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22/08/2004 - 09h08

Lei da Anistia completa 25 anos nesta semana

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da Folha de S.Paulo
da Folha de S.Paulo, em Brasília

Promulgada há 25 anos, no dia 28 de agosto de 1979 pelo então presidente João Baptista Figueiredo, a Lei da Anistia foi um marco --talvez o principal marco do início da redemocratização do país, que se completaria institucionalmente dez anos depois, em 1989, com a primeira eleição direta para presidente da República.

Nesse intervalo, o Brasil atravessou o movimento das Diretas-Já, que resultou no fim do regime militar (1964-1985) e na eleição indireta de Tancredo Neves, o primeiro civil a ser indicado chefe de Estado em 21 anos. O país viu também a promulgação da Constituição, em outubro de 1988.

Mas, visto de hoje, um quarto de século depois, o processo democrático deflagrado pela Lei da Anistia ainda é para muitos uma obra inacabada, ou parcial. Isso porque os dois maiores traumas históricos do período ainda não foram resolvidos: a punição dos torturadores e o esclarecimento do paradeiro daqueles considerados "desaparecidos" pelo regime.

Sobre o primeiro ponto, a Lei da Anistia era omissa e, desde então, pouco ou nada se fez, diferentemente do que ocorreu, por exemplo, no Chile e na Argentina, onde os responsáveis por crimes similares foram a julgamento.

Prevaleceu por muito tempo no país o entendimento de que a Lei da Anistia representava um perdão de mão dupla: assim como eram anistiados os que tinham sido punidos por crimes políticos, também estavam perdoados os representantes do Estado que haviam cometido qualquer espécie de violência política. A lei, porém, não menciona em nenhum momento a palavra "tortura" --e nem poderia àquela altura.

Hesitação geral

O advogado Fábio Konder Comparato enfatiza o fato de a lei ter sido elaborada pelos militares. "Ela não poderia continuar em vigor depois da redemocratização do país. Além disso, em 1992, o Brasil ratificou a Convenção Americana de Direitos Humanos, de 1969, que torna imprescritíveis os crimes de tortura", diz ele, criticando a "impunidade de torturadores e assassinos". "E se eles até hoje estão impunes, é por causa da hesitação geral, inclusive das vítimas", afirma.

O historiador Luiz Felipe de Alencastro concorda: "A questão é que todo o debate está focado nas vítimas, quando se deveria também discutir o destino dos torturadores. Sobre eles, nunca houve a formalização de qualquer acusação. Enquanto o debate se restringir ao drama humanitário das vítimas, os torturadores continuarão impunes. E isso é uma tragédia ética para o Brasil".

É uma posição com a qual não concorda Geraldo Cavagnari, coronel reformado do Exército e membro do Núcleo de Estudos Estratégicos da Unicamp. Cavagnari avalia que o processo iniciado em 1979 está concluído. "Não existe uma demanda social. Os brasileiros estão preocupados com outras questões hoje", diz.

Ele diz que a experiência brasileira é muito diferente da de países como o Chile e a Argentina, onde os governos acabaram pedindo perdão pela violência e iniciaram-se processos de investigação. "Os passivos argentino e chileno são muito maiores, não há como comparar. E, no caso argentino, o Exército foi derrotado, desacreditado. Já no Brasil, o processo [de anistia e abertura] foi conduzido pelo próprio regime."

Divergências à parte, houve avanços importantes durante esse período. Em 1995, dez anos depois do fim do regime militar, o governo Fernando Henrique Cardoso promulgou a lei 9.140, que previa o reconhecimento da responsabilidade estatal por mortes e desaparecimentos por motivação política entre setembro de 1961 e agosto de 1979. Na época foi instalada a Comissão de Mortos e Desparecidos Políticos.

Uma das decisões mais polêmicas da comissão ocorreu em 11 de setembro de 96, quando foi aprovado o pagamento de indenização às famílias dos guerrilheiros Carlos Lamarca (capitão do exército, que desertou em 1969 e foi morto em 71) e Carlos Marighella (líder guerrilheiro morto em 69). O resultado desagradou ao general Oswaldo Pereira Gomes, representante das Forças Armadas na comissão "Uma provocação desnecessária", disse na época.

FHC também instalou a Comissão da Anistia em 2001, e, em novembro de 2002, sancionou a lei que prevê indenizações para perseguidos políticos entre 18 de setembro de 1946 e 5 de outubro de 1988.

Caminho inevitável

A anistia já aparecia como condição indispensável para a redemocratização do país ainda em 1964. Em dezembro daquele ano, lembra a cientista política Glenda Mazarobba, que faz doutorado na USP sobre o assunto, o escritor Alceu de Amoroso Lima pedia pela anistia no rádio.

Durante todo o período de exceção, vários projetos de anistia foram apresentados e enterrados. O MDB a havia incluído em seu programa em 1972 e ela estava presente na plataforma de candidatos do partido nas eleições de 1974. Em 1975, Therezinha Zerbini, mulher de um general cassado, fundava o Movimento Feminino pela Anistia, que se alastraria pelo país. "Um movimento liderado por homens seria esmagado pela repressão", diz Therezinha.

O regime dava sinais de cansaço na segunda metade da década de 70. Às mortes do jornalista Vladimir Herzog (75) e do metalúrgico Manuel Fiel Filho (76), seguiram-se as medidas que o general Ernesto Geisel definia como de abertura lenta, gradual e segura.

No final da década, o movimento pela anistia já havia ganhado as ruas e se tornara uma das grandes bandeiras da chamada sociedade civil. Jarbas Passarinho, à época líder no Senado da Arena, defende que a anistia não foi fruto exclusivo da "generosidade" do governo ou da pressão das ruas: "As duas coisas se somaram", diz Passarinho, figura de proa do regime, que já havia sido ministro do Trabalho em 1968 e da Educação no governo Médici.

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