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15/10/2005 - 05h09

Americanos já duvidam se paz no Iraque depende da democracia

CAIO BLINDER
da BBC Brasil, em Nova York

Os dias que antecederam o referendo deste sábado sobre a Constituição iraquiana foram marcados por esforços frenéticos de diplomatas americanos e de políticos locais para impedir um boicote em larga escala da minoria sunita.

Alguns ajustes no texto foram feitos e obstáculos foram simplesmente jogados para a frente em uma rota política. Para os mais otimistas, caminha-se, apesar das pedras e bombas.

O temor imediato é que, quanto maior a marginalização política dos sunitas (os grandes perdedores com o fim do regime de Saddam Hussein e massa de recrutamento da insurgência), maior é a perspectiva de violência, caos, guerra civil ou simplesmente o esfacelamento do país.

Mas uma preocupação mais abrangente começa a tomar corpo dos círculos oficiais em Washington, acompanhada de um debate na comunidade acadêmica.

Existem dúvidas se o estabelecimento de democracia pode em última instância erradicar a insurgência iraquiana.

Xeque

Sempre houve a expectativa de que progresso político no Iraque iria trazer estabilidade ao país.

Quando a justificativa das armas de destruição em massa para invadir o Iraque se evaporou, o argumento da democracia passou a ser crucial no arsenal retórico do governo Bush para convencer a opinião pública que os sacrifícios compensavam e que era vital manter o curso da política.

Além do Iraque, a promoção da democracia passou a ser vista como vital para trazer estabilidade para o Oriente Médio.

Mas, nos últimos dois meses, analistas americanos com acesso a informes de inteligência, citados pelos jornal Los Angeles Times, colocaram em xeque esta associação entre aparentes progressos na frente política (definidos como "incríveis" pelo presidente Bush) e esforços para reduzir os ataques rebeldes no Iraque.

A rigor, o processo democrático nada fez para minar a insurgência. Talvez tenha até alimentado a violência, pois ficaram ainda mais expostas as rivalidades sectárias.

Aliás, um relatório da CIA que veio a público esta semana assinala que a obsessão com as armas de destruição em massa antes da invasão contrastou com a negligência para entender as disputas étnicas e religiosas no Iraque.

Num ensaio na edição corrente da publicação Foreign Affairs, Gregory Gause, professor da Universidade de Vermont, faz a elaboração acadêmica, escrevendo que "não existe uma forte correlação entre democracia e a ausência ou redução de terrorismo".

Indo além, Gause adverte que "pesquisas de opinião pública e recentes eleições no mundo árabe mostram que o advento de democracia tende a produzir novos governos islâmicos menos inclinados a cooperar com os EUA do que os atuais governantes autoritários".

Consenso

Robert Malley, um veterano negociador do conflito palestino na época do governo Clinton, ressalta que sucesso no Iraque "não é sobre democracia ou não democracia. Está na capacidade de se alcançar um consenso sobre um pacto político".

Isto quer dizer que, se xiitas, sunitas e curdos não concordarem sobre a fórmula de partilha de poder, não vem ao caso o tipo de regime político.

Nos últimos dias, vozes neoconservadoras se somaram ao coro de frustração.

Num seminário no American Enterprise Institute, em Washington, Danielle Pletka disse que o projeto constitucional é um documento altamente deficiente, resultado de maquinações políticas entre iraquianos e americanos, capaz de agravar as divisões internas.

Para ela, o suposto avanço democrático no Iraque passou a ser uma justificativa para apressar a saída das tropas americanas do país.

Já Michael Einsentadt, do pró-guerra Washington Institute for Near East Policy, adverte que, com ou sem democracia, serão necessários anos para derrotar os insurgentes no Iraque, mas mesmo assim as indicações são de que o governo Bush começará a retirar suas tropas no ano que vem por suas próprias razões políticas.
 

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