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18/09/2005 - 09h37

Buani revela pretensão de se candidatar

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MARTA SALOMON
da Folha de S.Paulo, em Brasília

O refrão vigoroso da "Canção do Toreador", um trecho da ópera Carmem, de Bizet, toca quase sem parar na campainha do celular de Sebastião Augusto Buani, 54. O dono de restaurante virou celebridade ao denunciar o pagamento de suposta propina ao deputado federal Severino Cavalcanti (PP-PE) e se diz "assediado" por pelo menos três partidos políticos, o PSB, o PDT e o PMDB.

"Assim que a poeira do 'mensalinho' assentar, vou me filiar a um partido. A filiação tem de ser agora [o prazo legal termina no dia 30 deste mês], mas a decisão de me candidatar não é para esses dias. Não vou me candidatar para ser mais um", adianta Buani sobre os planos para a fama inesperada, mas, segundo ele, bem-vinda.

Se depender do palpite de seu maior amigo no Congresso, o deputado Alberto Fraga (PFL-DF), Buani continuará empresário. Fraga é mais conhecido por liderar o lobby contra a proibição de venda de armas no país. Na biografia do empresário, aparece como padrinho de sua primeira filiação partidária, ao PTB. Sem militância política, Buani chegou a integrar a executiva do partido no Distrito Federal, comandada por Fraga até o início deste ano.

Tornaram-se amigos na parceria em que Buani entrava com a cozinha e ingredientes do restaurante do décimo andar da Câmara e, Fraga, com os eleitores. O resultado, um sopão, era distribuído na periferia de Brasília.

"Particularmente, acho que não tem nada a ver [virar político], ele tem de ficar no ramo empresarial; transformar em herói quem denuncia corrupção é uma cultura que precisa ser revista", analisa o deputado Fraga.

Em pelo menos um palpite a Buani, Fraga acertou. Dias antes de as revistas semanais publicarem a história no "mensalinho", o empresário o procurou, nervoso, em busca de um conselho.

"Falei que isso ia acabar mal", lembra o deputado, amigo também de Severino Cavalcanti. "Ele disse que isso iria explodir a Câmara", recorda-se Buani.

Duas semanas depois de a notícia do suposto pagamento de propina vir a público, o saldo do prejuízo é o seguinte: o mandato do presidente da Câmara está por um fio, e o principal restaurante de Sebastião Buani fechou as portas na quinta-feira. O contrato de exploração do restaurante do décimo andar do anexo quatro terminou sem chance de prorrogação por causa de uma dívida de R$ 131 mil em aluguéis atrasados.

Decepção

Do posto de observação peculiar que manteve por anos no comando do restaurante da Câmara, Buani guarda uma imagem, segundo ele, "decepcionante" dos colegas de Severino. "Não quero que se ofendam comigo, mas uns 10% mandam, os demais vão lá e apertam botão. Eu tenho certeza de que a maioria falaria que eu não deveria falar [sobre os negócios com Severino]", calcula.

Além do restaurante, Buani conviveu com políticos em partidas de futebol que organizava nas noites de terça-feira, depois das votações. "Na bancada da pelada, ele é quase um deputado", diz o companheiro de campo, o petista Zico Bronzeado (PT-AC). Para outro companheiro das partidas no Iate Clube, o ministro Agnelo Queiroz (Esporte), Buani passava quase despercebido.

Notoriedade

Parte da celebridade de Buani deve-se à beleza da mulher que o acompanhou nas aparições públicas em que o empresário, invariavelmente, chorou. Mais de 20 anos mais jovem que o marido, Diana Buani, 31, mal pronunciou uma palavra e virou a musa do "mensalinho".

"Estou com receio de abrir a boca e distorcerem o que eu digo", disse, preocupada com os boatos de que posaria para revistas masculinas. "É mentira", garante a estudante de direito, que ajuda o marido empresário na rede de restaurantes, todos instalados em órgãos públicos.

Nem com ciúmes nem chateado com o título dado à mulher, Buani se diz envaidecido: "Ela fica sem saber, é muito tímida, mas eu respondo: ela está adorando, ser escolhida musa é maravilhoso, eu curto muito que ela esteja sendo elogiada".

O quarto casamento do empresário começou de forma pouco romântica. Buani conta que estava separado da terceira mulher, "carente, malzinho", quando notou uma freqüentadora assídua do restaurante que mantém no Senado. "Fui dar em cima da irmã dela", conta o empresário.

Era a irmã de Diana, que cortou logo o assédio do empresário: "Eu estou comprometida, mas tenho uma irmã em casa que está descomprometida", teria dito a moça. "E ela é parecida com você?", investiu. "Muito", foi a resposta. "Daí eu falei: estou pronto para o que der e vier, com casa, comida e roupa lavada. E deu certo", relatou Buani.

Versões

Sebastião Buani deixou a musa do "mensalinho" nervosa na tarde da terça-feira passada, quando pôs as mãos no cheque de R$ 7.500 sacado pela principal secretária de Severino Cavalcanti, Gabriela Kênia Martins.

"Nossa, eu fugi. Olhava para ele [o cheque] e dizia: 'meu Deus do céu, não vou ser crucificado'", contou, gesticulando muito só de lembrar. Buani não atendeu aos chamados de Diana e passou um recado hermético. O advogado chegou a acionar a Polícia Federal. Foram horas de agonia no saguão do prédio onde o casal mora.

"Se eu chego debaixo do bloco daquele jeito, vocês estavam feitos, eu não me continha, ia chegar dando cambalhota, gritando, com aquele cheque na mão", disse o empresário.

No dia seguinte, Buani ainda fez suspense antes de exibir o tal cheque em entrevista na Polícia Federal. Pediu doações a empresários para tentar salvar o restaurante da Câmara, pivô dos negócios com Severino Cavalcanti, e até puxou uma oração --apenas para seguir a linha de defesa desenhada por seus dois advogados, "evangélicos radicais", de acordo com Buani. Ele mesmo nunca freqüentou esse tipo de culto e se diz espírita Kardecista.

Na oração, o empresário chamou a si mesmo de "guerreiro". É como se vê, diz: filho de pai e mãe analfabetos, que começou a trabalhar como engraxate aos sete anos de idade para ajudar em casa e também foi bóia-fria perto de Casabranca, cidade do interior de São Paulo, onde nasceu.

Essa imagem de "guerreiro" é contestada por outro importante personagem da história do "mensalinho", o ex-gerente dos restaurantes de Buani, Izeilton Carvalho, o homem que denunciou o pagamento de propina --"por causa de grana", segundo o empresário; porque Buani não o faria, insiste o ex-gerente. Brigaram.

"Ele me traiu", diz o empresário. "Nunca mais nos falamos e ele foi forçado a falar para não ter o sigilo bancário quebrado", diz Carvalho.

Detalhes da história do "mensalinho" mudaram nas duas últimas semanas, e ainda segue incerto o valor total dos pagamentos que teriam sido feitos pelo dono de restaurante ao então primeiro-secretário da Câmara. Uma coisa não mudou: Buani insiste que não pagou propina ao deputado, teria sido vítima de extorsão. O empresário também mantinha, na sexta-feira, o diagnóstico que fizera reservadamente dez dias antes sobre o destino de Severino Cavalcanti: "Não tem como segurar o mandato dele".
 

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