Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 
  Siga a Folha de S.Paulo no Twitter
12/02/2001 - 05h08

Mapa do genoma desfaz teses sobre a espécie humana

da Folha de S.Paulo

A sequência do genoma humano, um dos feitos científicos mais importantes da história, será anunciada hoje pelas duas principais revistas especializadas do planeta, a "Science" e a "Nature".

Ao contrário do anúncio público da conclusão do genoma, feito em junho do ano passado, os artigos com as sequências do genoma serão publicados em separado pelas duas revistas. A norte-americana "Science" traz os resultados obtidos pela empresa de biotecnologia Celera Corporation, e a britânica "Nature", os de seu rival, o Projeto Genoma Humano -um consórcio formado por 16 instituições públicas de pesquisa.

Ambos os competidores conseguiram completar cerca de 95% do sequenciamento do genoma (segundo outros critérios, porém, a cobertura alcançaria somente 83% ou 84%). Por meios diferentes, chegaram à mesma conclusão: o DNA humano é uma espécie de "deserto", com vastas zonas de "letras" A, T, C e G sem significado conhecido, permeado por uns poucos "oásis" de informação -os genes, que carregam as instruções para fazer as proteínas. Um quarto do genoma pode ser
considerado "desértico", com grandes porções sem genes.

E os genes, onde eles de fato existem, são surpreendentemente poucos (além de muitos difíceis de identificar e entender, pois são regulados por uma maquinaria ainda mal compreendida). A Celera calcula algo entre 26 mil e 39 mil, enquanto o consórcio público estima um máximo de 31 mil. Apenas um terço dos 100 mil que se acreditava haver (algumas estimativas chegavam a falar num total de até 140 mil).

"O tamanho do genoma, o número de pares de bases, é irrelevante para a biologia", afirmou Craig Venter, presidente da Celera. "O milho tem o mesmo número de genes que o ser humano."

Outra conclusão de ambos os trabalhos é que entre um terço e metade do genoma se compõe de sequências repetitivas, o chamado "junk DNA" (literalmente, "DNA-lixo", em inglês).

Bactérias e vírus
Trata-se de pedaços de informação genética transferidos para o genoma ao longo da evolução, entre eles pedaços de bactérias e vírus. Cerca de 8% de todas as sequências de DNA humano derivam de vírus.

"Essas repetições são geralmente tidas como desinteressantes. No entanto, realmente representam um extraordinário arquivo sobre processos biológicos", escreveram os pesquisadores do genoma público na "Nature".

A decifração do DNA humano também confirma que cada indivíduo compartilha 99,99% do código genético com seus semelhantes. São pequenas trocas, de uma letra para cada mil no "livro" do genoma, que fazem as diferenças individuais. Até agora foram identificados entre 1,4 milhão e 2,1 milhões dessas trocas, chamadas SNPs (pronuncia-se "snips").
Identificando-as, a medicina espera tornar-se capaz de produzir drogas específicas para vários tipos de doença -em última análise, remédios "pessoais."

"Mais ainda, a análise das SNPs vai nos fornecer o poder de desvendar as bases genéticas de nossas capacidades individuais, como a habilidade matemática, a memória, a coordenação física e, talvez, a criatividade", escreveu o biólogo norte-americano e Nobel de Medicina David Baltimore, do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech), em comentário ao trabalho do consórcio público.

"A nova visão mais empolgante proporcionada pelo genoma não é responder à questão "o que nos torna humanos?", mas outra: "O que diferencia um organismo do outro?" ", escreveu Baltimore.

Arquitetura de proteínas
E o que diferencia os seres humanos dos outros vertebrados -e os vertebrados de moscas, vermes e ervas-daninhas- não é a quantidade de genes, mas a maneira como eles se combinam para formar proteínas.

O proteoma (conjunto das proteínas) dos vertebrados é bem mais complexo do que o dos invertebrados. Isso em parte se deve à presença de proteínas específicas, mas muito mais ao fato de seres humanos -como os camundongos- terem um conjunto muito mais rico de combinações.

Nesse ponto, a alta redundância do genoma humano conta a favor da complexidade: o fato de haver mais "desertos" permite um maior número de arranjos possíveis entre os "oásis", ou seja, o surgimento de novos traços. Agora que o genoma está sequenciado, é para as proteínas que os cientistas deverão voltar seus microscópios.

Rivalidade
Além de inaugurar uma nova fase na biologia, os trabalhos divulgados hoje pela "Science" e pela "Nature" marcam a volta da competição entre os dois grupos.

Por ser uma empresa privada, a Celera não irá tornar todas as suas sequências disponíveis para o público. Empresas que queiram usar os dados do genoma da "Science" (www.sciencemag.org) terão de pagar à Celera pelo acesso. Os dados do consórcio público estarão disponíveis on-line a partir de hoje, pela Internet, na "Nature" (www.nature.com).

Rumores criados sobre as publicações acabaram fazendo com que as duas revistas divulgassem seus resultados simultaneamente.

Leia mais notícias sobre o projeto genoma
 

Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página