Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
  Siga a Folha de S.Paulo no Twitter
19/07/2002 - 04h50

Grampos telefônicos não elucidam caso Santo André

Publicidade

ANDRÉA MICHAEL
da Folha de S.Paulo

O conteúdo das 42 fitas resultantes da polêmica escuta realizada Polícia Federal não trata do suposto esquema de pagamento de propina envolvendo petistas da Prefeitura de Santo André.

Revela, isso sim, uma preocupação dos amigos mais próximos do prefeito assassinado Celso Daniel em amenizar a maior fonte de suspeitas daquele momento: as contradições do empresário Sérgio Gomes da Silva, que estava ao lado do prefeito no momento do sequestro, em 18 de janeiro.

Celso Daniel foi encontrado morto no dia 20 de janeiro, e as gravações foram feitas de 24 de janeiro até março. O teor das conversas mostra que vários dos interlocutores sabiam que estavam sendo grampeados.

Em sua maioria, as gravações registraram diálogos entre Gomes da Silva, Klinger Luiz de Oliveira Sousa (ex-secretário de Serviços Municipais de Santo André), Fernando Ulbrich (que era motorista de Klinger), Gilberto Carvalho (ex-secretário de Governo da cidade), Ivone de Santana (namorada do prefeito petista), Xangola (Maurício Mindrisz, superintendente do Semasa, órgão encarregado do saneamento básico municipal), Michel (René Miguel Mindrisz, irmão de Xangola, secretário de Saúde), Marcio Maurici Moraes (ex-secretário de Comunicação e hoje de Governo), Ronan Maria Pinto (empresário do setor de lixo e transportes) e Ozias Vaz (amigo de Gomes da Silva e empresário de ônibus).

O conjunto também traz diálogos de moradores da favela Pantanal, em São Paulo, cujas conversas indicaram o paradeiro de alguns acusados pelo assassinato do prefeito Celso Daniel, como Rodolfo Oliveira, o Bozinho, que estava em Itabuna, na Bahia, e foi preso, e John, que ainda está foragido.

Orelhões e telefones de moradores da favela, segundo relatório da investigação batizada pela PF de "Operação Távola Redonda", também foram grampeados por conta de uma denúncia à PF -o "mentor intelectual" do sequestro seria Gomes da Silva, usando como executores "uma quadrilha de traficantes da favela Pantanal".

"Narcotráfico"
O resumo das conversas está em quatro disquetes em poder da Justiça Estadual e do Ministério Público Federal em São Paulo. A justificativa apresentada pela PF à Justiça para realizar as interceptações foi que se tratava de uma investigação relacionada ao narcotráfico. Na verdade, a escuta se destinava ao caso Celso Daniel.

O conflito entre o alvo e a justificativa para o grampo, segundo o Ministério Público, colocou a PF sob suspeita de ter exorbitado em suas prerrogativas e violado até direitos de cidadãos com fins políticos, já que vários petistas foram grampeados. Entre os policiais, a suspeita é recebida com revolta, diante dos resultados apresentados: seis dos sete suspeitos estão presos. O primeiro a ser grampeado foi Gomes da Silva. A partir dos extratos de suas linhas telefônicas foram identificados os números com os quais mantinha contatos mais frequentes.

Em seu primeiro depoimento à polícia, ele disse que o carro onde estava com Celso Daniel, uma Pajero automática e blindada, havia morrido durante a perseguição dos sequestradores. Depois disse que tentara acelerar, sem sucesso.

Também houve versões conflitantes no que diz respeito às travas elétricas do veículo, que segundo Gomes da Silva teriam se aberto devido aos choques com o carro dos sequestradores e a tiros. Peritos não detectaram as falhas.

Três mosqueteiros
Pouco mais de uma semana após a morte do prefeito, conversando com o amigo Ronan Maria Pinto, Gomes da Silva se queixa da rede Record e diz que "tem que pegar um advogado, um desembargador, e tem que embargar", pois "eles estão acusando a gente de ter matado o cara". Queixa-se de que o grupo _ele, Ronan e Klinger_ esteja sendo chamado de "os três mosqueteiros".

Outro amigo, Ozias Vaz, em conversa com uma pessoa chamada Sabrina, diz: "Ele [Gomes da Silva] está super nervoso! Não é fácil passar por aquilo". E Sabrina: "A imprensa está comparando o que ele [Gomes da Silva] fala. Ele tem que tomar uma atitude".

Em um dia de festa para o grupo, vários interlocutores comemoram uma entrevista de Ivone Santana à Folha numa mesma ligação também grampeada. Primeiro Klinger e depois Carvalho dizem que "foi ótima". Xangola continua os diálogos declarando: "Esta linha está super legal. É a linha da dor de uma viúva".

Na entrevista publicada em 28 de janeiro, Ivone disse que o assassinato foi um "crime urbano" e que o petista "não possuía inimigos políticos que pudessem chegar ao ponto de matá-lo".

Em outra ligação, Klinger tenta acalmar Gomes da Silva. Sugere que descanse antes da entrevista que daria no dia seguinte à reconstituição do crime, que durou até a madrugada do dia 24. Propõe almoçarem junto com Carvalho. Ele conta que a polícia pegara dois suspeitos em Minas e diz: "Pode ser que eles consigam pegar o fio da meada, enfim, resolver esse assunto seria o ideal".

No início de fevereiro as preocupações com Gomes da Silva diminuem. Em uma conversa com Carvalho, o secretário Maurici Moraes pergunta sobre "Sergio". E Carvalho: "Está recolhido, muito em função da polícia. Tem ido fazer os reconhecimentos, mas não fez mais bobagem, não entrou mais em contradições. Bom, também chega de contradições".

Em meados de fevereiro, Klinger trata de assunto diferente com Michel Mindrisz, secretário de Saúde de Santo André. Pergunta se Michel está na secretaria. Ele diz que está na "administração" (secretaria localizada no 10º andar do prédio da prefeitura _a Secretaria de Saúde fica no 14º).

Klinger diz que está mandando "aquele negócio que a gente combinou". E Michel: "É em numerário?". A resposta é positiva. O envelope com a "parte" de Klinger seria entregue por Fernando Ulbrich, o motorista. "Quando ele chegar, pede para descer no 10º andar, não tem problema."
 

Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página