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04/07/2004 - 09h12

Garimpeiros vendem parte de Serra Pelada para americanos

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ELVIRA LOBATO
enviada especial da Folha de S.Paulo a Serra Pelada

A Cooperativa de Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada (Coomigasp) assinou contrato com a empresa norte-americana de lapidação de pedras preciosas Phoenix Gems, no dia 5 de junho, para a exploração do ouro remanescente do garimpo de Serra Pelada, no sudoeste do Pará.

Estimativas não oficiais indicam a existência de pelo menos 27 toneladas de ouro na área.

A Phoenix se comprometeu a entregar US$ 40 milhões aos garimpeiros, a título de empréstimo, até 31 de julho, e a doar US$ 200 milhões assim que a cooperativa obtiver do DNPM (Departamento Nacional da Produção Mineral) a concessão dos direitos minerais na área. Se conseguir a concessão, a cooperativa ficará com o direito minerário sobre Serra Pelada, mas a exploração será feita, com o uso de máquinas, pela empresa americana.

O DNPM ainda não se decidiu sobre o pedido de concessão feito pela cooperativa e disse que vai aguardar uma posição da AGU (Advocacia Geral da União), porque haveria dúvidas sobre o titular dos direitos minerários.

Um decreto do ex-presidente Fernando Collor de Mello, de 1992, devolveu os direitos de exploração do garimpo de Serra Pelada à Vale do Rio Doce, mas foi anulado pelo Senado em 2002. Segundo o diretor de Fiscalização do DNPM, Walter Arcoverde, é questionável se o Senado poderia cancelar um ato do Executivo.

Espólio

O negócio com a Phoenix reacendeu a disputa pelo espólio do maior garimpo já descoberto no Brasil. O presidente da Coomigasp, Josimar Elízio Barbosa, disse que só os associados da cooperativa (10.042 pessoas) estariam representados no acordo. Mas, segundo o DNPM, há pelo menos mais três facções em disputa pelo espólio --o Sindicato dos Garimpeiros de Serra Pelada e duas cooperativas de municípios vizinhos, formadas por ex-garimpeiros.

O Ministério de Minas e Energia assumiu o papel de intermediador do conflito. Na véspera da assinatura do contrato entre Coomigasp e Phoenix, foi formado grupo de trabalho para tentar acordo entre as diversas facções. O grupo tem até o início de agosto para apresentar suas sugestões.

O presidente do Sindicato dos Garimpeiros, Raimundo Benigno Moreira, disse à reportagem que não permitirá a entrada de maquinário da Phoenix no local, a menos que todos os que lá atuaram sejam beneficiados.

Ele quer que o governo federal identifique oficialmente os garimpeiros que trabalharam com certificado emitido pela Receita Federal e com autorização do DNPM até 1989 --43 mil pessoas.

No auge da produção, entre 1980 e 1983, o garimpo produziu 29,9 toneladas de ouro e chegou a atrair mais de 100 mil homens, mas grande parte deles não teve certificação oficial. No lugar da serra, ficou um buraco de cem metros de profundidade, hoje coberto por água, e vários montes de rejeitos que só podem ser explorados por processo mecânico.

O contrato com a Phoenix Gems foi assinado na vila de Serra Pelada (a 150 km de Marabá e a 800 km de Belém) entre o representante da empresa, Brent Smith, e Josimar Barbosa, o presidente da Coomigasp.

O documento está guardado no gabinete do prefeito de Curionópolis, o ex-deputado federal e coronel da reserva do Exército Sebastião Curió Rodrigues de Moura, fundador da cooperativa.

Serra Pelada fica naquele município e vem sendo controlada diretamente ou indiretamente por Curió desde 1980, ano em que foi nomeado interventor do garimpo na área pelo então presidente da República, general João Baptista Figueiredo.

O contrato

A Folha teve acesso ao contrato, na segunda-feira passada, na Prefeitura de Curionópolis. O documento diz que a doação dos US$ 200 milhões só se dará se a cooperativa receber a concessão de lavra do DNPM, o que garantiria à empresa explorar o subsolo de Serra Pelada. Sem o documento, ela poderia explorar apenas os rejeitos deixados pelos garimpeiros, o que, na avaliação de Curió, daria cerca de seis toneladas de ouro.

Pelo acordo, válido por tempo indeterminado, a cooperativa terá 40% da produção que vier a ser obtida pela Phoenix dentro dos cem hectares que foram definidos como área garimpeira pelo Congresso Nacional em 1984.

Ele também dá direito de preferência à empresa na exploração de outros 750 hectares em torno do garimpo, cuja propriedade é reivindicada pela cooperativa.

A Phoenix se comprometeu a fazer outras doações menores à cooperativa, como ambulâncias e R$ 100 mil em dinheiro para melhoria da estrada de terra que liga Serra Pelada à rodovia de asfalto.

Pelo cálculo de Josimar Barbosa, cada um dos 10.042 associados receberá R$ 45 mil em dinheiro, mais uma casa no valor de R$ 16 mil na nova vila a ser construída, a nove quilômetros de distância da atual. A exemplo de Curió, ele insiste em que apenas os associados têm direito ao ouro da área.

O sindicato e a cooperativa dos garimpeiros possuem um histórico de conflitos. Josimar Barbosa circula por Serra Pelada com três seguranças.

Em dezembro de 2002, o então presidente do sindicato, Antônio Clênio Lemos, foi assassinado em Curionópolis. Dois anos antes, o atual presidente, Raimundo Benigno Moreira, havia sido esfaqueado em Serra Pelada.

Moreira ameaçou invadir Serra Pelada com 30 mil garimpeiros, mas recuou diante do compromisso do governo federal de buscar uma solução.

Sebastião Curió disse à Folha que já avisou as autoridades da possibilidade de derramamento de sangue, em caso de invasão do garimpo.

O secretário de Administração da Prefeitura de Eldorado do Carajás, município vizinho de Curionópolis, Luiz Gonzaga da Silva, ex-garimpeiro, diz que Serra Pelada é "um vulcão que pode explodir a qualquer momento".

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