", disse ontem de Boff o padre José Seskevicius, 65, nascido na Lituânia (hoje uma das repúblicas que integram a URSS) e radicado no Brasil desde 1954.
Seskevicius criticou Boff por dizer que o governo soviético não persegue os católicos "Respondo a ele que ninguém persegue os ateus que vão à igreja, caso do presidente do Instituto Latino-Americano da Academia de Ciência de Moscou, de que ele falou. São perseguidos os que entram na igreja para receber sacramentos ou assistir missa como ato de culto", afirmou.

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