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23/06/2003 - 08h58

Braço direito de Arcanjo liga quadrilha a políticos do MT

JOSIAS DE SOUZA
da Folha de S.Paulo
HUDSON CORRÊA
da Agência Folha, em Campo Grande

A Confiança Factoring, do grupo empresarial de João Arcanjo Ribeiro --chefe de uma das maiores quadrilhas do país, preso desde o último 10 de abril-- foi usada por políticos de Mato Grosso para drenar dinheiro de cofres públicos para campanhas eleitorais. Entre os beneficiários das transações estaria Dante de Oliveira (PSDB-MT), que governou o Estado até dezembro de 2002.

As revelações foram feitas por Nilson Roberto Teixeira, 43. Ele é um dos principais executivos do "staff" financeiro do grupo de Arcanjo Ribeiro, conhecido pelo apelido de comendador.

Foragido desde 5 de abril, data em que sua prisão foi decretada, Roberto Teixeira entregou-se à Polícia Federal na tarde do último sábado. Ele fez um acordo com a Justiça. Tornou-se "réu-colaborador". Contou o que sabe. Em troca, obteve proteção policial e a promessa de redução de pena.

Roberto Teixeira é réu em processo que apura lavagem de dinheiro e crimes contra o sistema financeiro e a ordem tributária. O depoimento dele foi colhido no próprio sábado.

O interrogatório durou cerca de cinco horas. Ouviram-no o juiz Julier Sebastião da Silva, da 1ª Vara Federal de Mato Grosso, e os procuradores da República José Pedro Taques, João Gilberto Gonçalves Filho e Daniel de Resende Salgado.

Relação extensa

A Folha obteve cópia do depoimento. O homem de confiança da quadrilha de Mato Grosso contou o seguinte:

1) a Confiança Factoring, firma de Arcanjo Ribeiro, recebeu R$ 1.723.600,00 em depósitos do DVOP (Departamento de Viação e Obras Públicas de Mato Grosso). Foram 27 depósitos, feitos entre março e julho de 2001. O Banco Central rastreou as operações. Constam de documento produzido a partir da quebra do sigilo bancário das empresas de Arcanjo Ribeiro. O dinheiro foi aplicado, de acordo com Roberto Teixeira, o auxiliar do comendador do crime, em "pagamentos de campanha do ex-governador Dante de Oliveira";

2) o acerto foi feito pelo próprio Roberto Teixeira "com os coordenadores da campanha de Dante de Oliveira, os senhores Carlos Avalone e José Carlos Novelli". Os três se reuniam "na sede da Confiança Factoring". Em algumas oportunidades, "João Arcanjo Ribeiro participava das reuniões". Dante de Oliveira "não esteve presente" aos encontros;

3) a Confiança Factoring recebeu também, conforme revelou a Folha ontem, R$ 65.278.749,34 em depósitos da Assembléia Legislativa de Mato Grosso. Foram efetivados entre maio de 1999 e dezembro de 2002. Também constam do relatório do BC, obtido pela Folha;

4) em seu depoimento, Roberto Teixeira informou o destino dos R$ 65,2 milhões: "A Confiança Factoring recebia uma relação com os nomes das pessoas a quem o dinheiro deveria ser repassado". As listas eram entregues por José Geraldo Riva e Humberto de Melo Bosaipo. São, respectivamente, o atual e o ex-presidente da Assembléia Legislativa de Mato Grosso;

5) entre as pessoas incluídas nas relações "havia deputados estaduais". Nas últimas "três legislaturas [...] cerca de 60 a 70% dos deputados fizeram parte dessa lista de beneficiários". Os parlamentares receberam em "cheques ou dinheiro";

6) Roberto Teixeira mencionou no depoimento os nomes de alguns políticos. A Folha reproduz a lista exatamente como foi registrada no "termo de interrogatório" lavrado pela Justiça: "o deputado Eliene Lima, o ex-deputado Nico Baracat, Dentinho, Sival Barbosa, Pedro Satélite, José Carlos de Freitas, Joaquim Sucena, Humberto Bosaipo, Benedito Pinto, Romualdo Jr., Emanuel Pinheiro";

7) além dos repasses a deputados, parte dos R$ 65,2 milhões foi usada em pagamentos feitos pela Confiança Factoring. Roberto Teixeira informou: "Não havia apenas débitos da Assembléia Legislativa, havia fornecedores, deputados estaduais, assessores e credores de campanhas políticas". Os "débitos se avolumavam à medida que as campanhas políticas se aproximavam";

8) de novo, conforme as declarações de Roberto Teixeira, o ex-governador Dante de Oliveira teria sido um dos beneficiários de repasses originados em operações de "empréstimos realizados pela Assembléia Legislativa". O auxiliar de Arcanjo Ribeiro declarou: "Foram pagos débitos de campanha política do então candidato Dante de Oliveira no pleito de 1998";

9) Roberto Teixeira disse no depoimento que consegue "provar a triangulação para o pagamento de despesas" da campanha de Dante, por meio de "documentos que possui". Comprometeu-se a entregar os papéis em juízo. São "relações de parte dos fornecedores de campanha";

10) algumas vezes, segundo Roberto Teixeira, os repasses financeiros eram feitos por intermédio de assessores dos deputados estaduais. Mencionou dois nomes: Juraci de Brito, que identificou como "assessor do deputado Humberto Bosaipo", ex-presidente da Assembléia mato-grossense, e Cristiano Quirilo Volpato, "assessor do deputado José Riva", atual presidente do legislativo estadual;

11) Quirilo Volpato recebeu da Confiança Factoring, de acordo com o documento do BC, R$ 1.324.659,53. Juraci de Brito figura no relatório como beneficiário de R$ 250 mil.

Medo de morrer

O Ministério Público e o juiz Julier Sebastião da Silva atribuem grande importância ao depoimento de Roberto Teixeira. Ele começou a trabalhar como "gerente-geral" da Confiança Factoring em 1995. Foi convidado pelo próprio Arcanjo Ribeiro. Conheceu-o em 1991. Era na época gerente de uma agência do Banco Econômico em Cuiabá, onde o comendador mantinha conta. Trocou o salário de R$ 3.000 que recebia do Econômico por vencimentos de R$ 10 mil mensais, mais participação nos lucros da Confiança.

Como gerente-geral, Roberto Teixeira assinava os cheques da Confiança Factoring, mediante procuração passada pelo próprio Arcanjo Ribeiro. Em março de 2002 transferiu-se para a Vip Factoring, também pertencente ao comendador, que mantém negócios em Mato Grosso, no Distrito Federal, no Uruguai e nos Estados Unidos.

Roberto Teixeira tornou-se um homem bem-posto. Possui sete postos de gasolina, duas fazendas e um apartamento avaliado por ele próprio em R$ 200 mil. Depois do depoimento que prestou no sábado, foi transferido de Mato Grosso para outro Estado, mantido em segredo pela PF. O auxiliar do comendador declarou no depoimento que tem "medo de morrer".
 

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