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28/06/2005 - 09h23

Para ecólogo norte-americano, devastação tem "lado bom"

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CLAUDIO ANGELO
da Folha de S.Paulo

O desmatamento recorde na Amazônia pode ter um lado positivo: mercados internacionais de carne e grãos estão começando a usar o fator ambiental como barreira não-tarifária aos produtos brasileiros, o que pode forçar o agronegócio a cumprir a lei se quiser continuar exportando para esses mercados.

A aposta é de um grupo de pesquisadores liderado pelo ecólogo americano Daniel Curtis Nepstad, do Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) e do Woods Hole Research Center, nos EUA. Nepstad, 47 anos, 21 de Amazônia, diz que os ambientalistas estarão "perdendo uma grande oportunidade" se não usarem forças de mercado para controlar a destruição da floresta.

Em um artigo submetido ao periódico "Conservation Biology", resumido na página do Ipam na internet (www.ipam.org.br), o americano e seus colegas apontam que a dinâmica do desmatamento está cada vez mais dependente de "teleconexões" econômicas --como o aumento na demanda chinesa por carne e grãos, a erradicação da febre aftosa, a doença da vaca louca e uma possível queda de subsídios agrícolas nos EUA e na União Européia.

"Na década de 1980 e na de 1990, o desmatamento avançou muito em razão da política pública brasileira", disse Nepstad à Folha. "Hoje há uma novidade importante, que é o peso da economia mundial entrando na Amazônia por conta da "commoditização" da carne e da soja", afirmou.

Os pesquisadores dizem que a agricultura mundial passa por uma transição que deverá ter um impacto significativo sobre as florestas tropicais, em especial as brasileiras --maior reserva de terras agricultáveis do mundo.

Além de um potencial aumento na devastação, essa transição para uma agropecuária industrial poderá, ainda, aumentar "a dependência da região de alimentos produzidos fora da Amazônia ou do cerrado, já que a agricultura familiar (...) será substituída pela produção de carne e soja para a exportação", diz o artigo.

O "lado bom" dessa tragédia é que, diz o grupo, alguns mercados já estão justificando o boicote às commodities brasileiras devido a fatores ambientais e trabalhistas.

"Alguns dias depois do anúncio dos 26 mil quilômetros quadrados de desmatamento na Amazônia, saiu nos jornais da Europa que a Irlanda estava articulando um boicote à carne brasileira", lembra Nepstad. "O engraçado é que, meses antes, os produtores da Irlanda já estavam reclamando do baixo preço da carne brasileira entrando no mercado irlandês."

A Suécia também sinalizou, em 2004, que limitaria importações de soja brasileira que não cumprisse critérios de preservação.

No Brasil, empresas como o Pão de Açúcar já começam a buscar fornecedores de carne que procurem cumprir critérios mínimos de qualidade ambiental --embora esta tenha descoberto, neste ano, que um de seus fornecedores usava trabalho escravo. E até o governo do Estado de Mato Grosso, tradicionalmente famoso por seu desprezo em relação a temas ambientais, deve iniciar até o final deste ano um processo de certificação de propriedades rurais.

Nepstad admite que a estratégia de usar os mercados como fator de controle ambiental "ainda não está consolidada" e que as evidências desse potencial são "dispersas". Tampouco há garantia de que o setor produtivo venha a se alinhar com os defensores da floresta e tomar medidas simples --como por exemplo cumprir o Código Florestal brasileiro, que limita em 20% o desmatamento legal na Amazônia. Mas afirma:

"Quando grandes associações de produtores começam a enxergar o cumprimento do Código Florestal como cartão de entrada nos mercados europeus, que vão pagar preço maior, então poderemos em curto espaço de tempo reverter a tendência de descumprir a legislação."

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