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24/05/2005 - 10h15

Veneno de aranha viúva-negra tem Viagra e antibiótico

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REINALDO JOSÉ LOPES
da Folha de S.Paulo

Reuters
Pesquisador segura a viúva-negra Latrodectus mactans
Pesquisador segura a viúva-negra Latrodectus mactans
A aranha conhecida como viúva-negra ocupa, com razão, cadeira cativa nos pesadelos masculinos: afinal, nenhum macho se sente seguro perto de uma fêmea cuja principal característica é assassinar o parceiro depois do sexo. Mas, graças a pesquisadores brasileiros e chilenos, pode ser que o aracnídeo se transforme em sinônimo de prazer sexual.

A esperança vem de moléculas isoladas do veneno das viúvas-negras que vivem nos Andes por pesquisadores da Universidade de la Frontera, no Chile, e da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo). Uma das substâncias tem potencial para se tornar um novo Viagra, segundo a equipe. De quebra, outras substâncias do veneno poderiam virar anticoncepcionais, antibióticos e até anticáries.

O aracnídeo, conhecido cientificamente como Latrodectus mactans, chamou a atenção dos pesquisadores graças aos relatos das pessoas que têm a má sorte de ser picadas por ele. Se for do sexo masculino, além de suar em bicas e ter taquicardia, o sujeito sofre uma tremenda ereção involuntária (fenômeno conhecido como priapismo pelos médicos), que pode durar três dias. "O pênis fica rígido e escuro", conta o químico Antonio de Miranda, do Departamento de Biofísica da Unifesp.

O pesquisador conhecia o chileno Fernando Romero, coordenador dos estudos sobre o veneno da aranha, desde que ele havia feito seu doutorado em São Paulo, o que os estimulou a trabalhar juntos para entender os efeitos da substância. "Poderíamos criar uma espécie de Viagra", afirma Miranda. A equipe da universidade chilena já tinha estabelecido colônias da espécie no laboratório, o que facilitava esse objetivo.

"Hoje dispomos de tecnologias que nos permitem manejar o processo de reprodução sem mudar as condições ecológicas do animal", afirma Romero, que trabalha no projeto ao lado de Raúl Salvaticci. Na natureza, diz o pesquisador, as fêmeas do aracnídeo alimentam de três a quatro machos até a maturidade, quando então os utilizam para várias fertilizações e depois os matam.

O estudo cuidadoso das substâncias que compõem o veneno da viúva-negra conseguiu identificar diversas neurotoxinas (substâncias que agem sobre o sistema nervoso). Uma delas, um peptídeo (fragmento de proteína) parece ser o que causa a ereção em quem é picado. "Ele deve produzir um efeito vasodilatador muito forte nos corpos cavernosos [as estruturas "ocas"] do pênis", afirma o pesquisador chileno.

Espermatozóide lento

Outro peptídeo tem ação ainda mais curiosa: ele diminui a mobilidade dos espermatozóides, o que levou os pesquisadores a pensar nele como um possível anticoncepcional masculino. Miranda, da Unifesp, diz que ainda não se pode afirmar com certeza como a substância age, mas parece haver uma interferência sobre os canais de íons --uma espécie de jato molecular usada pelos espermatozóides para nadarem.

Finalmente, outra substância, da família química das poliaminas, mostrou ter boa ação antibiótica contra bactérias, em especial a Streptococcus mutans, causadora das cáries. No caso da atividade estimuladora do primeiro peptídeo, o trabalho já avançou consideravelmente, diz Miranda.

A aplicação do peptídeo isolado em ratos, camundongos e coelhos conseguiu o resultado que um humano que sofre de impotência esperaria: um efeito muito rápido, em doses relativamente pequenas e, aparentemente, sem as reações negativas causadas pelo veneno. Agora, além de avançar nos estudos in vitro e em animais, a equipe pretende melhorar as moléculas com as quais a evolução dotou a L. mactans, criando versões sintéticas delas. Só assim será possível patentear futuros medicamentos com base nas substâncias.

"Acho que a questão dos testes clínicos foge um pouco da nossa alçada", diz Miranda. Quando as substâncias estiverem prontas para os primeiros testes em humanos, a equipe deve passar a bola para a empresa farmacêutica chilena Silesia, que poderá transformar as moléculas em produtos. Se a idéia vingar, cada universidade receberá 40% do valor da patente, e os 20% restantes serão da Silesia.

O estudo recebe financiamento do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), do Ministério da Ciência e Tecnologia brasileiro, do órgão equivalente no Chile, o Fondef-Conicyt.

Especial
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