Segredos
do Poder
Fita contradiz depoimento de Mendonça
26/05/1999
Editoria: BRASIL
Página: 1-8
ELVIRA LOBATO
da Sucursal do Rio
FERNANDO RODRIGUES
da Sucursal de Brasília
As 46 fitas com gravações de telefones grampeados na presidência
do BNDES, publicadas em parte ontem pela Folha, põem por
terra o depoimento que o ex-ministro das Comunicações Luiz Carlos
Mendonça de Barros prestou ao Ministério Público Federal, no inquérito
que investiga suspeita de improbidade administrativa na privatização
da Telebrás. As fitas também contradizem informações prestadas nos
depoimentos de André Lara Resende (ex-presidente do BNDES), José
Pio Borges (atual presidente do BNDES) e Pérsio Arida.
Em dezembro do ano passado, Mendonça _que recentemente foi eleito
vice-presidente do PSDB, partido do presidente da República_ disse
aos procuradores da República que "não tomou nenhuma providência"
para aproximar a Previ do Opportunity e que se limitou a acompanhar
o desenrolar dos fatos, "respeitando a autonomia de decisão da Previ".
Nas fitas, no entanto, o ex-ministro fala como se agisse intensamente
em favor do consórcio liderado pelo Opportunity.
Na véspera do leilão, telefonou ao então presidente da Previ, Jair
Bilachi, e o colocou na linha com Pérsio Arida, na época sócio-diretor
do Opportunity.
Em seguida, retomou o aparelho e disse a Bilachi: "O importante
para nós é que montem com o Pérsio, evidentemente chegando a um
acordo. E tudo que precisar, aqui, nós ajudamos, entendem? Vocês
precisam se entender".
No depoimento, Mendonça confirmou ter telefonado a Bilachi, na véspera
do leilão, por volta da hora do almoço, mas negou ter conversado
sobre dificuldades do Opportunity em obter carta de fiança do Banco
do Brasil.
Novamente, as fitas contradizem o ex-ministro. No telefonema, ele
afirma, explicitamente: "E agora nós estamos com esse probleminha
(...) que é o problema da carta de fiança, né? Esse negócio de o
Banco do Brasil, não quero entrar no mérito deles lá, mas é chato
agora, no meio da tarde, dizer que não vai dar, né?".
Reunião
Existem mais contradições entre o que mostram as fitas e o depoimento
do ex-ministro. Ele disse que se ocupava mais dos consórcios interessados
na compra da Embratel, enquanto Lara Resende e Pio Borges cuidavam
do Opportunity. Nas fitas, entretanto, fica apenas explícito o empenho
de Mendonça de Barros pelo Opportunity.
Mais ainda: o ex-ministro disse que não participou, na véspera do
leilão, de nenhuma reunião com representantes de consórcios interessados.
No entanto, estava reunido com Pérsio Arida, na presidência do BNDES,
no momento em que ligou para Jair Bilachi, então presidente da Previ.
Vários telefonemas comprovam que ele viajou incógnito ao Rio para
uma reunião com representantes de consórcios interessados na Telemar,
na sede do BNDES.
Em uma de suas conversas grampeadas na véspera do leilão, Mendonça
determinou a José Pio Borges: "Chama uma reunião pra 19h aí, hoje,
e nós vamos fechar daquele jeito que só nós sabemos fechar".
Para despistar a imprensa, mandou dizer que iria ao Rio apenas para
visitar uma tia, em Jacarepaguá, zona oeste da cidade.
"Bomba atômica''
Indagado pelos procuradores sobre o significado da expressão "bomba
atômica", o ex-ministro deu uma resposta incompatível com o teor
de suas falas nas fitas.
Ele afirmou que "bomba atômica" seria informar o concorrente _no
caso, o Opportunity_ sobre as limitações financeiras do consórcio
Telemar.
As fitas, no entanto, mostram que "bomba atômica" seria o recurso
extremo de usar o presidente da República para pressionar a Previ
a aderir ao grupo do Opportunity.
Um trecho das fitas do grampo mostra uma conversa entre Mendonça
de Barros e Pérsio Arida, do Opportunity, em que é citada a expressão.
É o seguinte:
"Lara Resende - Eu quero falar com você antes, tá? Pra saber
o que você tem... Para sentir o pulso. Porque, se precisar, nós
vamos ter que detonar a bomba atômica.
Arida - Tá bom. Tá bom. Ok".
Outros depoimentos
As fitas contradizem vários pontos do depoimento de André Lara Resende.
Ele disse aos procuradores que "de forma alguma" conversou com Pérsio
Arida sobre estratégias para o Opportunity disputar os leilões.
No entanto, uma da fitas obtidas pela Folha contém a seguinte
declaração de André Lara a Pérsio Arida, na véspera do leilão: "Eu
quero falar com você antes, tá? Pra saber o que você tem... Para
sentir o pulso. Porque, se precisar, nós vamos detonar a bomba atômica".
Disse também que o BNDES não forma consórcios, mas apenas tenta
tirar dúvidas dos interessados prestando informações. Essa declaração
é derrubada pelo telefonema entre Luiz Carlos Mendonça de Barros
e seu irmão José Roberto Mendonça de Barros, no qual o ex-ministro
das Comunicações afirmou que os consórcios eram todos montados ali.
Por fim, disse que não procurou contornar os obstáculos apresentados
pela Previ para a formalização do consórcio com o Opportunity e
que nunca chegou a saber quais eram tais obstáculos. Vários diálogos
gravados contradizem suas declarações.
Pio Borges, seguindo a mesma linha de Lara Resende, disse que o
BNDES não exercia nenhum tipo de interferência sobre os consórcios
e que não soube de problemas enfrentados pelo Opportunity para a
obtenção de cartas de fiança.
Pérsio Arida, por sua vez, negou que tivesse presenciado o telefonema
de Mendonça de Barros para Jair Bilachi e disse que não tinha conhecimento
de que alguma autoridade tivesse intercedido junto do Banco do Brasil
para que desse a carta de fiança ao Oportunity.
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