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17/12/2003 - 06h42

Maracujá transgênico tem DNA de inseto

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REINALDO JOSÉ LOPES
da Folha de S.Paulo

Pesquisadores da Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz), na USP de Piracicaba, estão preparando um contra-ataque biotecnológico para enfrentar as doenças que afetam o maracujá. São maracujazeiros transgênicos, carregando DNA de mariposas e vírus, que devem começar a ser testados em fevereiro.

Os vilões que as versões modificadas da planta (cujo nome oficial, para os cientistas, é Passiflora edulis) deverão superar são o vírus causador do endurecimento dos frutos e a bactéria Xanthomonas campestris, que gera a chamada mancha oleosa dos frutos.

"O problema do vírus, principalmente, é gravíssimo", afirma Maria Lúcia Carneiro Vieira, 48, pesquisadora do Departamento de Genética da Esalq e coordenadora do estudo. Na primeira doença, o vírus torna a fruta imprestável para o consumo, enquanto a X. campestris pode até levar o maracujazeiro à morte.

Os patógenos estão entre as principais ameaças às plantações brasileiras, cuja produção rende cerca de R$ 80 milhões por ano, de acordo com o IBGE (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). O Brasil é o maior produtor mundial da fruta e de seu suco, respondendo por 90% do total consumido no planeta.

Vieira explica que a idéia de utilizar um gene de mariposa para fortalecer as defesas do maracujá vem das propriedades bactericidas de uma proteína da hemolinfa (o equivalente do "sangue" nos insetos). Essa substância foi isolada da mariposa Trichoplusia ni, ela própria uma praga agrícola que ataca o repolho e outras plantas do gênero Brassica em países temperados. "É um sistema defensivo do inseto contra infecções por bactérias, que não conseguem se multiplicar pela ação da proteína", diz a pesquisadora.

Transferência gênica

O grupo, portanto, decidiu transferir o gene cuja sequência de "letras" químicas de DNA contém a receita básica da proteína bactericida para as plantas. "Por enquanto, estamos trabalhando com uma gama de construções [de DNA], já que ainda não sabemos qual vai ser mais eficaz", explica Vieira. Além do gene de interesse, a sequência inserida no maracujá leva também um promotor --um trecho de DNA que especifica como e quando a proteína deverá ser produzida.

Para transferir o gene, os cientistas usaram dois métodos bastante comuns para a criação de transgênicos. São a chamada biobalística (em que o gene é colocado dentro de projéteis microscópicos de ouro e bombardeado sobre a planta) e a Agrobacterium tumefaciens, outra bactéria que domina há milhões de anos a técnica de transferir DNA para o núcleo das células vegetais.

Os pesquisadores já conseguiram demonstrar que a proteína está sendo produzida e "exportada" para fora das células --o que é interessante, segundo Vieira, pois as bactérias costumam se acumular justamente entre uma célula e outra.

Um problema, no entanto, é a possibilidade de que o bactericida afete também microrganismos benéficos que vivem em associação com o maracujazeiro --mais ou menos como um antibiótico que causa problemas digestivos por acabar com a flora intestinal de uma pessoa. Por isso, o grupo está testando também uma construção de DNA com um promotor que só ativaria a produção na presença da X. campestris.

Outra opção estudada, segundo Vieira, é condicionar a produção da proteína aos danos causados às folhas do maracujazeiro por pulgões, que são os transmissores da bactéria. "Esse tipo de dano faz com que a planta secrete fenóides, substâncias que ativam a cicatrização daquele ferimento", explica a pesquisadora. Os fenóides poderiam também acionar a produção da proteína bactericida e barrar a entrada da X. campestris.

Vírus

A estratégia da equipe contra o vírus do endurecimento dos frutos, por sua vez, lembra uma vacina. O gene a ser inserido pertence ao próprio vírus e contém as instruções para produzir o capsídeo, a capa de proteínas que envolve o material genético viral --no caso, RNA, e não DNA.

Ao receber o gene, a planta produziria uma fita de RNA complementar à do vírus. Essa fita "espelhada" produzida nas células vegetais modificadas impediria o funcionamento normal dos genes do vírus e, assim, a produção de mais cópias do invasor pela célula infectada. Em outras palavras, se a estratégia funcionar como planejado, o maracujá estaria vacinado contra o vírus.

De acordo com Vieira, as estratégias deverão passar por testes em casas de vegetação por volta de fevereiro do ano que vem, quando será possível avaliar sua eficácia para evitar ou diminuir a infecção das plantas.
 

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