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28/11/2006 - 10h15

Dividido, povo da Venezuela vai às urnas no domingo

NATHALIE MALINARICH
da BBC Brasil, em Caracas

Que a Venezuela é uma nação muito polarizada é algo que ninguém em Caracas contesta.

“Você vai encontrar parentes que não se falam mais porque um deles apóia (o presidente Hugo) Chávez e o outro não”, afirma um morador da vizinhança de Altamira, na capital venezuelana. Como muitos, ele preferiu não ser fotografado ou identificado.

A tensão antes das eleições presidenciais de 3 de dezembro é perceptível em todos os lugares.

Veja fotos da campanha na Venezuela

Fale com um chavista em Chacao – um município onde o candidato da oposição Manuel Rosales tem amplo apoio – e você notará um certo nervosismo.

“Já ouvi falar de pessoas que enlouquecem quando você menciona o presidente. Eles o odeiam absolutamente nessas zonas de classe média”, diz um apoiador de Chávez.

Na vizinhança de Las Mercedes, o trânsito – que geralmente já é vagaroso – pára completamente quando dezenas de chavistas em motocicletas tomam as ruas para uma demonstração.

“São esses malditos marginais novamente”, afirma um motorista. “Eles estão sempre incomodando.”

Vá a uma das favelas e você encontrará apoiadores de Rosales sendo xingados por chavistas.

“Poder aos pobres”

Caracas é a manifestação mais evidente da divisão desta nação de 26 milhões de pessoas.

As classes média e alta, em geral, moram nas áreas planas – muitos dos quais já viram melhores dias. Os pobres moram nas favelas construídas nos morros.

Mesmo morando em áreas separadas, ambos chavistas e apoiadores de Rosales reclamam do alto nível de criminalidade e do déficit habitacional.

Cerca de metade da população urbana vive em bairros precários que se difundiram pela Venezuela no último século.

Aqui, onde a palavra “revolução” é ouvida freqüentemente, muitas pessoas se beneficiaram dos programas sociais de Chávez.

Abraham Aparicio, um líder estudantil e chavista, diz que a polarização pode ser explicada pela divisão de classes.

“Antes de Chávez, as pessoas que moravam nas vizinhanças mais nobres faziam com que os pobres acreditassem que eram marginais e excluídos de tudo”, diz ele.

“Agora, o presidente quer dar mais poder aos pobres, e as velhas elites não gostam disso.”

“Máquinas eleitorais egocêntricas”

Poder ao povo é um tema recorrente nos posters e murais da cidade onde são anunciadas as conquistas da administração – eles incluem frases como “A Venezuela agora pertence a todos” e “Com Chávez, nós somos todos do governo”.

Teodoro Petkoff, editor do jornal Tal Cual e ex-candidato da oposição, concorda que nos 20 anos anteriores a Chávez “os partidos que governaram viraram máquinas eleitorais egocêntricas e não mais perceberam o horrível empobrecimento da população”.

“Nesse terreno fértil, surgiu Chávez”, diz Petkoff, que foi guerrilheiro de esquerda nos anos 60.

Mas ele ressalta: “É um erro assumir que todos os pobres na Venezuela estão com Chávez”.

“No começo, pode ter havido uma divisão horizontal, mas isso não existe agora. Você vai encontrar ricos e pobres em ambos os lados.”

“Tanto velhos como novos ricos apóiam Chávez. Eu acho que em algumas vizinhanças ricas, mesmo algumas pessoas que atacam publicamente Chávez vão votar nele, porque estão ganhando mais dinheiro do que nunca.”

Incerteza

Os novos ricos a quem Petkoff se refere são conhecidos como “burguesia bolivariana”, pois fizeram sua fortuna durante a “revolução bolivariana” de Chávez.

Na medida em que a Venezuela se beneficia dos altos preços internacionais do petróleo, casas luxuosas e blocos de apartamentos surgem nos bairros mais ricos da capital.

Há listas de espera para carros novos e a demanda por jatos privados teve uma explosão, evocando memórias da bonança do petróleo dos anos 70.

Mas críticos dizem que enquanto a economia está crescendo rapidamente e há muito dinheiro extra, investimentos de médio e longo prazo são raros.

Isso, argumentam os críticos, é porque ninguém sabe o que vai acontecer depois das eleições, já que no próximo ano, segundo os planos de Chávez, a revolução deve realmente começar.

Biometria

A incerteza é acompanhada, em muitos casos, por medo, sobretudo entre a classe média.

Chavistas freqüentemente argumentam que os opositores estão assustados com a possibilidade de perderem suas propriedades – algo que as ameaças de expropriação têm feito pouco para amenizar – e que se opõem à igualdade social.

Mas alguns dizem que o principal motivo para muitos deixarem o país é a politização da educação e a idéia de que a Venezuela pode estar seguindo o mesmo caminho de Cuba.

Um novo sistema biométrico de votação também está alimentando o medo de muitos.

Autoridades eleitorais dizem que um sistema de impressões digitais é necessário para evitar fraudes.

A oposição diz que isso vai permitir que o governo descubra como cada pessoa vota, o que poderia intimidar algumas pessoas que votam contra Chávez.

Eles citam o caso da lista de Tascon, que identificou todos aqueles que assinaram o pedido de referendo em 2004 sobre o governo Chávez. Essas pessoas acabaram sendo impedidas de assumir empregos públicos.

Sem diálogo

Enquanto opositores – e muitos meios de comunicação privados – alegam fraude e intimidação, chavistas acusam Rosales e seus seguidores de alimentarem a violência.

A imprensa pró-governo em geral traz reportagens do que diz ser evidências de planos para um golpe, ou listas de pessoas que estariam planejando assassinar o presidente. Entre os suspeitos estão não só integrantes da oposição como também pessoas do governo americano.

A polarização evidente hoje, segundo Petkoff, foi criada por um governo que reagiu contra seus adversários de forma “brutal, agressiva e intolerante”.

“As primeiras críticas foram recebidas com uma linguagem muito dura e até ofensiva, o que começou a gerar perguntas no mesmo tom”, diz ele.

Também foi criada, segundo Petkoff, pelo fato de que alguns setores não aceitaram que Chávez ganhou as eleições de 1998 e planejaram formas não-democráticas de tirá-lo do poder.

“Isso, alimentado por um presidente agressivo, criou essa divisão terrível. Este é um país onde a oposição e o governo não falam um com o outro. Isso é muito perigoso”, diz ele.
 

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