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23/06/2004
-
04h46
RAFAEL CARIELLO
da Folha de S.Paulo, em Nova York
MURILO FIUZA DE MELO
da Folha de S.Paulo
O historiador Thomas Skidmore, 71, afirma que Leonel Brizola foi o político mais carismático do Brasil no século 20 e também o que "mais assustou" a elite. Mais que Luiz Inácio Lula da Silva? Bem mais, declara o brasilianista norte-americano.
Além de ter sido "a mais militante figura de esquerda" do país, Brizola, para Skidmore, foi um dos primeiros e um dos melhores políticos brasileiros a saber usar a TV. "Ele tinha uma habilidade que poucas pessoas têm. Quando encarava a câmera, ele projetava a sua personalidade. Foi de longe o melhor orador e o mais carismático político da esquerda. Lula não assustava ninguém. Brizola metia medo nas pessoas", disse o autor de "Brasil: De Getúlio a Castelo" e professor aposentado da Universidade Brown à Folha.
Era para amainar esse temor, diz Skidmore, que o governador do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Sul costumava se referir a si mesmo como "o engenheiro". "Para que todos soubessem que ele era um bom engenheiro, integrante da classe média."
O historiador aproxima Brizola de seu inimigo e oposto político no campo ideológico, o governador do extinto Estado da Guanabara Carlos Lacerda (1914-1977). Para Skidmore, ambos foram mestres na arte da intriga política, excelentes oradores, ficaram "à margem" da Presidência da República, mas polarizaram a política brasileira nos anos 50 e 60.
O papel de polarizador se manifestou principalmente nos anos anteriores ao golpe militar de 1964, afirma o historiador.
Lembrando a "Cadeia da Legalidade", destinada a garantir a posse na Presidência do petebista João Goulart, após a renúncia de Jânio Quadros e a tentativa dos ministros militares de vetar a posse de Jango, Skidmore diz que "foi Brizola quem organizou a defesa e anunciou que, se os generais mandassem tropas, afundaria navios em Porto Alegre".
Nos meses que antecederam o golpe, o "engenheiro" foi "um agitador", diz Skidmore. "Ele era mais ameaçador, simbolicamente, que Goulart. Jango não tinha, pessoalmente, esse caráter "macho" de Brizola."
Nos anos 80, afirma Skidmore, Brizola perdeu prestígio e respeito na esquerda, embora o historiador afirme que em 84 o trabalhista ainda causasse temores entre os que se opunham à campanha das diretas --havia o medo de que ele pudesse ser o eleito, caso a emenda passasse.
Finalmente, nos anos 90, Brizola se tornou, afirma o historiador, "um fantasma ambulante", que zelava pela própria saúde.
"Lembro de ter participado de um programa de TV com ele, em São Paulo, anos atrás. Depois do programa, nós e um bando de jornalistas fomos beber num bar ali perto. Todos tomamos um drinque, com exceção de Brizola. Disse para mim mesmo: "Esse filho da mãe vai sobreviver"."
"Não foi grande democrata"
Para a historiadora Maria Celina D'Araújo, do CPDOC (Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea), da Fundação Getúlio Vargas, Brizola faz parte de uma geração de políticos que tinham pouco apreço pelas instituições políticas. "Ele foi um grande líder político, mas não foi um grande democrata."
D'Araújo ressalta que Brizola se destacou nos anos 60 por defender um projeto de democracia direta, que diminuía o papel do Congresso Nacional.
"Na época, ele dizia que era preciso dissolver o Congresso, formado por forças conservadoras, para instituir um Congresso popular, mas, ora, aquele Congresso tinha sido eleito democraticamente", afirma.
A historiadora não chega a responsabilizar o ex-governador pelo golpe de 1964, mas diz que suas declarações e atitudes radicais ajudaram a isolar e, conseqüentemente enfraquecer, o então presidente João Goulart.
O ponto alto da radicalização de Brizola ocorreu no discurso da Central do Brasil, em 13 de março de 1964, dias antes do golpe, quando, ao lado de Jango, defendeu veementemente as reformas de base. "Bandeiras como "reforma agrária, na lei ou na marra", assustaram as classes médias e a elite conservadora", diz.
D'Araújo diz ainda que as ações nacionalistas de Brizola no governo do RS (1958-61), como a encampação de empresas estrangeiras, ajudavam a formar esse temor de sua imagem.
Com a fundação do PDT, após o exílio, e na eleição de 1982, quando foi eleito pela primeira vez governador do Rio, Brizola incorporou bandeiras até então consideradas progressistas, como a defesa dos direitos das minorias. "Ele tinha um discurso muito moderno, mas a prática no governo se mostrou mais conservadora."
