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13/02/2005 - 09h05

Ministros ganham diária de viagem irregular

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CLÁUDIA DIANNI
da Folha de S.Paulo, em Brasília

Uma prática conhecida entre funcionários públicos federais como "diárias secas" tem contribuído para aumentar as despesas de custeio da União. Autoridades como ministros de Estado e secretários-executivos se hospedam em embaixadas brasileiras no exterior, mas recebem verba pública para pagar despesas.

Pelo menos quatro ministros e dois secretários-executivos se beneficiaram do recebimento integral de diárias em 2004, segundo levantamento feito pela Folha, que teve acesso a 18 pagamentos irregulares só no ano passado.

Apenas nos casos identificados, as despesas do governo quase dobraram. O Tesouro Nacional deveria ter desembolsado R$ 34 mil para custear essas viagens, mas os ministros e secretários receberam R$ 62,8 mil.

Esses casos são somente um exemplo. Os R$ 28,7 mil que foram parar nas contas das autoridades indevidamente é um valor pequeno perto das despesas totais da União com diárias e passagens, que no ano passado somaram R$ 1,2 bilhão, um aumento de quase 30% com relação aos gastos de 2003. Mas o levantamento é uma amostra, limitada a ministros, de desperdício que o aumento dessas despesas pode esconder.

O levantamento revelou que receberam a mais, na maior parte das vezes o dobro do que tinham direito, os ministros da Fazenda, Antonio Palocci Filho, do Desenvolvimento, Luiz Furlan, do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias, da Educação, Tarso Genro (que comprovou ter devolvido o dinheiro), o secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Márcio Fortes, e o secretário do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, Jaques Wagner.

Todos eles, após serem consultados pela Folha, informaram que vão devolver ou já devolveram os pagamentos acima do devido referentes a diárias. Alguns enviaram inclusive os comprovantes de devoluções já efetuadas.

A prática das "diárias secas" consiste em solicitar diárias integrais para viagens ao exterior, que variam de US$ 220 a US$ 460 para altos cargos dependendo do destino, mas se hospedar nas embaixadas do Brasil no exterior em capitais como Londres, Washington, Paris e, principalmente, Buenos Aires. Essas embaixadas, além da pousada, oferecem pensão completa e todos os serviços de transporte na cidade.

O decreto 3.633, de 20/10/2000, estabelece que autoridades ou funcionários públicos devem receber apenas 50% do valor da diária quando se hospedam em casas pertencentes ao governo brasileiro ou atendem a convites de governos ou outras instituições que oferecem hospedagem.
Em descumprimento ao decreto, ministros pediram diárias quando se hospedaram em embaixadas ou viajaram a convite.

Hospedagens

O ministro Palocci e o secretário Fortes foram os que mais dinheiro indevido receberam. Palocci recebeu R$ 11,8 mil a mais em cinco viagens (quatro no ano passado e uma no início deste ano).

Palocci solicitou diárias inteiras e hospedou-se na residência oficial do governo brasileiro em Londres e Washington, onde as diárias custam US$ 350 ao Tesouro, e em Tóquio, onde custam US$ 460. Ele também recebeu 100% das diárias quando teve as despesas de hospedagem pagas pelo Ministério de Finanças da Alemanha no ano passado, conforme confirmou à Folha o governo alemão, ao participar do encontro do G20, em Berlim.

Palocci também embolsou 100% das diárias quando esteve com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na China, em maio do ano passado.

Outro decreto, o 940, de setembro de 1993, estabelece que a comitiva do presidente tem direito a 70% das diárias em viagem ao exterior porque é a Presidência que paga as despesas de hospedagem. O ministro deixou o Brasil no domingo a noite e só chegou ao destino na terça-feira, mas recebeu duas diárias inteiras (US$ 700) pelo tempo que ficou no avião.

Fortes ficou com R$ 10.382,08. No ano passado, ele esteve oito vezes em Buenos Aires, conforme registra o Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira da União). Em todas as ocasiões hospedou-se na residência oficial, conforme confirmaram à Folha vários funcionários da embaixada, no ano passado. Apesar de receber o dobro das diárias, ao voltar ao Brasil, Fortes pediu o reembolso pelas taxas aeroportuárias.

Fortes também recebeu mais R$ 10,5 mil em diárias nacionais. A maior parte das viagens que o secretário faz dentro do Brasil tem como destino o Rio de Janeiro, como é natural considerando sua posição no governo federal e o endereço dos órgãos a que está vinculado. Mas a casa do secretário fica no Leblon.

Das 27 viagens que o secretário fez ao Rio no ano passado com passagens pagas pela União, 20 foram compromissos marcados na sexta ou na segunda-feira.

O ministro Furlan hospedou-se na embaixada no Chile e ficou com as diárias, em outubro do ano passado, e teve uma hospedagem paga pela Latin Trade Magazine, em dezembro.

Tarso Genro, Jaques Wagner e Patrus Ananias se hospedaram na residência oficial de Buenos Aires no segundo semestre do ano passado, onde as diárias custam US$ 300 ao governo.

Segundo a Folha apurou, as "diárias secas" não são uma novidade do atual governo. Funcionários públicos que não quiseram se identificar disseram que a prática é antiga e costuma acontecer com certa freqüência.

A reportagem, porém, verificou no Siafi apenas o dinheiro recebido em viagens em que pôde constatar a hospedagem em embaixadas ou confirmar com entidades e governo que os ministros receberam convites --portanto, tiveram as despesas com transporte e hospedagem pagas.

Do histórico do atual governo já constavam dois antecedentes de ministros que embolsaram diárias e depois tiveram que passar pelo constrangimento de devolver o dinheiro.

Em novembro de 2003, a ex-ministra da Assistência e Promoção Social Benedita da Silva devolveu R$ 4.816,00 aos cofres públicos depois da polêmica viagem que fez à Argentina para participar de um encontro de evangélicos, mas, às pressas, marcou uma reunião com sua equivalente argentina, Alicia Kirchner, para justificar as diárias e a passagem aérea custeadas pela união.

Logo em seguida, o ministro de Esporte, Agnelo Queiroz, devolveu R$ 10.872,00 que recebera para passar 11 dias na República Dominicana, em agosto, quando as despesas tinham sido pagas pelo Comitê Olímpico Brasileiro.

Especial
  • Leia o que já foi publicado sobre o Siafi
  • Presidência eleva gastos com saques em dinheiro no cartão
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