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28/03/2003 - 01h22

Argentina libera depósitos de longo prazo

MARCIA CARMO
da BBC, em Buenos Aires

O ministro da Economia da Argentina, Roberto Lavagna, anunciou nesta quinta-feira a abertura, por decreto presidencial, do bloqueio dos depósitos bancários de longo prazo, criado no dia três de dezembro de 2001 - conhecido como corralón ou, em uma corruptela aportuguesada, corralão.

O corralão nasceu com o corralito, o bloqueio das contas correntes e poupanças, que já não existe mais.

As medidas implementadas pelo então ministro da Economia, Domingo Cavallo, levaram à revolta popular, com panelaços que terminaram com a queda do ex-presidente Fernando de la Rúa, dezessete dias depois, em 20 de dezembro de 2001.

Em entrevista coletiva, no Ministério da Economia, Roberto Lavagna fez questão de ressaltar que a opção de ter acesso aos recursos bloqueados é, a partir de agora, do correntista.

Regras

O correntista terá dez dias para comunicar ao banco se deseja ou não ter acesso ao dinheiro, de acordo com as regras definidas pelo governo do presidente Eduardo Duhalde.

A abertura do corralão, informou o ministro, será imediata para todos os depósitos de até 42 mil pesos.

Este valor é equivalente a US$ 30 mil depositados, na moeda americana, antes da invenção do corralão.

Neste caso, os correntistas poderão sacar parte do valor em pesos, multiplicados por 1,40 peso.

A diferença entre o valor original do depósito em dólares, a pesificação e o preço atual da moeda americana, no mercado livre, será complementada com títulos emitidos pelo governo em dólares com vencimento em 2013.

Prazos

A abertura do corralão ocorre num momento de queda livre do dólar (nesta quinta-feira, fechou cotado a 2,89 pesos para venda (-14,8% este ano).

Os depósitos entre 42 mil pesos e 100 mil pesos estarão livres em 60 dias, sempre com a participação dos bônus do governo para compensar a diferença entre os dólares originalmente aplicados e os pesos devolvidos agora.

Valores acima dos 100 mil pesos terão prazos de 120 dias.

"Com esta medida, o sistema financeiro estará totalmente normalizado", afirmou o ministro.

"A abertura do corralão beneficia os 20% dos correntistas que ainda tinham o dinheiro bloqueado", ressaltou.

Custos

No mercado financeiro, a medida era esperada para a semana que vem e chegou-se a especular que o presidente Duhalde tinha desistido de acabar com o corralão, já que teria que compensar as perdas que os bancos também tiveram com a desvalorização do peso.

A desvalorização "assimétrica" de dívidas e receitas, que quase leva à quebradeira dos bancos, foi uma medida adotada pelo presidente que, na época, em janeiro passado, obrigou os bancos a entregarem ao Banco Central os dólares que tinham em caixa.

Para evitar polêmicas, o ministro Lavagna anunciou ainda que será enviado ao Congresso Nacional um projeto de lei definindo como serão estas compensações aos bancos, que reclamam perdas com as medidas do governo.

Para os analistas econômicos Júlio Piekarz, da consultoria IBCP, e Eduardo Blasco, da Maxinver, a abertura do corralão vai contribuir, "mas não muito", para normalizar o sistema financeiro argentino.

Os dois, porém, observam que ainda falta muito para que este mesmo sistema volte a funcionar como se deveria.

Confiança

Ex-assessor do Banco Central, Piekarz destaca que os bancos estão praticamente paralisados, apesar das portas abertas ao público.

"Hoje, o sistema financeiro argentino limita-se a serviços de transações bancárias e a dar crédito apenas às grandes empresas. E assim mesmo a curto prazo, trinta dias", disse.

Num debate na televisão argentina, ontem, os assessores econômicos dos cinco principais candidatos à Presidência da República concordaram que o maior desafio da Argentina hoje é "reconquistar a confiança" perdida.

Perdida depois da fuga de capitais recorde, registrada em 2001, da moratória da dívida pública junto aos investidores privados, naquele mesmo ano, e da desvalorização do peso, por decreto.

Manuel Solanet, que trabalha com o presidenciável Ricardo Lopez Murphy, e Pablo Rojo, assessor do também presidenciável Carlos Menem, afirmaram que o país só terá um sistema financeiro "normalizado" quando o voltar a ter crédito na praça.

Hoje, lembrou o economista Raul O'Choa, da consultoria Ecosur, a situação está complicada, já que o governo não consegue acertar os ponteiros com aqueles investidores que compraram títulos da dívida argentina e, agora, não sabem quando, e nem como, vão ver a cor do dinheiro.

Patagônia

Para o economista, enquanto esta situação estiver indefinida, será difícil que a Argentina volte a ter crédito.

Esta semana, um investidor alemão conseguiu embargar, na justiça, o prédio da embaixada argentina em Berlim e escritórios do país, em Bonn, além de um depósito de US$ 800 mil do Ministério das Relações Exteriores em bancos daquele país.

Na semana passada, investidores japoneses tinham exigido que a Argentina vendesse a Patagônia para pagar o que lhes deve.

Hoje, foi a vez dos 350 mil investidores italianos avisarem ao secretário de Finanças, Guillermo Nielsen, que vão recorrer ao FMI (Fundo Monetário Internacional) para tentar receber o que têm direito.

Raul O'Choa entende que, ao contrário do que planejava, o governo terá que devolver o dinheiro total destes investidores, e não com descontos, como esperava.

A dívida pública argentina corresponde hoje a quase 150% do Produto Interno Bruto (PIB). Antes da queda de De la Rúa e da moratória, declarada pelo agora presidenciável Adolfo Rodriguez Saá, ela era equivalente a 52% do PIB.
 

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