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01/01/2006 - 09h30

Lula troca slogan de "Paz e Amor" por "Pai dos Pobres"

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KENNEDY ALENCAR
da Folha de S.Paulo

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pretende se apresentar candidato à reeleição em 2006 com um figurino menos "Lulinha Paz e Amor", adotado em 2002 sobretudo para conquistar a confiança dos mercados, e mais "Pai dos Pobres", em uma tentativa de recuperar seu prestígio com as camadas mais carentes do eleitorado e atrair a classe média com o argumento que a sua opção número 1 foi o combate à miséria.

O figurino neogetulista explica a recente decisão de ampliar gastos públicos para os mais pobres e junto aos setores tradicionalmente ligados ao PT que estão insatisfeitos com o governo, como a classe média e o funcionalismo público.

Lula acredita que seu carisma fará diferença na hora em que o debate eleitoral esquentar. Crê que se sairá melhor no discurso de campanha do que os tucanos José Serra ou Geraldo Alckmin, hoje os adversários que o petista considera mais prováveis. Procurará enfatizar sua origem popular e tachar os tucanos de elitistas que já tiveram a chance de governar o Brasil e que teriam feito pouco.

"Efeito Erundina"

O presidente diz, em conversas reservadas, que não será vítima do "efeito Erundina" --expressão cunhada por auxiliares para explicar sua decisão de ampliar gastos públicos no ano eleitoral.

Segundo ministros, o presidente afirma que não pretende repetir a experiência de Luiza Erundina, atual deputada federal do PSB paulista que se elegeu prefeita de São Paulo em 1988, pelo PT. Erundina fez um governo de saneamento das contas públicas, interrompendo obras da gestão anterior (Jânio Quadros), combinado a políticas sociais de pouca visibilidade pública. Resultado: em 1992, Paulo Maluf ressuscitou politicamente, derrotou o PT e recebeu a prefeitura com recursos em caixa para fazer um grande pacote de obras que lhe rendeu boa avaliação em 1996, ano em que elegeu o sucessor, Celso Pitta.

Em conversa reservada com seus ministros, Lula disse que já avisou o titular da Fazenda, Antonio Palocci, de que não vai fazer como Erundina, que teria entregue tudo arrumado para seu sucessor gastar à vontade. Lula deseja ter espaço para elevar os gastos públicos, como aumentar o salário mínimo de R$ 300 para R$ 350 a partir de maio e reajustar em 7% a tabela do IR (Imposto de Renda) das Pessoas Físicas.

Essas medidas fazem parte de um "pacote de bondades" que pode chegar a R$ 15 bilhões em 2006. Com um mínimo de R$ 350, poderá dizer que, na média, deu reajuste real (descontada a inflação) superior ao dos oito anos do governo de seu antecessor, o tucano Fernando Henrique Cardoso. Média anual de 5,4% do petista contra 4,7% do tucano.

A correção da tabela do IR objetiva agradar a classe média, como desejam os sindicalistas ligados ao presidente, entre os quais o ministro do Trabalho, Luiz Marinho. Em seus oito anos de governo, FHC só a reajustou uma vez.

Do "pacote de bondades" consta ainda o reajuste salarial para o funcionalismo público (R$ 3,5 bilhões). Os servidores públicos sempre fizeram parte da tradicional base eleitoral do PT, mas andam insatisfeitos com o governo petista, que concedeu aumentos lineares irrelevantes nos três primeiros anos de administração.

Na prática, a inflexão na política econômica que Lula cobra de Palocci será destinar mais recursos para camadas da sociedade que podem voltar a avaliar bem o governo e votar novamente no petista para presidente. Em público, Palocci fará o papel de quem segura gastos. Nos bastidores, já fechou com Lula e vai elevar gastos até o que considera limite da responsabilidade fiscal. Há "gordura" para queimar, diz um auxiliar, referindo-se às seguidas elevações de receita tributária.

Em dezembro, Lula deu uma declaração que evidenciou seu temor do "efeito Erundina": "Não vamos deixar ninguém colher a semente que nós botamos debaixo da terra".

