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12/03/2002 - 07h33

Enzima fornece diagnóstico de Alzheimer

REINALDO JOSÉ LOPES
da Folha de S.Paulo

Uma proteína comum, presente tanto na corrente sanguínea quanto nas células cerebrais, pode ser a pista que faltava para prever ou combater de forma decisiva o mal de Alzheimer. A descoberta, feita por cientistas da Faculdade de Medicina da USP, aponta novos caminhos na luta contra essa doença incurável, que afeta 1,2 milhão de pessoas (principalmente idosos) no Brasil.

A molécula vilã _ou melhor, heroína, já que é na ausência dela que o mal de Alzheimer prospera_ responde pelo indigesto nome de fosfolipase A2. Trata-se de uma enzima (um tipo de proteína que acelera reações químicas) que atua na membrana celular e que, na verdade, começou a ser notada devido à sua presença em outra doença mental, a esquizofrenia.

"É muito raro que um paciente esquizofrênico desenvolva Alzheimer", conta Wagner Farid Gattaz, do Instituto de Psiquiatria da USP, coordenador da pesquisa. Gattaz, que lecionou na Universidade de Heidelberg, na Alemanha, explica que as pesquisas feitas naquele país indicavam uma presença grande da fosfolipase A2 no cérebro de esquizofrênicos. "Daí é que surgiu a hipótese de que essa enzima tivesse uma ação protetora contra o surgimento do Alzheimer", diz.

Análises feitas na Alemanha, utilizando amostras sanguíneas e dos neurônios (células nervosas) de pessoas sadias e de portadores do mal, demonstraram que a hipótese acertara em cheio: a fosfolipase A2 andava em falta nas pessoas que tinham Alzheimer, e a gravidade da doença parecia aumentar conforme diminuía a proporção da enzima.

De volta ao Brasil, Gattaz conseguiu financiamento da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) para pôr um grupo mais amplo na mira de seu estudo: o das pessoas com o chamado distúrbio cognitivo leve, que são um dos grupos de risco do mal de Alzheimer.

Falhas na memória

"Essas pessoas costumam ser chamadas de 'memory complainers' [os que reclamam da memória, em inglês]", explica Gattaz. São, em geral, idosos que estão começando a ter problemas com a memória de curto prazo, que todo mundo usa para se lembrar de um telefone que acabou de anotar ou do nome de alguém recém-apresentado. "Acontece que 10% das pessoas que procuram o médico por essa razão desenvolvem o Alzheimer dentro de um ano", afirma o pesquisador.

O que Gattaz e seus colegas da USP fizeram foi examinar amostras de sangue e neurônios de idosos com essa disfunção, junto com as de pessoas normais e de idosos já com os sintomas do mal de Alzheimer. Quatro séries de amostras foram feitas, com cerca de 50 pessoas em cada uma.

O resultado: entre quem não tinha a fosfolipase A2 e quem já tinha a doença (cerca de 30% menos enzima nas células) estavam os "memory complainers", com uma redução média de 15% na presença da enzima. Ou seja: era um passo para o diagnóstico.

Contudo, descobrir a presença da doença um ano antes de seu aparecimento ainda é pouco, afirma Gattaz. "É por isso que nós pretendemos, daqui para a frente, analisar um grupo maior de pacientes ao longo do tempo. Dessa forma, vai ser possível saber como era no começo a concentração da enzima num paciente que agora tem a doença". Mais que isso: administrar a enzima poderia ajudar a reverter o mal. Em testes feitos em ratos, os pesquisadores já verificaram que isso é possível.

Morte neuronal

O estudo da fosfolipase A2 também tem ajudado os cientistas a entender como a doença funciona. Sabe-se que o mal de Alzheimer se caracteriza pelo acúmulo de placas da proteína beta-amilóide no cérebro. Essa molécula é letal para os neurônios: quando a doença se manifesta, por volta dos 65 anos, ela começa a causar destruição maciça dos neurônios, até que o paciente morre.

Os estudos da equipe de Gattaz sugerem que a fosfolipase ajuda a "quebrar" uma proteína que poderia gerar a beta-amilóide, de forma a impedir o surgimento da molécula daninha. Sem ela, o processo perigoso vai em frente.

A fosfolipase A2 também se mostrou envolvida na capacidade do neurônio de trocar substâncias com células vizinhas e na proteção contra a morte celular. Os cientistas agora tentam entender melhor a molécula polivalente.
 

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