A historiadora destaca ainda a coerência do ex-governador. "Ele defendia idéias retrógradas, mas nunca praticou estelionato eleitoral. Brizola sempre foi coerente com a sua ideologia nacionalista."
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Brizola assustava a elite, diz Skidmore
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da Folha de S.Paulo, em Nova York
MURILO FIUZA DE MELO
da Folha de S.Paulo
O historiador Thomas Skidmore, 71, afirma que Leonel Brizola foi o político mais carismático do Brasil no século 20 e também o que "mais assustou" a elite. Mais que Luiz Inácio Lula da Silva? Bem mais, declara o brasilianista norte-americano.
Além de ter sido "a mais militante figura de esquerda" do país, Brizola, para Skidmore, foi um dos primeiros e um dos melhores políticos brasileiros a saber usar a TV. "Ele tinha uma habilidade que poucas pessoas têm. Quando encarava a câmera, ele projetava a sua personalidade. Foi de longe o melhor orador e o mais carismático político da esquerda. Lula não assustava ninguém. Brizola metia medo nas pessoas", disse o autor de "Brasil: De Getúlio a Castelo" e professor aposentado da Universidade Brown à Folha.
Era para amainar esse temor, diz Skidmore, que o governador do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Sul costumava se referir a si mesmo como "o engenheiro". "Para que todos soubessem que ele era um bom engenheiro, integrante da classe média."
O historiador aproxima Brizola de seu inimigo e oposto político no campo ideológico, o governador do extinto Estado da Guanabara Carlos Lacerda (1914-1977). Para Skidmore, ambos foram mestres na arte da intriga política, excelentes oradores, ficaram "à margem" da Presidência da República, mas polarizaram a política brasileira nos anos 50 e 60.
O papel de polarizador se manifestou principalmente nos anos anteriores ao golpe militar de 1964, afirma o historiador.
Lembrando a "Cadeia da Legalidade", destinada a garantir a posse na Presidência do petebista João Goulart, após a renúncia de Jânio Quadros e a tentativa dos ministros militares de vetar a posse de Jango, Skidmore diz que "foi Brizola quem organizou a defesa e anunciou que, se os generais mandassem tropas, afundaria navios em Porto Alegre".
Nos meses que antecederam o golpe, o "engenheiro" foi "um agitador", diz Skidmore. "Ele era mais ameaçador, simbolicamente, que Goulart. Jango não tinha, pessoalmente, esse caráter "macho" de Brizola."
Nos anos 80, afirma Skidmore, Brizola perdeu prestígio e respeito na esquerda, embora o historiador afirme que em 84 o trabalhista ainda causasse temores entre os que se opunham à campanha das diretas --havia o medo de que ele pudesse ser o eleito, caso a emenda passasse.
Finalmente, nos anos 90, Brizola se tornou, afirma o historiador, "um fantasma ambulante", que zelava pela própria saúde.
"Lembro de ter participado de um programa de TV com ele, em São Paulo, anos atrás. Depois do programa, nós e um bando de jornalistas fomos beber num bar ali perto. Todos tomamos um drinque, com exceção de Brizola. Disse para mim mesmo: "Esse filho da mãe vai sobreviver"."
"Não foi grande democrata"
Para a historiadora Maria Celina D'Araújo, do CPDOC (Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea), da Fundação Getúlio Vargas, Brizola faz parte de uma geração de políticos que tinham pouco apreço pelas instituições políticas. "Ele foi um grande líder político, mas não foi um grande democrata."
D'Araújo ressalta que Brizola se destacou nos anos 60 por defender um projeto de democracia direta, que diminuía o papel do Congresso Nacional.
"Na época, ele dizia que era preciso dissolver o Congresso, formado por forças conservadoras, para instituir um Congresso popular, mas, ora, aquele Congresso tinha sido eleito democraticamente", afirma.
A historiadora não chega a responsabilizar o ex-governador pelo golpe de 1964, mas diz que suas declarações e atitudes radicais ajudaram a isolar e, conseqüentemente enfraquecer, o então presidente João Goulart.
O ponto alto da radicalização de Brizola ocorreu no discurso da Central do Brasil, em 13 de março de 1964, dias antes do golpe, quando, ao lado de Jango, defendeu veementemente as reformas de base. "Bandeiras como "reforma agrária, na lei ou na marra", assustaram as classes médias e a elite conservadora", diz.
D'Araújo diz ainda que as ações nacionalistas de Brizola no governo do RS (1958-61), como a encampação de empresas estrangeiras, ajudavam a formar esse temor de sua imagem.
Com a fundação do PDT, após o exílio, e na eleição de 1982, quando foi eleito pela primeira vez governador do Rio, Brizola incorporou bandeiras até então consideradas progressistas, como a defesa dos direitos das minorias. "Ele tinha um discurso muito moderno, mas a prática no governo se mostrou mais conservadora."
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