Pesquisa Datafolha em 13 e 14 de dezembro alarmou Lula e auxiliares. Pela primeira vez, o tucano José Serra, prefeito de São Paulo, superou o presidente na fase inicial. Serra teve 36% de intenção de voto no primeiro turno contra 29% de Lula. No segundo turno, o tucano venceria o petista por 14 pontos de diferença (50% a 36%).

Hoje, Lula avalia que continua a ser um candidato forte no primeiro turno, mas voltou a ser um postulante fraco para disputas da segunda fase --seu calcanhar-de-aquiles nas eleições presidenciais perdidas de 1989, 1994 e 1998.

Um ministro disse à Folha que os resultados obtidos pelo atual governo são pífios em relação à expectativa gerada pela eleição de Lula, mas são bons na comparação com outros governos.

Por isso, Lula insistirá no figurino de que priorizou políticas para os mais pobres (inflação baixa e alto investimento na área social).

Ao criticar a comunicação do governo, o presidente sempre diz que o Bolsa-Família deve ser vendido para a classe média como prova de que ela paga conta social da qual deveria se orgulhar. Ou seja, fazer uma propaganda de governo (ou eleitoral) para tentar recuperar parte da classe média que se diz de esquerda e que teria simpatia pela antiga tese do PT de combate à exclusão social.

O jornalista João Santana, marqueteiro que dá consultoria ao Palácio do Planalto, deverá exercer o papel que foi do publicitário Duda Mendonça na campanha de 2002. A comparação de dados entre as gestões de Lula e FHC será uma das principais linhas da campanha petista.

Lula tem dito que a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de 2004 constatou melhora na distribuição de renda e redução da pobreza. A Pnad revelou expansão de 3,3% na massa salarial dos trabalhadores. E redução de 22,4% do número de domicílios sem renda.

O presidente avalia que o combate rigoroso à inflação e o Bolsa-Família tiveram influência na melhora desses indicadores sociais. Em 2002, último ano de FHC, o governo federal gastou R$ 2,3 bilhões com todos os seu programas de transferência de renda.

Em dezembro de 2003, primeiro ano de Lula, o mesmo tipo de gasto subiu para R$ 3,4 bilhões. Em 2004, com todos os programas de transferência de renda fundidos no Bolsa-Família, Lula pagou R$ 5,7 bilhões em benefícios. Em 2005, gastará R$ 6,5 bilhões.

Em 2006, Lula quer destinar R$ 8,3 bilhões para atender a mais de 11 milhões de famílias com o seu principal programa social.

PT e economia

Como parte da estratégia para ser candidato à reeleição, Lula tem se dedicado a enquadrar o PT às suas condições, como fez na campanha de 2002. O presidente aprova a pressão petista para que sinalize com um segundo mandato mais voltado para as bandeiras do partido do que para um controle rígido da economia.

Não deseja, porém, que a política econômica seja bombardeada. Prefere que o partido o ajude a pressionar Palocci a fazer inflexões, como a ampliação de gastos públicos. Lula acredita que, a partir de abril, a economia voltará a exibir dados positivos, diminuindo o desgaste com a previsível notícia, no início de 2006, de que o PIB de 2005 terá crescido menos de 3% --provavelmente em torno de 2,5%, bem abaixo da expectativa do próprio Lula, que chegou a falar em 5% em agosto. O presidente admitiu na última reunião ministerial de 2005 que a queda do PIB havia sido sua maior decepção no ano.

No movimento para enquadrar o PT, Lula tem resistido a assumir publicamente a candidatura à reeleição. Chega a falar que pode desistir, mas é jogo de cena. Avalia que precisa endurecer com o PT para poder fazer concessões a aliados e costurar uma aliança competitiva em 2006.
Em outubro, quando viajou para Portugal e Itália, o presidente disse a dirigentes de partidos de esquerda que seria candidato e que derrotaria a oposição. Em novembro, falou em entrevista de rádio que disputaria em 2006, mas recuou depois, dizendo ter cometido um lapso.

Na intimidade, Lula avalia que não tem como deixar de ser candidato. Planeja se lançar em fevereiro. Não disputar seria confissão de um fracasso que ele disse não poder cometer quando se elegeu em 2002. Mais: não teria ninguém a defender sua gestão.

Especial
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