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Mitos? Do ponto G aos traseiros franceses
IVAN LESSA
Colunista da BBC Brasil
Olhaí, estão doimil e dezando mal. Este sítio que tens diante de vós, ilustre internauta, noticiou direitinho: um estudo do King's College, de Londres, concluiu que o afamado ponto G inexiste.
Talvez. Basearam-se apenas em 1.804 mulheres, que sequer dão nome, endereço, telefone ou deixam publicar fotos em poses pertinentes à questão. Assim até eu. Dediquei-me, algo distraído, a menos mulheres que o Warren Beatty, que segundo uma biografia recém-lançada, conheceu também, no sentido bíblico, 12.775 delas, não contando as rápidas e rasteiras.
Comigo devem ter sido umas 10 ou 12, mas nunca deixei de perguntar a todas, com os melhores modos, "Então como é que vamos em matéria de ponto G? Tudo certinho?". Muitas, umas 8 ou 9, não sabiam a que me referia, e diziam que não precisava levar nenhuma delas ao ponto de taxi depois, não, senhor, que elas iriam de ônibus ou bonde mesmo. O que sempre me ofereceu a oportunidade de mostrar minha cultura e explicar quem fora o cientista alemão Ernst Grafenberg e o que descobrira no ano de 1950.
Conversa vai, conversa vem, mais um copinho (era sempre um que fora geleia de mocotó em outra encarnação) de vinho Granja União e eu dissertava com desenvoltura e gestos cativantes sobre outros pontos. Uns mais erógenos, outros menos. O ponto de macumba, o ponto de exclamação e como usá-lo com moderação, o ponto de costura, o ponto cirúrgico e por aí afora.
Confesso, agora que estou bem mais maduro, que, para não sair do clima de abajur lilás e rádio tocando boleros, eu menti bastante inventando outros pontos que teriam a ver com nossa circunstância, ali naquele apartamento azul. Improvisei o ponto C, de Chiquinho Assunção, e que supostamente seria uma região minúscula situada bem atrás da orelhinha esquerda --e eu mostrava e ilustrava, como o vampiro do Dalton Trevisan, com um beijinho e uma mordidinha. Fui de ponto Z, de Zéfiro, Carlos, mas, explicando e mostrando uma revistinha, quebrei a cara conseguindo apenas indignação e saída rápida com porta batida atrás. Teve até o ponto X, que este sítio no qual eu e você nos encontramos não é lugar para se falar nessas coisas.
O ponto G sofreu um abalo neste início de ano e década. Foi-se. Deixou de ser, ao menos para um punhado de cientistas britânicos. Foi-se como se foi o trema para todos nós brasileiros, mediante decreto-lei. Há muitos anos, fui a uma boate com uma moça que, em vez de ponto G, tinha um trema. Chamava-se Denise e tinha também dois olhos muito grandes, uma boca, um nariz e uma pinta do lado, talvez um dos pontinhos de seu --e estremeço só de lembrar-- trema.
Vamos elevar um pouco o nível de minha dissertação. Também li neste sítio mantido pela BBC Brasil que um estudo francês foi publicado e parece que vem vendendo quase tão bem em Paris quanto o Paulo Coelho. Este é sobre a contribuição dos traseiros para a formação do imaginário francês.
Espero que as fesses das filhas da pátria de Molière não sejam igualmente um mito. Que os messiês cientistas tenham estudado a fundo e ilustrado fartamente o importante trabalho. A contribuição do traseiro francês para as artes, a psicoanálise, a sociologia, a semiótica e a gastronomia gálica não pode ser ignorada ou menosprezada.
Embora, e essas coisas são muito pessoais (assim como um inexistente ponto G), eu preferisse um discurso lacaniano sobre a narizinho arrebitado das mocinhas que até há alguns anos eu via desfilar nos Champs-Elysèes ou no Faubourg Saint Honoré.
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