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Brasília Online

27/08/2006

Lula e FHC flertam com autoritarismo e golpismo

KENNEDY ALENCAR
Colunista da Folha Online

Já virou brincadeira entre auxiliares do presidente Luiz Inácio Lula da Silva dizer que ele não pode ficar bem. Se fica, coloca o salto alto, estufa o peito e fala o que não deve. As declarações de Lula no jantar da última terça-feira (21/08) com artistas no Rio foram preocupantes. Evidenciaram uma mágoa que não costuma ser boa conselheira de governantes.

Resumindo, Lula disse que, no escândalo do mensalão, a elite quis fazê-lo 'sangrar'. Falou que o povo faria a sua 'vingança' nas urnas. E ainda reclamou da imprensa, que não teria dado a ele '10% da condescendência que deu para outros presidentes'.

A elite e a imprensa não criaram personagens como Waldomiro Diniz, Marcos Valério e Delúbio Soares. Foram obras de Lula e do PT. Vale repetir pela enésima vez: o trabalho de presidente da República é muito difícil. Suportar críticas justas e injustas faz parte. Se não quiser mais, é só desistir de disputar a eleição.

No entanto, a arrogância pode levar Lula a interpretar equivocadamente o resultado das urnas. Se reeleito, como apontam as pesquisas atuais, ele e o PT não terão sido absolvidos pelo voto.

A hoje provável recondução será fruto muito mais de uma avaliação pragmática do eleitor (gestão econômica e política social) do que um perdão pelos desvios éticos de um partido (mensalão). Flertar com a absolvição de todos os pecados é meio caminho andado para uma tentação autoritária.

Na quinta-feira (23/08), Lula 'corrigiu' as declarações do jantar com os artistas ao falar que desejava um 'entendimento nacional' passadas as eleições de outubro. Foi um aceno para a oposição. Nos bastidores, o presidente tem articulado um acordo pelo final da reeleição e a volta do mandato presidencial de cinco anos. É curioso como Lula parece ter duas personalidades. Uma meio raivosa em desabafos de palanque. E outra sensata ao estabelecer planos de futuro em conversas reservadas. Que prevaleça o Lula de quinta-feira.




FHC não é Lacerda

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso é um democrata. A forma como exerceu o poder e o modo como tratou a imprensa, que lhe deu bordoadas do mesmo jeito que dá em Lula, são provas incontestáveis de seu respeito à democracia. Nesse quesito, dá de dez a zero no governo do petista.

Por isso, pega muito mal invocar Carlos Lacerda no atual momento histórico, como fez na mesma terça em que Lula jantou com artistas. Apesar da ressalva de que não tinha 'afinidade' com o pensamento do antigo político da UDN, FHC emitiu opinião infeliz ao afirmar que seria bom para o Brasil o surgimento de um líder semelhante, capaz de 'eletrizar o país' e de 'cobrar' o governo.

Orador brilhante, Lacerda entrou para história sobretudo como um golpista. Não é uma companhia à qual FHC deveria se associar. É melhor que deixe isso para figuras como o cada vez menos importante senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA). O tucano é bem melhor que os dois.




Quase infantil

Após uma transição civilizada entre seus governos, Lula e FHC foram se distanciando mais e mais. Chegaram a um ponto em que parece travar competição infantil para saber quem fez a melhor gestão. No fundo, dá empate técnico.

O Brasil melhorou sob a batuta do tucano, e está melhorando sob o comando de Lula. Os avanços foram menores que o tamanho dos nossos problemas? Sim, mas foram avanços, e PT e PSDB são os melhores partidos que a realidade nos deu.

No poder, FHC teve a competência política que faltou a Lula. E Lula ousou mais na área social sem perder o controle da economia, aproveitando e aprofundando políticas do tucano nas duas áreas.

A dura oposição que o PT fez ao PSDB se revela à luz de hoje bastante irresponsável. E o troco que FHC quer dar também.
Kennedy Alencar, 42, colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre bastidores do poder, aos domingos. É comentarista do telejornal "RedeTVNews", de segunda a sábado às 21h10, e apresentador do programa de entrevistas "É Notícia", aos domingos à meia-noite.

E-mail: kennedy.alencar@grupofolha.com.br

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